Lembre-se que és meu

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PONTO DE VISTA TERESA
​Che bella notte! Io sono molto contenta pela recepção dos príncipes ter sido um sucesso. Il principe Gastão se mostrou inadequado para assumir a função de Príncipe Imperial Consorte ao confundir le mie principesse. Já il príncipe Augusto se mostrou um ragazzo responsabile ao desmascarar o filho de Dona Lota como um ciarlatano. Punto per me! Porém, a melhor parte da noite nem foi os príncipes com le mie bambine, e sim foi receber um pouco de atenção de um bell'uomo.
Interagir com o General Dumas foi tão prazeroso. Ele é um homem muito engraçado, inteligente e culto. Passamos grande parte da recepção conversando sobre meu interesse pelas artes, pela arqueologia e pelo canto lírico. Surpreso diante de minha revelação, Dumas me persuadiu a cantar uma ária de Giuseppe Verdi perante todos os nossos convidados. Confesso que enrubesci quando ele anunciou minha empreitada musical aos nobres presentes. Entretanto, deixei minha timidez de lado e me pus a cantar.
Aah! Io amo cantare, la musica mi rende completo, la musica mi rende felice. O sentimento transmitido através das notas, o vibrar das cordas vocálicas ao entoar a canção, a liberação da energia, do amor, da emoção em intervalos musicais melódicos e harmônicos... tudo isso faz com que eu me sinta completa e feliz. Mia famiglia a Napoli, mio marito Pedro, tutti mie bambine, o Brasil, a arqueologia, a ciência, o patrimônio histórico e as artes, em especial a música, são as coisas mais importantes della mia vita.
Foi maravilhoso poder perceber que Dumas valorizava as minhas paixões. Além de dizer que minha voz era celestial, fazendo-me corar profundamente com o elogio, il generale comentou que eu merecia ser colocada em um pedestal por mio marito. Io apenas sorri e mudei de assunto, comentando sobre algum aspecto trivial da recepção aos príncipes. Não queria deixar transparecer que sentia saudades das atenções de Pedro.  Entretanto, não podia reclamar. Hoje, enquanto cantava, Pedro não deixou de olhar para mim por um segundo. Creio que, não só ele não desviava o olhar de meus lábios, mas também ignorava as tentativas da Condessa de tentar conversar enquanto eu cantava. Notando isso, olhamos nos olhos um do outro durante toda a ária. Ao terminar, podia jurar que o Imperador estava olhando para mim com uma mistura de orgulho de desejo, mas este último sentimento talvez tivesse sido fruto de minha imaginação, a qual é incrivelmente fértil. As atenções de Dumas são bem-vindas, mas nada se compara a ter o Imperador admirando-me.
Quase puder pensar que Pedro estava com ciúmes de mim. Quase. Eu bem sei que Pedro nunca sentiu ciúmes de mim, somente daquela Condessa de Barral, la puttana che soddisfa i tuoi desideri sessuali. Não suporto mais aquela mulher dissimulada em minha casa. Ela arruinou a minha vida e tirou tudo o que era meu. Estou cansada daquela intrometida mandando e desmandando em minha casa, roubando as minhas filhas e o meu marido. Pedro não é qualquer homem. Sua singularidade não se reduz ao fato de que ele é l'imperatore del Brasile. Pedro é especial perché é meu Pedro. Ele é meu marido. Meu Imperador. Pai de meus filhos. Apesar de todas as noites passadas com aquela mulher, ele continua sendo alguém que pertence somente a mim, e a mais ninguém. O Imperador é de todos os brasileiros, mas Pedro é meu. Às vezes eu gostaria que ele lembrasse a quem pertence com mais frequência.
Tenho suportado os últimos oito anos com muita tristeza e sofrimento, mas muito se engana quem pensa que ao longo de todos esses anos nós não passamos nenhuma noite juntos. Pedro apenas precisa de um empurrãozinho para voltar aos meus braços. Como naquela noite na fazenda de Tonico. Pedro passou dias emburrado com o mundo, inclusive comigo, mas assim que percebeu que nós dividiríamos um leito, não titubeou em estender a mão, me acariciar, me beijar e me amar a noite toda. Che bella notte! Io sono molto contenta sempre que Pedro me toma novamente como esposa. Embora tivéssemos aposentos distintos, eventualmente Pedro sentia-se solitário, com desejo ou com algum outro sentimento que nunca fez questão de me explicar e batia em minha porta, já que não havia como visitar a Condessa em plena madrugada. Mesmo sabendo que nossa situação não mudaria quando a aurora despontasse, não podia deixar de resistir aos seus encantos. Io também tenho desejos, apesar de não os verbalizar. Desejava que Pedro me deixasse extasiada de tanto piacere, que ele enaltecesse meu o corpo e beijasse toda a extensão de minha pele. Desejava que ele me tomasse em seus braços e me fizesse sua lentamente. Ao sentir os olhos de Pedro sobre meus lábios, enquanto eu cantava, criei a esperança de que o meu desejo fosse se tornar realidade.
O jantar foi servido e eu interagi com os convidados até o horário deles se retirarem da Quinta. Os príncipes foram para a casa da Condessa, junto com General Dumas. As meninas foram para o quarto delas de infância. Io fui para mia stanza e o Imperador para seus aposentos. Já que aparentemente meus sonhos não iam se concretizar, despi-me de meus trajes formais, vesti minha camisola de dormir e deitei-me em meu leito.
Estava imersa em meus devaneios quando ouvi uma sequência de batidas na porta. Através do ritmo e da quantidade de toques pude saber que era Pedro. No começo de nosso casamento, havíamos definido três tipos de toque diferentes para se bater na porta. O primeiro era um toque simples, que significava apenas que o Imperador gostaria de entrar para falar sobre alguma trivialidade. Por exemplo, para comentar a beleza do dia, sobre uma passagem interessante do livro que estava lendo ou perguntar se eu já estava pronta para jantar. A segunda combinação de toques era mais complexa. Ela significava que havia acontecido alguma emergência e eu precisava ir correndo ao seu encontro. Ela significava que nossas filhas estavam doentes, que alguém havia invadido o palácio ou que estávamos passando por uma crise política que demandava ação imediata. O segundo toque me deixava apavorada. Já o terceiro toque também significava uma emergência, mas era uma emergência de outra natureza. A terceira combinação de toques significava que ele precisava de mim, que ele queria ter-me em seus braços. Por essa combinação eu ansiava, pois ela criava em mim a expectativa de passar a noite fazendo amor com Pedro. Para meu contentamento, foi a terceira batida que ouvi soar através da porta.
Levantei-me da cama e caminhei até a porta com a intenção de abri-la. Mal pude identificar o rosto de Pedro e o Imperador já foi encostando seus lábios contra os meus com um desespero que há muito tempo desconhecia. Era como se ele fosse um homem à beira da morte e meus lábios fossem o último fio que o prendesse a vida, a qual ele não podia soltar de jeito nenhum. Fui pega de surpresa pois não esperava encontrá-lo tão sedento assim. Algo deve ter acontecido. Algo deve tê-lo perturbado.
Quando Pedro batia na porta de meu quarto – mesmo com o terceiro toque – ele normalmente era tímido, como se estivesse encabulado por estar vindo visitar a própria esposa ou como se eu fosse a mesma menina que veio de Napoli e precisasse ser tratada como um vaso de porcelana chinesa delicadíssimo que precisasse ser cuidado com muito esmero. Hoje Pedro não estava assim. Ele passou suas mãos pelos dois lados de minha face até entrelaçar seus dedos em minha nuca, puxando meu rosto de encontro ao seu. Pedro pressionava minha cabeça contra a sua, meus lábios contra os seus, de modo que, mesmo que eu tentasse, não conseguiria separar os nossos corpos. Apesar de seu desespero em se aproximar de mim, seus lábios foram incrivelmente gentis ao tocarem os meus. Seus lábios suaves e delicados despertavam terminações nervosas em toda a minha pele. Por ter sido pega de surpresa, minhas mãos estavam desocupadas ao lado de meu corpo. Assim que me recuperei de seu avanço repentino, comecei a retribuir o beijo com a mesma intensidade que ele me beijava. Passei meus braços por seus ombros e entrelacei meus pulsos atrás de sua cabeça, a fim de aproximá-lo mais ainda de mim.
Os lábios do Imperador entreabriram os meus para aprofundar o beijo. Senti sua língua passeando por dentre os meus lábios e penetrando a minha boca. Nossas línguas deslizavam juntas como se estivessem em conflito para determinar quem controlaria o beijo. Pedro ansiava pela vitória, mas eu não ia renunciar ao campo de batalha. Pedro sugava, lambia e mordia meus lábios, minha língua e minha boca. Quando precisamos descolar as bocas para respirar, eu parecia um peixe fora d'agua. Pedro não devia estar com a mesma dificuldade que eu, pois logo removeu suas mãos de minha nuca e deslizou-as pelas minhas costas até se firmarem em minha cintura. Seus beijos se direcionaram para o canto de minha boca e depois seguiram para a minha bochecha, para a linha de meu maxilar, até chegarem em meu pescoço. Io sono una donna piccola e, ao ser pressionada contra ele, pude sentir meus seios contra o seu abdômen e sua ereção roçar contra o meu ventre. A junção de nossas carnes colidindo, de sua considerável compleição física contra a minha, da evidente prova de seu desejo despontando em minha direção e dos seus lábios sugando o ponto específico de meu pescoço que ele sabia que me fazia ficar com as pernas bambas, fez com que meu seios ficassem mais pesados, meus mamilos intumescessem e minhas partes intimas ficassem úmidas. Eu o queria. Eu o desejava.
Ele fazia tudo aquilo querendo aumentar o meu desejo, para que eu o implorasse para tomar-me como sua. Mas por que ele fazia aquilo? Ele sabe que eu sou dele, fui desde o momento em que o vi pela primeira vez e serei até o dia de minha morte. Não é que eu não gostasse de ter o Imperador do Brasil enaltecendo o meu corpo com tanta paixão, mas eu gostava mais quando ele era carinhoso, me enchia de beijinhos, deslizava sua mão suavemente pelo meu braço e encostava seu nariz contra o meu. Mesmo sabendo que ele não me amava, sempre fizemos amor sorrindo, com beijos suaves e movimentos lentos. Eu era o seu conforto, não o seu turbilhão de emoções. O amor está na segurança, e não no desespero.
Os beijos, lambidas e chupões de Pedro estavam descendo pelo meu pescoço e se aproximando do decote da camisola. Por mais que eu quisesse senti-lo venerando meus seios, não ia permitir que ele me tomasse sem qualquer explicação por sua ação repentina. Seu comportamento habitual não se dava dessa forma. Io não ia ser uma substituta para a sua amante. Se ele quisesse me ter, ele deveria ter plena consciência de que estava fazendo amor com sua esposa, sua Teresa, e não meramente aliviando seus impulsos carnais com qualquer mulher – em especial com a Condessa de Barral – como amante.
– Pedro, Pedro, amore mio, pare! O que significa isso?
– Como assim o que significa isso, Teresa? Estou aqui para lembrá-la de que és minha. Você tem deveres como esposa. Está recusando o seu marido? – apesar de estar contestando a minha interrupção, o Imperador é um cavalheiro, e parou imediatamente assim que percebeu que io estava hesitando em seus braços.
– Io? Não, só gostaria de compreender o seu comportamento. Aconteceu alguma coisa hoje na recepção aos príncipes para te deixar dessa forma?
– Como assim, Teresa? Se aconteceu alguma coisa? Aconteceu que eu a vi conversando toda animada e sorridente com o General Dumas! – respondeu Pedro
– E qual é o problema em o General Dumas ser atencioso comigo? – questionei
– O problema é que você é minha mulher e é natural que eu não queira vê-la conversando com outros homens. Especialmente com o General Dumas. Lá estava ele na recepção se insinuando para você, a minha esposa, a minha Imperatriz, a Imperatriz do Brasil! É impressionante a falta de compostura do General. E não é a primeira vez que eu vejo vocês interagirem dessa forma...
– Pedro, que disparate!
Pedro parou de falar e ficou calado por um bom tempo. Seus olhos se perderam em algum ponto do quarto e ele ficou imerso em devaneios. Quando ele voltou a realidade, já estava mais calmo, sua voz deixou de soar irritada e assumiu um tom mais sereno. Entretanto, quando seu olhar se encontrou com o meu, ele me olhava com um olhar de posse, como se quisesse dizer, apenas com os olhos, que eu pertencia a ele e a mais ninguém. Caso não conhecesse o Imperador tão bem quanto eu conheço, diria que é ciúmes. Mas Pedro nunca sentiu ciúmes de mim. No dia em que isso acontecer até anotarei em meu diário.
Delicadamente, Pedro pegou a minha mão, levou-a até seus lábios em um beijo casto. Em seguida, sem desviar seus olhos dos meus, aproximou sue boca de meu ouvido e sussurrou baixinho, num ronronar suave que ele só utilizava em nosso leito nupcial:
– Eu devia tê-la convidado para dançar hoje. Deveria ter dançado com a minha Imperatriz na frente de Dumas. Ambos sabemos como a Vossa Majestade adora a proximidade dos corpos e a mão na mão durante a valsa. Deveria ter posto uma de minhas mãos sobre a sua, enquanto deslizava a outra por suas costas até aproximar sua cintura de mim. Deveria ter pressionado seu corpo contra o meu, de modo a todos no salão perceberem como os nossos corpos se encaixam tão bem, como eu sei puxá-la contra mim com tanta facilidade e naturalidade. Deveria ter deixado Dumas imaginar como essa naturalidade se manifesta quando eu a faço minha esposa.
Não podia suportar que Pedro continuasse com isso. Ele estava me torturando com suas palavras. Eu estava enxarcada. Meus fluidos saiam do meu corpo e deslizavam por entre os meus lábios até molharem as minhas coxas. Minha feminilidade precisava dele. Estava inebriada de desejo, precisava ser preenchida e saciada. Meus mamilos chegavam a doer de tão intumescidos que estavam, despontando como dois pequenos montes sob minha camisola. Precisava dele agora. Pedro abaixou o olhar para o meu corpo, como se percebesse as reações que eu tinha por ele.
– Ademais, Teresa – continuou o Imperador – Vossa Majestade canta muito bem, fiquei muito orgulhoso de vê-la cantar. Contudo, devo ressaltar que prefiro ouvir a sua voz celestial quando está gemendo baixinho sob mim em nosso leito nupcial, quando está pedindo que eu a ame mais, quando se contorce até chegar no ápice do nosso acasalamento.
Eu sei que Pedro falou de forma séria e para me deixar excitada. Eu estava excitadíssima, mas não pude evitar de cair na gargalhada quando Pedro falou a palavra "acasalamento", como se nós fossemos dois animais livres na natureza que estivessem esperando a primavera para entramos na temporada de acasalamento. Sinceramente, Pedro poderia ter pensado em algum outro sinônimo. O Imperador poderia ter ficado triste ou ofendido com minhas risadas, mas nós não somos assim. Assim que eu comecei a rir ele deixou a pose séria de sedutor e começou a rir também. Passamos muitos minutos rindo nos braços um do outro, vermelhos de tanto dar risada. Quando acalmamos um pouco, olhei nos olhos do meu marido e disse:
– Ora che lo so che Vossa Majestade prefere ouvir a minha voz celestial quando está gemendo baixinho sob ti em nosso leito nupcial do que quando está entoando uma ária de Giuseppe Verdi. Quer saber o que eu prefiro agora?
– Qual seria então o desejo da Imperatriz do Brasil?
– Gostaria que você dançasse uma valsa comigo, que eu pudesse sentir a proximidade de nossos corpos, a sua mão na minha mão...
– Que tal ambos terem os desejos saciados? Que tal eu ouvir a sua voz celestial quando está gemendo baixinho sob mim em nosso leito nupcial enquanto nossos corpos valsam de tão próximos que eles se tornam um e a minhas mãos seguram ambas as suas mãos sobre a sua cabeça ao passo que eu penetro lentamente o interior do seu ser e a lembro que és minha?
Como eu poderia resistir a essa proposta tão tentadora?
– Hmm Vá bene!
– Vá bene?
– Vá bene!
Pedro beijou meus lábios novamente, mas dessa vez o beijo era diferente. Esse beijo tinha gosto do Pedro que eu conhecia. Do meu Pedro. Amanhã a noite ele poderia até buscar conforto nos braços de outra mulher, mas hoje ele não ia passar vontade. Hoje eu o faria gozar dos prazeres do paraíso. O faria lembrar que, apesar de todos os pesares eu era a sua mulher, a sua Teresa, e havia um motivo pelo qual, apesar de todas as suas andanças, ele sempre voltava para mim.

Lembre-se que és minhaOnde histórias criam vida. Descubra agora