A casa de Astérion

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   Nota: A história é inspirada na música "Minotauro de Borges" do Baco e também no próprio conto do Jorge Luis Borges.
   
                                   ×××

       ‘’ E a rainha deu a luz a um filho que se    chamou Astérion. ‘’

     1995.

    As botas de cano longo são sempre uma vantagem na chuva — pensou Zoro satisfeito enquanto caminhava pelas ruas mal iluminadas de Kamagasaki. Era alta madrugada e uma fina chuva caía molhando seus cabelos esverdeados. O pensamento de que sua mãe brigaria consigo se o visse andando debaixo da chuva em plena madrugada passou pela sua mente de relance.

     Mas ela não estava ali. Ela estava morta e enterrada ao lado do seu pai no cemitério de Osaka.

    Aquilo não importava. Nada daquilo importava afinal.

    Tentou distrair sua mente para pensamentos mais amenos, como por exemplo, o fato de estar chovendo fazia com que os rapazes da yakuza que vivam tentando recrutá-lo não lhe cercassem como todas as noites de céu limpo. Não que ele achasse ruim, às vezes era irritante. Eram tantos anos passando pelas mesmas ruas, convivendo com o mesmo tipo de gente e ouvindo as mesmas propostas que ele simplesmente acostumou-se a elas. Não gravava mais nomes, apenas rostos. A rotatividade era alta que não valia à pena se apegar as particularidades de cada um.
Porém, alguns permaneciam. Os que eram espertos o bastante para subir de cargo envelheciam na organização e sobreviviam ganhando respeito e reputação.

     Um desses exemplos vinha em sua direção naquele exato momento.

    — Zoro-san, não devia estar na chuva. As competições estão chegando. — Cumprimentou um homem na casa de seus 50 anos. Era alto, magro e possuía um cabelo escuro levemente sarapintado de mechas brancas que jazia em um rabo de cavalo baixo alcançando o meio das costas. Portava um guarda-chuva preto e fez questão de se achegar ao rapaz para protegê-lo das gotas que caíam.

     — Koushirou-Sensei, o que faz aqui a essa hora? — o moreno perguntou encabulado. Não era costume do mais velho estar tão tarde naquelas ruas.

     — Após o enterro, tive uma reunião. Resolvi esperar você, para conversarmos. Aceita um chá? — respondeu em tom bondoso.

    — Zoro encarou o homem a sua frente. Conhecia-o na mesma quantidade de tempo que tinha de vida.

     — Claro. — disse seguindo o outro até o pequeno dojo que era como sua segunda casa.

.

      — Quantos anos você tem Zoro? — o mais velho perguntou enquanto servia o chá verde.

      — Fiz quinze em novembro. — respondeu apreciando o calor que tomava conta de suas mãos. Olhou em volta, a pequena sala muito conhecida era limpa e organizada assim como todo o resto do espaço que integrava aquele centro de estudos.

     O garoto pensou em sua própria casa, do outro lado da rua. Ela também era simples e limpa. O aconchego que a mãe garantia com seus cuidados domésticos.

    Será que se manteria assim agora?

    — É verdade. Você e Kuina têm quase a mesma idade. Como vai o colégio?

    Quando pensava naquele lugar, pensava também na palavra.

    Hafu.

     — Vai bem. — respondeu voltando de seu breve devaneio e guardando silêncio.

     O homem respirou fundo antes de continuar

     — Zoro, sin-

     — Obrigada pela ajuda com o enterro. — o menino interrompeu num rompante.

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