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OUTRA SALA de espera. Eu não poderia ter imaginado nada melhor que isso para hoje.

Suspiro pela vigésima vez, desde que a Senhora Price, orientadora do colégio, decidiu que queria me ver e me mandou esperá-la no corredor à frente de sua sala.

Eu faria qualquer coisa para pular essa conversa, mas estou sem opções. Escondo meu rosto entre as mãos e suspiro, outra vez.

— Olá, Senhorita Ninguém — alguém diz, e afasto as mãos do rosto. Não evito revirar os olhos quando vejo Ryan passando pelo corredor com um sorrisinho idiota nos lábios avermelhados. Ele acena para mim, a alça da mochila pendurada em um dos ombros. — Tchau, Senhorita Ninguém.

Observo-o ir embora e bufo por pura inveja. Eu também queria ir embora, para casa ou qualquer outro lugar.

Lembro do caderninho quando o jogador some do meu campo de visão. Abro a mochila e o procuro entre os livros da última aula. Nem sei porque o trouxe, mas não tive tempo nem vontade de lê-lo ontem, e agora a curiosidade está me matando.

Abro na primeira página. "Poesia para a vida pós-morte". Solto uma risada preenchida de puro escárnio. Eu não preciso disso. Não preciso.

Meus olhos seguem para a porta à minha frente e mordo o lábio inferior.

Eu não preciso disso, mas já estou aqui há quase meia hora e não sei quanto tempo ainda terei de ficar, por isso viro a página.

Eu não preciso disso, mas já estou aqui há quase meia hora e não sei quanto tempo ainda terei de ficar, por isso viro a página

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Já li mais da metade do caderninho quando a orientadora finalmente me chama. Suspiro ao entrar na sala e volto a suspirar ao sentar na cadeira.

— Olá, Emily — ela me cumprimenta, enquanto se aconchega na sua poltrona marrom. — Como você está?

Péssima.

Horrível.

Muito, muito ruim.

Pior impossível.

— Estou bem — minto, sem olhá-la.

— Não precisa tentar ser forte comigo, Emily — ela rebate, jogando seu cabelo castanho para trás dos ombros.

— Não estou.

— Eu sei que pode ser difícil, mas...

Não estou mais ouvindo. Minha atenção está completamente focada no raio de sol que atravessa a janela do escritório e acaricia meu braço, tornando-o reluzente como se desenhado pelas estrelas. Só de olhar posso nomear esse fenômeno: vida.

Se eu estivesse morta, provavelmente não seria tão bonito ver o Sol tocando em mim.

Mamãe nunca mais vai poder sentir o Sol a banhar de luz. E para piorar, seu corpo foi jogado embaixo da terra como se ela fosse um coelho atropelado e sepultado por alguém que não tem o mínimo de sensibilidade. Não entendo porque meu pai não aceitou cremá-la. Tenho certeza de que ela iria preferir que suas cinzas fossem jogadas ao vento e espalhadas ao redor do mundo do que ficar inteira, mas presa a sete palmos. Tenho certeza de que ela teria escolhido a liberdade.

A parte mais triste disso tudo é que ela amava viver.

Há pessoas no mundo que simplesmente se deixam levar pela correnteza e desprezam a dádiva da vida.

Minha mãe não era assim. Ela sempre admirou os menores detalhes e aproveitou ao máximo cada instante.

Ela não passava um dia sem olhar em meus olhos e dizer que me amava. Nem mesmo a doença a tornou diferente.

— Você entende isso? — ela pergunta, quando ergo o rosto para olhá-la. Assinto, mesmo confusa. — Se precisar, estarei aqui.

— Obrigada, Sra. Price — digo, forçando um sorriso. — Eu posso ir?

Ela balança a cabeça em confirmação e me levanto o mais rápido possível, seguindo em direção à porta. Suspiro, dessa vez, aliviada. Finalmente vou para casa, mesmo sem saber se isso ainda é uma coisa boa.

 Finalmente vou para casa, mesmo sem saber se isso ainda é uma coisa boa

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