RIO | 2016

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2074 palavras

As luzes do ginásio pareciam tornar o lugar ainda mais quente e abafado que mais cedo, quando as outras equipes lotavam o tablado.

Agora Natália era a única ali. Arfava, de cansaço, ignorando o suor que escorria pelo pescoço e se perdia no collant azul que vestia, batendo as mãos uma contra a outra antes de voltar para o canto e reiniciar sua apresentação da manhã seguinte. Ainda não estava boa o suficiente, a voz na sua cabeça reclamava. Tente mais uma vez.

Estava tão concentrada em não errar e não estragar tudo — como sua treinadora gostava de falar — que nem notou o momento que deixou de estar sozinha no ginásio. Tudo o que estava na sua cabeça era a melodia da música escolhida para dar som a sua apresentação no solo e a sequência de acrobacias que tinha preparado: Tsukahara, o salto mortal duplo com um parafuso completo no primeiro salto. Três movimentos no solo, como esperavam os juízes. Um rodante flic flac. Quando terminou sua série de noventa segundos em pé — nenhum passo para trás, nenhum passo para frente — soltou uma lufada de ar pesada. Estava exausta.

As palmas vindo da arquibancada a assustaram, fazendo-a colocar uma das mãos por cima do coração antes de reconhecer o dono delas, sustentando o maior sorriso que ela já tinha visto em seu rosto desde que tinham se conhecido, na cerimônia de abertura.

— Você não deveria estar aqui — Natália falou alto para que o jogador pudesse escutar, vestindo o casaco verde e amarelo por cima da roupa do treino, andando em direção a onde ele estava. — O segurança caiu pelos olhos brilhantes?

Você caiu? — Vinícius provocou, levantando-se assim que a mulher parou na sua frente com as sobrancelhas arqueadas. — Você também não deveria estar aqui. O treino acabou uma hora atrás. Eu chequei.

— Eu estava esperando alguém me expulsar — respondeu, levantando o rosto para encará-lo, mantendo o nariz arrebitado no ar e um bico nos lábios avermelhados. — Mas você não treina nesse ginásio. Nem perto daqui, na verdade.

Lá estava. A imagem da garota de ouro das entrevistas, das revistas e das premiações. O semblante inabalável, condensado em uma mulher de 1,60cm que parecia muito mais baixa que isso ao lado do jogador de vôlei de 1,89. A ginasta que, nos últimos doze meses, tinha ganhado tudo o que tinha competido. Ouro no Pan-Americano. Ouro no Campeonato Mundial. Ouro no Campeonato Brasileiro.

A maior aposta do Brasil na ginástica artística, a medalha de ouro olímpica que parecia garantida do solo individual. Apenas esperando, nada pacientemente, para estar no pescoço de Natália Torres.

Se sua intenção era assustá-lo — com as sobrancelhas arqueadas, os lábios cheios apertados um contra o outro e os braços cruzados na frente do corpo —, Nat já deveria saber naquela altura que não funcionaria. Precisou de menos de trinta segundos para que o rosto dele revelasse um sorriso sincero, junto com os olhos castanhos pequeninos apertados, quase desaparecendo naquela imensidão de felicidade que era Vinícius Sales.

— Estou feliz em ver você também, Mininat — soprou o apelido presunçoso em direção a ela, mordendo discretamente o lábio inferior antes de puxá-la pela cintura para mais próximo do seu corpo. — Muito feliz.

Ela deixou que Vinícius a abraçasse pela cintura, afundando o rosto na curva do pescoço dela, deixando uma trilha de beijos recém descoberta. Natália fechou os olhos, ficando na ponta dos pés para que pudesse alcançar os ombros do jogador, ativando com suas digitais cada terminação nervosa que pairava pela sua pele, sentindo os músculos de Vinícius se contraindo por baixo dos seus dedos.

— Sério, Vini — o apelido escorregou pelos seus lábios e ela se forçou a segurá-lo pelos ombros, afastando-o minimamente. — Você não deveria estar aqui.

Tempo de Pipa | CONTOOnde histórias criam vida. Descubra agora