Lembre-se que és minha

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PONTO DE VISTA PEDRO
A noite da recepção aos príncipes havia sido uma aventura. Começou com o príncipe Gastão confundindo as duas princesas. Em seguida, Leopoldina convidara aquele oficial da Marinha, Bernardinho, e seus pais super deselegantes para provocar discórdia na Quinta. Depois, o príncipe Augusto desmascarara o oficial, que não era oficial coisíssima nenhuma. Por fim, Teresa cantara uma Ária para encerrar a noite.
Teresa. Ah minha doce Teresa. Não aguentei vê-la hoje ao lado do General Dumas. Conversando toda animada, sorridente e gesticulando com as mãos. Não suporto a impressionante a falta de compostura do General. Lá estava ele na recepção se insinuando para a minha esposa. Minha Imperatriz. A Imperatriz do Brasil. A mãe dos meus filhos. Uma Santa. Quem pensa que ela apenas é uma figura silenciosa que se esconde por trás de mim, da opulenta figura do Imperador, está redondamente enganado. Ela é uma mulher maravilhosa, que tem interesse pelas artes, pela arqueologia e que ainda por cima canta divinamente. Ouvi-la falar sobre a sua paixão pelo Brasil e o seu desejo de ter aquelas múmias em nosso museu me deixou completamente emocionado. Não tem como negar minha grande admiração por ela e a nossa afinidade intelectual. Apesar de cantar maravilhosamente bem, ela ficou toda tímida e ruborizada quando Dumas anunciou que ela cantaria uma de suas árias favoritas na recepção de hoje.
Maldito Dumas! Minhas emoções ficaram divididas quando ele disse que a Imperatriz ia brindar a todos entoando uma Ária do grande Giuseppe Verdi. Por um lado, fiquei surpreso, porém contente com a oportunidade de ouvir a sua voz celestial. Por outro, fiquei perturbado ao notar o encantamento do General Dumas pela minha Imperatriz. Sabe o que Luísa me sugeriu? Que em vez de ficar rosnando de ciúme eu deveria desafiá-lo para um duelo. Eu lhe disse que não era ciúme, que era apenas porque ele era maçante e inconveniente e, em respeito a Imperatriz, não queria que ela precisasse lidar com pessoas chatas em situações inconvenientes. Entretanto, admito que falei uma inverdade para Luísa. Disse-lhe que não era ciúme, mas era sim.
Não é a primeira vez que sinto ciúmes da Imperatriz, mas foi a primeira vez que tive uma plateia tão grande, a primeira vez que Luísa estava presente, e a primeira vez que não consegui me controlar. Para atenuar a suspeita de Luísa de que eu estava com ciúmes da Imperatriz, marquei de encontrá-la na noite seguinte. Em nosso lugar habitual. Caso ela não aparecesse novamente, ela estaria com Dumas. Também ficava com ciúme de Luísa de quando Dumas se aproximava dela, mas era diferente. Luísa era Luísa. Teresa era a minha Teresa.
Assim que a Imperatriz terminou de cantar, o jantar foi servido. Todos nós nos alimentamos muito bem e interagimos bastante com todos os convidados. Como Imperador, não pude deixar de me dirigir a todos, assim como a Imperatriz. Contudo, ao contrário de mim, um sagitariano prático e direto, ela, como pisciana, simpatiza muito mais com as aflições alheias e demonstra carinho e atenção a todos. Nosso casamento foi um excelente acordo entre reinos, pois ela é a melhor Imperatriz que o Brasil poderia ter. Após o jantar, os convidados foram se retirando aos poucos. Por fim, os príncipes Augusto e Gastão se retiraram para a casa de Luísa, junto do General Dumas. Não pude deixar de reparar que, apesar as princesas já possuírem quartos separados há anos, hoje elas voltaram ao quarto de infância juntas para conversar sobre a recepção.
Ao me retirar para os meus aposentos e tentar dormir, percebi que meus pensamentos se voltavam sempre para Teresa. Pensava em sua voz celestial, nos gesticulação de sua boca ao cantar, nos seus doces lábios. Não podia deixar de me indagar se Dumas também sonhava com os mesmos lábios que eu. Não foi a primeira vez que eu os vi interagir tão calorosamente. Algumas noites atrás, no primeiro jantar do General na Quinta, Teresa conversou com ele sobre a proximidade dos corpos, a mão na mão durante a valsa. Eu devia tê-la chamado para dançar hoje. Caso não tivesse sido tão distraído ela não teria me empurrado para os braços daquela mulher mal-educada, a tal de Baronesa de Fervedouro, ou Lota Batata-Baroa chantagista de múmias (como Teresa se refere a ela quando estamos a sós). Deveria ter dançado com a minha Imperatriz na frente de Dumas. Deveria ter posto as mãos nela, deslizando-as pelas suas costas até chegarem em sua cintura. Deveria ter pressionado seu corpo contra o meu, de modo a todos no salão perceberem como os nossos corpos se encaixam tão bem, como eu sei puxá-la contra mim com tanta facilidade e naturalidade. Deveria ter apertado-a contra mim de modo a sentir seus seios pressionarem contra o meu abdômen, de modo sentir minha ereção roçar contra seu ventre. Havia, afinal, alguma vantagem em se ter uma mulher pequena.
Não adianta remoer-se sobre o passado. Devo pensar no presente, no futuro. Devo pensar que nesse exato instante minha Imperatriz está em outro quarto, sozinha. Preciso lembrá-la de que, apesar de todas as atenções do General Dumas ela continua sendo alguém que pertence somente a mim, e a mais ninguém. Por isso que marquei o encontro com Luísa amanhã, porque esta noite precisava lembrar Teresa disso. Ela era o meu acordo entre reinos. A minha Imperatriz. Não podia deixar que a aurora despontasse sem que eu lembrasse a minha napolitana a quem ela pertencia.
Deixei meus aposentos e caminhei até o quarto da Imperatriz. Hoje eu a colocaria num pedestal. Hoje eu enalteceria o seu corpo e beijaria toda a extensão de sua pele. Hoje eu a devoraria por inteiro. Hoje eu a deixaria extasiada de piacere, a tomaria em meus braços e a faria minha lentamente. Hoje, Dona Teresa Cristina ia lembrar que é o meu acordo entre reinos, e de mais ninguém.

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