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O DEUS DA FLORESTA

QUANDO CLAYTON OUVIU o estampido da arma de fogo, abateu-se sobre ele uma combinação de medo e apreensão. Sabia que um dos marinheiros poderia ser o autor do disparo, contudo, o fato de ter deixado o revólver com Jane Porter — somado à extenuada condição de seus nervos — fez com que tivesse quase certeza de que a jovem estava sob grande perigo. Talvez estivesse tentando se defender de algum homem ou animal selvagem.

Quais seriam as intenções de seu estranho captor ou guia? Uma coisa era certa: ouvira o tiro e, de algum modo, isso o afetara, pois apressara seus passos numa proporção que Clayton, apressando-se cegamente em seu encalço, era incapaz de alcançar, e rapidamente foi deixado para trás.

Temendo ficar perdido mais uma vez, chamou pelo homem selvagem que corria à sua frente. Em um instante sentiu a satisfação de vê-lo aterrissar ao seu lado, vindo dos galhos acima.

Durante alguns segundos Tarzan observou o jovem atentamente, como se decidisse o melhor a ser feito. Finalmente, inclinando-se em direção a Clayton, gesticulou para que ele se agarrasse a seu pescoço e, dessa maneira, com o homem pendurado em suas costas, Tarzan voltou para as copas das árvores.

Os minutos seguintes jamais foram esquecidos pelo jovem inglês. Enquanto se balançava com Tarzan, curvando os galhos, Clayton admirava a incrível agilidade do primeiro — já Tarzan se irritava com a lentidão de seu avanço.

De um galho elevado, a ágil criatura balançava-se com Clayton em um vertiginoso arco até uma árvore vizinha. Então, por uma centena de metros, percorria um entrelaçado de galhos, balançando como um equilibrista sobre os negros abismos da vegetação abaixo.

Do medo inicial, Clayton passou a sentir uma incrível admiração, e até inveja, dos músculos deste gigante, bem como do maravilhoso instinto ou conhecimento que o guiava pelo negrume da noite com a mesma naturalidade e segurança com que o jovem inglês andaria por uma avenida de Londres ao meio-dia. Ocasionalmente, entravam em algum local onde a folhagem era menos densa e onde Clayton podia ver o estranho caminho que trilhavam à luz do luar.

De vez em quando o jovem prendia a respiração ao vislumbrar as terríveis profundezas abaixo deles, pois Tarzan seguia o caminho mais fácil, o que às vezes significava estar dezenas de metros acima do solo.

E, apesar dessa relativa velocidade, Tarzan sentia que avançava devagar. Era constantemente necessário escolher o galho certo, que pudesse aguentar o peso em dobro que agora ostentava.

Enfim chegaram à clareira próxima à praia. Ainda em cima da árvore, os apurados ouvidos de Tarzan captaram os estranhos sons emitidos pela tentativa de Sabor de entrar pelo gradeado. Ele desceu tão rápido que para Clayton foi como se estivessem em queda livre por vários metros. Ainda assim, chegaram ao solo sem nenhum abalo. Logo que Clayton soltou-se de Tarzan, o homem-macaco disparou como um esquilo, em direção à cabana. O jovem inglês seguiu-o depressa, justo a tempo de ver as ancas de um enorme animal prestes a desaparecerem janela adentro.

Quando Jane Porter abriu os olhos, percebeu que, novamente, um iminente perigo a espreitava. Seu corajoso coração desistiu de seu último vestígio de esperança, e ela tateou o chão em busca do revólver, com a intenção de prover a si mesma uma morte digna antes que as terríveis presas se abatessem sobre sua carne.

A leoa havia entrado quase completamente antes que Jane encontrasse a arma. Assim que a encontrou, levou-a rapidamente à têmpora, para se livrar definitivamente das horríveis mandíbulas que pingavam ao observar sua presa. Por um instante hesitou, para proferir uma prece curta e silenciosa ao Criador, e, ao fazê-lo, seus olhos recaíram sobre a pobre Esmeralda, inerte, mas ainda viva. Jazia ao lado do armário.

Tarzan, O Filho das Selvas (1912)Onde histórias criam vida. Descubra agora