O corredor estava movimentado e barulhento, os alunos entravam em suas salas após o recém sinal finalizando o recreio, adolescentes cheios de energia para fofocar ou caçoar de outras turmas, era realmente irritante. No meio de toda essa bagunça se encontrava o garoto de fios loiros, com sua costumeira irritação brilhando nos olhos vermelhos, não havia tido um bom intervalo, o horário que normalmente usava para descansar se tornou uma perseguição graças a seu irmão. O pior de ter que fugir da criatura odiosa que o esverdeado era, foi o fato de não ter conseguido comer, fazendo com que seu péssimo humor ficasse ainda mais detestável.
Nem ao menos tentava disfarçar o quão frustrado estava, fazendo seus passos ecoarem em meio ao barulho devido a força que ele usava para andar, o que chamava atenção de alguns alunos. Algumas pessoas temiam o loiro, outros – só uma pessoa na verdade – achava ridículo qualquer coisa que o mesmo fazia, e não perdia uma chance de comprar briga. No entanto, qualquer um que visse Bakugou daquela maneira iria recuar e sair de seu caminho. O que para o loiro era muito bom, já que ele odiaria ter que empurrar os outros com o ombro e ficara grato por facilitarem seu trabalho. Agradeceria mentalmente ao maldito que espalhou a mentira dele ser um valentão, nunca aquele boato mentiroso havia deixado sua vida tão fácil.
Katsuki Bakugou estava tão irritado e concentrado em seus próprios problemas que nem ao menos considerou olhar para frente, sabia que sairiam de seu caminho sem precisar fazer nada, ou ele pensava que sim. Porque assim como Katsuki estava ocupado demais se preocupando apenas consigo, outras pessoas podiam estar fazendo o mesmo.
O choque forte e atrapalhado em seu ombro o fez se assustar e olhar irritado para quem havia esbarrado em si, preparado para soltar todo seu vocabulário de palavrões.
Foram só alguns segundos, que por algum motivo pareceram minutos na mente do garoto raivoso. Os olhos vermelhos de ambos se encontram, um brilhantes como fogo e outro opacos como sangue, uma compreensão mútua dos sentimentos sentiam.
Bakugou lembrava daquele garoto, vez ou outra o via ao lado de seu irmão e sabia que o mesmo era de sua sala, mas nunca reparou nele para saber algo importante – como seu nome –, tudo o que lembrava era o fato do garoto ser chamado de "raio de sol" por conta do sorriso. Naquele momento no entanto, não parecia que o apelido caia bem em si.
Katsuki se considerava um grande leigo no quesito "sentimentos", era quase impossível perceber qualquer incômodo ou expressão diferente no rosto dos outros, mas o ruivo a sua frente parecia carregar um olhar tão morto e triste que o fez perder o ar e esquecer todos os palavrões que pretendia usar. Uma dor tão evidente que até mesmo alguém ignorante e leigo conseguira perceber, como aquilo poderia ser chamado de raio de sol?
Não conseguiu reparar em muito além daquilo, já que o garoto desviou o olhar e voltou a andar apressado na direção contraria a da sala, provavelmente o banheiro. Katsuki ficou por um tempo ainda olhando, observando o ruivo se distanciar cada vez mais a passos lentos como se estivesse carregando bigornas consigo, e só depois de ver a figura depressiva sumir pelo corredor que percebeu a situação em que estava, paralisado no meio do corredor com cara de idiota. Após um suspiro raivoso e um balançar de cabeça, sua expressão voltou ao normal, e ele foi silenciosamente para sua sala.
O professor já havia chegado e dava preguiçosamente a aula, parecia quase rezar para que as atividades acabassem e ele pudesse dormir. Foi depois da terceira atividade que a porta da sala abriu, revelando a cabeleira vermelha e olhos animados, completamente diferente do garoto com quem Katsuki esbarrou no corredor. Bakugou observou em silêncio o garoto acenar a cabeça para o professor – esse que nem ao menos questionou o atraso – e entrar na sala. Mesmo tendo estranhado o acontecimento chegou a conclusão que era por razões médicas, por isso o professor não falou nada.
Ficou um tempo olhando para o ruivo, esse que sorria largamente para seus amigos e sussurrava uma coisa ou outra, e não pode deixar de notar o quão falso aquele sorriso parecia depois de a pouco tempo atrás o garoto parecer praticamente morto por dentro. Depois de revirar os olhos pela atuação óbvia do avermelhado resolveu olhar para frente, voltando a anotar a atividade.
Não deveria se importar com alguém que mente tão mal.
Os dias se passaram, e Katsuki não pode deixar de perceber o óbvio. O garoto alegre e comunicativo sempre saia sozinho para o recreio, e isso já era estranho o suficiente, mas o que despertou seu interesse de fato foram os machucados, arranhões para ser mais exato, que sempre estavam lá quando o via no corredor mas magicamente sumia quando ele voltava para sala. Tinha certeza que um medicamento não fazia feridas de unha sumir tão fácil e não demorou para concluir que o motivo da demora talvez não fosse tão médico assim.
Ninguém parecia perceber, questionar ou se importar, apenas agiam com o ruivo como se tudo estivesse normal e aqueles atrasos não fossem estranhos.
Katsuki nem ao menos percebeu o quão estava curioso, e foi apenas no meio de uma "investigação" – onde ele inconscientemente seguiu o garoto até o banheiro – que notou o quão intruso havia se tornado. Aquilo só serviu para o atiçar mais, já que o cara em questão aparentemente não tomava nem remédio, apenas passava uma pasta da cor de sua pele no rosto e espalhava com algum tipo de esponja, cobrindo todos os arranhões. Nem fodendo que aquilo era um motivo médico.
Por que Aizawa não o questionava de se atrasar? Por que a sala não falava nada? Passar maquiagem no banheiro para esconder machucados – que poderiam ser provas de um provável bulliyng – era aceitável para perder dez minutos de aula? Não fazia o menor sentido.
Mesmo com tudo aquilo parecendo tão óbvio ninguém falava nada, o que fez Katsuki questionar a quanto tempo tudo aquilo acontecia. Ele sabia que era desligado e desconhecia metade de seus colegas de sala, mas não notar aquilo lhe pareceu um pouco demais. Sorrisos, risadas, gargalhadas, tudo aquilo nunca lhe pareceu tão falso e ao mesmo tempo tão brilhante.
Não podia negar que era encantador, o sorriso do garoto talvez fosse um dos mais bonitos que já havia visto, mas isso não mudava o fato de que o olhar doloroso e sem vida não saia de si nenhuma vez.
Como um sorriso daqueles poderia ser verdadeiro quando os olhos nem ao menos tinham vida. Eram opacos, inexpressivos, tristes, não tinha nada de brilhante naquilo para ser chamado de suposto sol. O ruivo por inteiro parecia ser uma montagem feita somente para agradar as pessoas ao redor, um robô programado para sorrir e brincar animadamente com todos enquanto entrava em curto-circuito por dentro.
Tudo nele era enganoso e suspeito, e como um odiador de mentiras Katsuki não conseguiu simplesmente ignorar.
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O que seus olhos escondem
RomanceDesde o dia em que seus olhos se encontraram, Bakugou havia ficado curioso, e irritado, em como aquele sorriso tão radiante poderia aparecer acompanhado de olhos tristes. Mas Kirishima faria de tudo para esconder.