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ELA CORRE em minha direção. Eu fujo do seu toque com um sorriso. O sol bate no rosto dela apagando os detalhes dos quais não me lembro mais. Estou me esquecendo dela. Meu coração se aperta, mas não paro de sorrir. Ela finalmente me alcança e me pega nos braços. Giramos, a areia sob nossos pés. O barulho do vento e do mar abafa sua risada. Mandamos um beijo para o papai que registra o momento com uma filmadora. Estamos felizes. Verdadeiramente felizes. Até que ela simplesmente some.

Desaparece.

E agora estou em frente à sua lápide.

"Eleanor Mary Anderson. 11/15/1980—03/12/2022.

Mãe e esposa amada. Nos deixou cedo demais porque este mundo não a merecia."

Caio de joelhos, a chuva vem e tudo vira cinzas. Acordo chorando. Não grito. Apenas deixo as lágrimas rolarem. Olho para o teto, ainda deitada e respiro fundo. É cedo. A luz do Sol não atravessa a cortina, mas me levanto mesmo assim. Deixando Erin sozinha na cama, decido começar minha rotina de hoje agora mesmo, só para esquecer o pesadelo.

Na verdade, isso tem ocorrido com frequência. Sonho com alguma lembrança e então ela desaparece. Ela se vai e eu a perco para sempre. Igual todas as vezes

Penso que se eu finalmente conseguir encarar o nome dela na lápide, talvez isso pare. E eu quero que pare. Preciso que pare.

Meu pai chega em casa, antes que eu possa sair para correr

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Meu pai chega em casa, antes que eu possa sair para correr. Ele parece muito, muito cansado. Os olhos cerrados, a testa franzida e o corpo tenso refletem a noite difícil que deve ter tido. Ele trocou seu horário de trabalho no hospital quando o câncer da mamãe voltou, apenas para ficar com ela durante o dia.

— Pai — o chamo. Ele olha para mim e sorri. Ele parece exausto. Me aproximo e nos abraçamos. — Parece cansado.

— Ah, eu estou! — Ele se joga no sofá e tira os sapatos. Os olhos quase se fechando por completo. O plantão deve ter sido difícil.

— Pode ir deitar. Não se preocupe com nada. Eu levo Erin à escola — digo, indo para a cozinha.

— Obrigado.

— Quer comer alguma coisa antes?

Não recebo resposta. Volto para a sala e o encontro deitado no sofá. A respiração arrastada. Os olhos fechados. Sua expressão serena, me faz sorrir. Ele parece calmo e tenho um pouco de inveja disso.

Será que sou a única sendo assombrada durante o sono?

Volto para a cozinha, dando passos cuidadosos para não acordá-lo. Encho uma garrafa com água e pego um copo de vidro, deixo na mesinha da sala para ele, e então, saio para correr. 


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Aumento o ritmo da corrida, me sinto um corcel soberano do próprio destino. O sol nasce lentamente, enquanto anseio por ar a cada batida da música que atravessa minha alma em uma harmonia divina.

Paro com as mãos nos joelhos, deixando que a ventania me ultrapasse e chegue em casa antes de mim.

Observo a casa de dois andares, o exterior revestido por seixos campos do jordão, as janelas de vidro e o jardim elaborado ostentando a riqueza comum de um talentoso cirurgião.

Me pergunto se quando outras pessoas olham para ela conseguem enxergar a nuvem de dor que a cobre como eu consigo. Tento lembrar da minha vida antes, provavelmente eu estaria acordando agora. E minha noite teria sido muito mais tranquila. Mamãe e papai já estariam acordados na varanda, assistindo o nascer do Sol antes de ele ir para o trabalho.

Um calor agonizante marca cada pedaço de mim quando lágrimas se misturam ao suor decorrido da corrida. Caminho até o carro, com todas as forças que ainda tenho e enquanto giro a chave na ignição tomo uma decisão. O carro liga e tomo o caminho para o cemitério.

 O carro liga e tomo o caminho para o cemitério

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