Deitar na cama não era mais como antes, a constante sensação de alguém me observando perdurava. Assim como na noite interior, era possível ver uma distinta sombra humanoide na janela da porta, como se apenas espreitasse o interior de meu quarto. Isso me assustava de um jeito que nunca imaginei, minha vida parecia ter se tornado um pesadelo contínuo e eu só conseguia pensar que em breve acordaria em minha cama, suado e pensando em como aquele sonho tinha sido real, podendo contar essa história para Camila. Mas não importava o que eu fizesse, a sombra continuava lá, parada contra o luar.
A noite seguinte foi a mesma coisa e assim veio uma ideia em minha mente, eu iria tampar a janela de vidro da porta, talvez se eu não visse a sombra a sensação passasse e eu conseguisse dormir em paz. Claro, uma solução idiota e provavelmente passageira, isto é, se fosse funcional, o que parecia estúpido, mas no momento de desespero e sono constante, não é possível pensar de modo lúcido. E foi o que eu fiz, peguei um lençol escuro, o dobrei no meio e o colei na janela usando fita adesiva, assim a sombra desapareceu da minha vista, mesmo que eu soubesse que ela ainda estava do outro lado.
No dia seguinte minha mãe me questionou sobre o porquê de eu ter colocado aquilo em minha porta, como eu não poderia dizer a verdade à ela, inventei apenas uma desculpa esfarrapada, dizendo que a luz do luar estava me incomodando para dormir, já que iluminava quase que meu quarto inteiro e isso me desconcertava de um modo que o sono não chegava até mim. Ela acreditou e os dias seguiram.
Uma semana após o primeiro pesadelo, no dia 10 de outubro de 2016, as coisas mudaram de um modo sinistro e quase indescritível, eu não saberia nem como dizer em palavras o sentimento de repulsa, agonia e medo que tudo aquilo me causava. A sombra já não me observava mais pela janela, já que ela estava tecnicamente selada, mas percebi durante a noite, ao acordar no meio da madrugada com um sentimento ruim, que aquilo estava em meu quarto, do lado de dentro. Minha espinha se arrepiou e gelou por completo quando eu olhei em direção ao vão entre a porta do banheiro e a estante de livros, o mesmo lugar onde senti o toque anteriormente. Lá estava algo parado, totalmente coberto pelas sombras, e por mais que tudo estivesse escuro aquilo se contrastava na própria escuridão, era mais negro do que as trevas que envolvia meu quarto, quase impossível de explicar o quão profundo era aquela cor do homem — criatura — em meu quarto. Meu coração começou a acelerar e minha respiração pesar de modo que estava impossível respirar sem fazer barulho, já que minha boca se tornava uma parte necessária do processo de respiração. Eu não conseguia nem ao menos me mexer, muito menos tirar os olhos daquela direção, como se aquilo me atraísse assim como um imã atraí metal; meu medo era de que caso eu tirasse meus olhos daquela coisa por um instante, ela se moveria em minha direção e me alcançasse. Tentei gritar, claro que tentei, inúmeras vezes, mas nada saía de minha boca além da pesada respiração incontrolável, eu estava preso naquele local, sem poder me mexer ou chamar por ajuda de alguém, restava apenas eu e meu pavor encarando a coisa à minha frente. Mas aquilo não se mexeu, continuou ali parado a noite inteira enquanto eu o observava tentando reparar no menor movimento que fosse — como se eu pudesse fazer algo contra a coisa, meu corpo não obedecia de modo algum. Escutei os primeiros cantos dos pássaros pela manhã e um fino raio de sol começava a tentar atravessar a janela atrás de mim — não a da porta, lacrada, mas sim a que se encontrava atrás de minha cama, totalmente de aço e fechada, quase impossível de ver entre suas frestas com os olhos nus — para chegar em minha cama vagarosamente; tudo estava se iluminando e com essa luz as sombras desapareciam, assim como a criatura que estava "escondida" nelas.
Com a chegada do sol tudo voltou ao normal, exceto eu, meu cansaço era imenso e eu ainda teria que me levantar com o toque do despertador para ir à escola.
...
O esperado aconteceu, meu celular despertou e eu nem ao menos liguei, apenas continuei com a cabeça deitada e tentei pregar meus olhos, por pouco que fosse, eu queria tanto poder descansar naquele momento e esquecer toda a merda que tinha acontecido até o momento. Mas, obviamente, minha mãe foi me chamar, já que estava quase na hora de ir à escola e eu nem ao menos tinha me levantado da cama.
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Entre a Luz e a Escuridão
HorrorPerdido em seus próprios pensamentos obscuros, um jovem adolescente, perto do final de seu ensino médio, começa a sofrer com visões de uma aparição que o assombra. Durante várias noites aquela coisa aparece para ele, seja em sonhos ou até mesmo na r...