Ela não queria esquecer. Molly Weasley não queria se esquecer de seus netos – de sua família! – de todo o amor compartilhado e dos momentos especiais que passara com cada um deles, entretanto o tempo se mostrava cruel com ela. Diariamente percebia os sinais que não queria aceitar: o fogão esquecido ligado, a porta sem fechar, o nome de alguém trocado, o esquecimento completo de um acontecimento recente e a perda constante da noção do tempo, além dos erros incomuns na hora de cozinhar. Molly sabia antes de qualquer um o que estava acontecendo: ela teria Alzheimer e nenhuma magia a curaria.
Era irônico como nesse momento, sentada a velha mesa da cozinha, ela não se lembrasse de como contou aos filhos o que estava acontecendo – ou eles teriam descoberto por si mesmos? – Deveria ter sido um momento marcante, provavelmente houve muita tristeza e até mesmo algumas lágrimas. Era melhor não se lembrar, Molly decidiu, afinal não gostava de ver ninguém de sua família descontente. Sim, era melhor assim. Entretanto, os momentos felizes ela não queria se esquecer – não podia se esquecer – eram esses momentos a luz de seus dias, a sua felicidade. Se ela se esquecesse deles e de seus integrantes, o que restaria de si mesma? O que restaria de sua família? Não, esses momentos tinham que ficar.
Mais cedo do que gostaria, Molly percebeu que começara a se esquecer de eventos de alguns anos atrás, principalmente relacionados aos seus netos. Não conseguia mantê-los consigo em sua memória, o que a deixou muito irritadiça. Ora, ela só queria se lembrar, era pedir muito? Aparentemente era, o que a fez ficar abatida por dias. Até ter aquela ideia genial, a qual fora previamente anotada em um pergaminho para que não se esquecesse. Escreveria uma carta para cada um de seus netos, lembrando-os que ainda se lembrava deles, daqueles momentos marcantes. Porque ela poderia se esquecer daqueles acontecimentos, mas não queria que eles se esquecessem. Deveria ter sido tão importante para eles quanto para ela, não?
Organizando os pergaminhos amarelados ao lado da tinta sobre a mesa, Molly abriu um sorriso triste ao lembrar do dia em que fora comprá-los. Às vezes, achava que o tempo era mais cruel por fazê-la se lembrar daquele dia do que por fazê-la se esquecer dos demais. Sempre havia algum filho ou neto em sua casa – hoje era o dia de Hugo – e nesse dia não foi diferente: Ginny estava lá, distraída cozinhando algo. Ela não pensou que teria algum problema ir até a Floreio e Borrões para comprar alguns pergaminhos novos; era algo simples, afinal. Não tinha se perdido e conseguira comprar certo o que queria, voltando poucos minutos depois para casa, ou pelo menos era o que achava.
Quando retornou à Toca, sua casa estava uma confusão, com alguns de seus netos e filhos gritando seu nome pelo terreno, enquanto outros sobrevoavam com vassouras. O que estava acontecendo? Ao se aproximar da casa, ouviu o choro baixo de Ginny, o que a fez se aproximar mais rapidamente, mas foi interceptada por uma das netas.
"Vó? Oh, graças a Merlin! Onde a senhora estava?"
Molly não se lembrava mais qual neta que a perguntara e sequer o que respondera. Apenas se lembrava de chegar até Ginny, a qual chorava copiosamente no ombro de Harry, e receber um abraço sufocante da filha.
"Ah, mãe! Fiquei tão preocupada com a senhora! Onde você estava?"
"Eu só fui até a Floreio e Borrões comprar..." lembrava-se de parar de falar assim que percebeu que não havia nenhum pacote em suas mãos. Ela esquecera os pergaminhos? "Não, não é possível! Eu tenho certeza que comprei e peguei os...Ginny...você tem que acreditar que eu...não..."
"Está tudo bem, mãe. Fique calma, ok? Harry, pegue um copo de água para ela, por favor. Ela está um pouco...agitada."
Naquele dia, apesar de toda a sua família passar a noite unida na Toca, Molly não conseguiu tirar o gosto amargo da boca. Porque aquela frase de Ginny, tão conciliadora e amorosa, jogara a realidade como um banho de água frio nela: ela tinha Alzheimer e se esquecia das coisas com facilidade. Nunca mais seria a mesma pessoa e, aos poucos, se esqueceria de tudo e todos. Se esqueceria de si mesma. Se esqueceria de Arthur. Se esqueceria de Charlie, Bill, Percy, Fred, George, Rony e Ginny. E também se esqueceria – e já estava se esquecendo – de Victoire, Dominique e Louis; de Molly II e Lucy; de Fred II e Roxanne; de Rose e Hugo; de Lily Luna, Albus Severus e James Sirius. Tudo e todos que realmente importavam para ela. E, no fim, só sobrariam frases pedindo que ela se acalmasse porque estava "agitada" demais.
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Dear Grandchildren
FanficPorque Molly Weasley lembrava de tudo sobre os netos: de seus nascimentos, de seus gostos, de seus namorados, de suas vidas. Até não se lembrar mais. Porque Molly Weasley tinha alzheimer e nenhuma magia a curaria. | One-shot • Maio Weasley |