III- Gaiola de Pássaro.

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O som de passos provocando
pequenos rangidos no piso de madeira desgastado foi abafado quando seus pés tocaram o grande tapete vermelho com padrão de flores entrelaçadas. Rosas e camélias.

Teria sido mais difícil de adivinhar quem era aquele por trás de um caminhar tão leve, se não fosse pelo já conhecido suave batucar da bengala no chão. Estava evitando encarar seu rosto, então me concentrei em seus sapatos: Pretos, com bico fino e muito bem lustrados; brilhantes.

Subindo para as pernas longas, as calças cintura alta bem ajustadas com uma fileira de oito botões dourados de cada lado. O tecido azul-escuro da sobrecasaca, tão comprido que quase chegava à altura de seus joelhos, forrado com um tipo de acetinado vermelho. E claro, o famoso colete. Dava a sua silhueta um aspecto ainda mais magro e curvilíneo, do tipo que deixaria qualquer modelo com inveja.

Era a primeira vez em que eu prestava tanta atenção à vestimenta de alguém, Ele estava usando um clássico traje casual vitoriano. Só faltava a cartola.
Ele também se movia de maneira muito ágil apesar de suas roupas, como um cisne na água. Não era necessário erguer muito os olhos para ver um pedaço de seu cabelo loiro impecável. Mãos enluvadas, ombros largos, rosto perfeito.

Olhar para ele quase fazia com que eu quase me esquecesse de respirar.

Me esqueci completamente de ficar com raiva dele. Não é algo que eu chamaria propriamente de desejo, mas ele me prendia; me encantava. Alternando entre a incivilidade e a delicadeza, como seria se as borboletas tivessem ferrão.
Deixando um pouco de lado meus pensamentos maculados, percebi uma agitação em sua postura normalmente contida, como quem hesita em se aproximar. Ele parecia estar escolhendo cuidadosamente as palavras antes de começar a falar.

Era eu quem deveria estar nervosa.

Talvez ele estivesse envergonhado por seu comportamento rude mais cedo, ou talvez estivesse com receio de me fazer chorar de novo, pois aos seus olhos eu era uma criança descontrolada e de sentimentos frágeis. Aquilo foi apenas fruto do calor do momento, não iria se repetir. Eu não lhe daria esse gostinho outra vez. Por isso decidi falar primeiro.

Limpo a garganta.

— Boa noite.

Disse em um tom brando e sem quaisquer sinal de afetação, resolvi ser cortês e ver no que dá.
Era como se ele tivesse sido desperto de algum tipo de transe assim que ouviu a minha voz. Respondendo prontamente.

—  Boa noite, senhorita. Vejo que encontrou este lugar sem muitos problemas.

Bisbilhotando de novo, huh?

—  É sim, acho que sim.

Dou um sorriso sem jeito, sinto que sei o que ele está pensando. Ele parece ter a mesma impressão sobre mim.

— Não me entenda mal, é bom ver que mais alguém compartilha o hábito da leitura, para dizer a verdade, esse espaço não é muito utilizado pelos outros moradores da casa.

Minha nossa, essa provavelmente foi a frase mais longa e livre de insultos e ameaças que ele me disse desde que nos conhecemos. Cortesia sem sarcasmo, vamos lá.

— É um belo arsenal literário, se você me permite o palavreado. Isso sempre esteve aqui?

Ele dá um sorrisinho de canto acompanhado de um leve som nasal quando ouviu "arsenal literário" Estou imaginando coisas, ou ele está rindo?

— Mais ou menos. A grande maioria já estava aqui quando cheguei, mas há uma segunda parte que corresponde diretamente a uma herança.

— Uma herança? sua herança?

Meu Querido Vampiro. Onde histórias criam vida. Descubra agora