Capítulo 13

9 2 2
                                    

Corremos até nossos pés sangrarem.

Corremos até as partes descobertas de nossos corpos congelarem.

Corremos até nossos joelhos cederem, e aí não corremos mais.

Já havia amanhecido, os raios de sol trespassavam os galhos das árvores. Deixando o clima mais ameno, porém o frio ainda se fazia presente.

Uma coisa nos confortava mesmo no frio congelante, o silêncio. Assim que deixamos a estalagem para trás e adentramos a floresta que ficava logo atras, os sons de passos nos perseguindo pararam. Agora, o único som que ouvíamos eram o dos animais que moravam na floresta e do vento dançando por entre as árvores.

Paramos de correr assim que amanheceu, nossos corpos estavam doloridos por correr a madrugada inteira. Minha boca estava seca e minha garganta ardia por conta do vento seco e frio. Thomas havia trazido uma sacola com mantimentos e um longo cobertor que agora estava ao nosso redor.

– Eu si..sinto mu...muito. – Ele conseguiu dizer em meio a tremedeira causada pelo frio.

– Você me sa...salvou.

Thomas virou para mim, seu rosto estava sem cor, os lábios ressecados e brancos.

– Mas não po...posso proteger você. – disse enquanto se aproximava mais de mim, colando seu corpo ao meu para compartilharmos nosso calor.

– Você já fez ma...mais do que su...suficiente. – respondi, meu queixo batendo de frio.

Inclinei minha cabeça, deitando-a em seu ombro, tentando acalmar minha respiração e me esquentar com o seu calor.

Ficamos assim por alguns minutos, até que gradativamente nossos corpos foram esquentando. Ainda estava frio, porém agora era mais suportável. Nossos corpos não tremiam mais e nossos dentes pararam de bater.

Thomas interrompeu o silêncio quando se inclinou para abrir a sacola, vasculhando atrás de comida. Logo depois voltou para o lugar segurando um pedaço de pão e leite.

– Precisamos comer para seguir nosso caminho, não estamos muito distantes da ajuda.

Assenti com a cabeça, pegando o pão com leite que ele me entregava. Comi tudo sem sentir o gosto, estava com muita fome e meu corpo precisava de energia.

O pior é que ali, no meio da floresta, congelando e com fome, eu só conseguia pensar em comer um delicioso hamburguer de fast food e o quanto eu sentia falta do meu chuveiro elétrico.

Ao redor de nós os pássaros voltavam a cantar. O sol já estava centralizado no céu, mas seus raios eram bloqueados por nuvens cinzas. Eu definitivamente odiava o inverno.

– Posso ver sua mão? – sussurrou Thomas.

– Elas cobriram com um pedaço de pano. – disse conforme erguia minha mão para que ele pudesse ver.

Thomas retirou o pano, sujo de sangue, delicadamente. Eu mordia o lábio para não gritar. Era fácil esquecer da dor quando se está fugindo para se salvar, mas agora que meu corpo havia esquentado, a dor voltara.

Olhei para meu dedo descoberto, o sangue estava seco e ao redor da ferida a pele estava vermelha.

– Está melhor do que eu pensava. – Ele disse, avaliando o estrago.

Parei de olhar para meu dedo e foquei minha atenção em Thomas. Nos seus cabelos negros bagunçados pelo vento, seus cílios cumpridos tampando os olhos conforme ele olhava para meus dedos. Seus lábios ressecados, pensando em como seria beijá-lo... Minha nossa! Como alguém em sã consciência poderia pensar nisso em uma situação como essa? Qual era o meu problema?!

Parei de olhar para ele, e desviei meu olhar para a árvore que estava logo atrás.

– Posso limpar? – Ele perguntou.

Fiz que sim com a cabeça, ainda sem olhar em sua direção. Estava focada em tirar aqueles pensamentos da minha cabeça.

Thomas pegou um pano limpo e usou a umidade, que se condensava em uma folha no arbusto ao lado, para molha-lo. Com isso começou a esfregar a ferida em meu dedo, devagar e sem colocar força. Eu estremeci com o primeiro toque, mas depois a sensação gelada foi um alívio. A falta momentânea da dor clareou meus pensamentos. O que me fez pensar...

– Por que você me ajudou a fugir?

Ele parou de limpar por uns instantes, olhando em meus olhos.

– Não suportaria ver outra pessoa morrer sob meus cuidados. – respondeu, voltando a atenção para meu dedo.

Terminando de limpar, ele pegou outro pedaço de pano e o enfaixou.

– Eu não sou responsabilidade sua.

– Nunca pensei que fosse, mas... – Ele voltou sua atenção para mim novamente, colocando uma mecha do meu cabelo revolto atrás da orelha. – Eu apenas não queria te ver morta. Estava cansado de ver as pessoas próximas a mim morrerem de forma injusta.

Fechei meus olhos ao sentir seu toque, o calor se espalhando pelo meu corpo. Ele inspirou fundo, me fazendo sair do transe.

– Temos que continuar andando, eles não vieram atrás da gente por estar de noite, mas irão mandar homens agora que o sol nasceu.

Thomas levantou-se. Virou para mim e estendeu a mão, me ajudando a levantar também.

Retirei o lençol que me cobria, entregando para que ele o guardasse na sacola. Ainda estava muito frio, mas eu conseguiria me mover mais depressa sem ele.

Com tudo guardado, começamos a andar. Meus pés ainda estavam doloridos, mas as lembranças dos meus momentos de sofrimento na prisão me faziam seguir em frente. Outro pensamento me fazia ficar firme... Eu voltaria para resgatar aquelas mulheres, por isso eu não desistiria.

Andamos por mais algumas horas, parando apenas para comer o pedaço de frango que Thomas havia trazido, junto com um pouco de água que conseguimos pegar em um rio. Depois de comer voltamos a andar.

Andamos sem parar para descansar, colocando uma grande distância entre nós e a vila. Thomas havia arquitetado um plano de viagem, andaríamos até o sol se pôr, depois tentaríamos fazer uma fogueira e descansaríamos. Ele estimava que conseguiríamos chegar ao nosso destino antes do almoço no dia seguinte.

Eu esperava que esse lugar, onde quer que ele estivesse, fosse quente.

Quando o sol começou a descer, e o clima foi ficando mais frio nós paramos, montamos nosso humilde acampamento em uma clareira rodeada de árvores. Thomas recolheu alguns pedaços de galhos que estavam secos, e depois de meia hora fazendo fricção com eles e um pouco de folhas secas, o fogo acendeu.

Comemos o restante do frango e deixamos o resto do leite para tomar na manhã seguinte.

Estávamos os dois, o mais próximo possível, da fogueira. Mas com a chegada da noite, o frio estava ficando insuportável.

– Vamos acabar morrendo congelados. – disse em meio aos tremores.

Thomas olhou para mim, desviando sua atenção do fogo.

– Eu tenho uma ideia.

– Dá última vez que você disse isso eu acabei descascando batatas.

Ele sorriu.

– Essa vai nos aquecer. – disse, tirando o cobertor de cima dele.

Thomas começou a tirar a camisa, e foi nessemomento, que eu percebi o quanto eu estava completamente perdida. 

_______________________________________

Temos um capítulo extra essa semana, e se eu me sentir inspirada escreverei mais um. Me digam o que estão achando!

A Viajante de SalemOnde histórias criam vida. Descubra agora