Até que ponto você iria para mudar de vida?
Até onde você seria capaz de ir para acabar com a dor que sente na alma?
São essas questões que Helena Duval e Aline Garcia terão que enfrentar em "Uma Vida de Mentira".
Dores, sacrifícios, escolhas e uma...
Nunca foi tão difícil cumprir com a minha rotina matinal como hoje. Passar café, buscar pão, arrumar a mesa, acordar e arrumar a Alicia pra escola...tadinha da minha filha. Antes eu tivesse deixado a avó criar ela como ela tanto pediu quando a Alicia nasceu. Minha sogra é uma mulher de posses, jovem ainda, tem 46 anos, tinha 16 quando o Marcelo nasceu. O sonho dela era ter uma filha, mas ela ficou viúva quando ele era pequeno e nunca mais se casou. Ela ficou maluca quando a neta nasceu. Me implorou para deixar ela criar a Alicia. Às vezes, acho que teria sido melhor pra ela. Pelo menos não passaria falta de nada nem teria que aturar o pai que mal olha pra ela. Sirvo o café pros dois. Marcelo sai pro trabalho e entrego Alicia na perua escolar. Nem digo nada sobre não estar me sentindo bem porque o Marcelo não iria ligar mesmo e nao queria assustar minha filha. Depois que os dois saem, meço minha temperatura. Estou com 39,5 de febre. Não é à toa que me sinto mal. Arrumo a cozinha com muito esforço, já que qualquer movimento me falta o ar. Resolvo cancelar as encomendas de hoje. Levo tempo pois são mais de 30 telefonemas que precisei fazer. Levei umas duas horas nisso. Pego minha bolsa e vou até o pronto socorro. Chegando lá, me perguntam se tenho sintomas gripais e diante da resposta afirmativa, recebei uma senha especial e logo sou atendida
— Bom dia, sra Aline?
— Bom dia Dr, quer dizer, não muito né?
— O que sente?
— Cansaço, febre, dor de cabeça
— Quantos dias?
— Ah já nem sei, tentei ignorar porque minha vida é tão corrida...mas hoje piorou
— Mediu a temperatura?
— Sim, 39,5 antes de sair de casa
Ele então mede com o termômetro infra vermelho na minha testa.
— Aumentou, quase 40. Vá imediatamente até a sala de medicação. As enfermeiras irão medicar a senhora e em seguida volte aqui. Temperatura alta assim é perigoso dar convulsão
- Sim, eu sei. Até logo então
Vou até a sala de medicação, recebo paracetamol na veia e volto até a sala do médico
— Pronto, já já a temperatura baixa, agora deite-se aqui por favor. Vou examiná-la
Me deito na maca e ele começa a auscultar meus pulmões. A cara dele nao e boa
- Aline, eu não gosto do que ouço. Seus pulmões parecem comprometidos. Vou encaminhar você para fazer o teste covid e um rx dos pulmões ok
— Tá bom - respondo com medo
Saio da sala e faço tudo que ele me pede.
— Esse teste demora muito o resultado?
— Como você relatou que já sente os sintomas há vários dias, podemos fazer o do dedo, sai em meia hora.
Faço então o teste e o rx e aguardo na recepção.
(...)
Cerca de uma hora depois me chamam
— E então Dr?
— É...eu estava certo, você testou positivo e seus pulmões estão bem comprometidos. Preciso que chame um acompanhante, a sra precisa ser internada
— O que? É mesmo necessário?
— Sim, no hospital a sra consegue receber tratamento adequado, oxigênio...porém, precisa aguardar pois não há vagas no momento.
Peço que aguarde na recepção e enquanto isso chame um familiar
— Ok…
Saio da sala desnorteada. E agora? Como vou fazer com meu trabalho? Minha filha… Tenho que chamar o Marcelo. E sinceramente? Não queria fazer isso Pego o celular e envio a mensagem:
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Marcelo chega e vai falar com o medico. Alguns minutos depois volta
— O Dr está chamando você, disse que não há vagas no sistema público, mas que foram disponibilizadas algumas vagas no São Luiz
— São Luiz? É muito caro, nem pensar!
— Não vamos pagar nada. Parece que uma benemérita custeou algumas vagas pra receber quem não pode pagar
— Nossa! Então tá né...vamos lá falar com ele
— Olá Dr - digo
— Olá, entrem. Você tem como ir por meios próprios ou precisa de uma ambulância?
— Não, eu levo Dr, pode deixar - responde Marcelo
— Ok, podem ir então, apresentem essa guia la - ele me entrega um papel
Saimos do hospital e nos dirigimos ate o São Luiz. Chegando lá, sou imediatamente encaminhada a um quarto e Marcelo se despede de mim. Ele parece realmente preocupado
- Assim que deixarem eu venho te visitar ta? Falo com você pelo telefone. Fica tranquila.
— Tá bom - digo chorando
Marcelo quer me abraçar mas não deixo
— Não! Olha o vírus! Pensa na Alícia por favor. Antes de chegar perto dela, toma banho, se livra dessa roupa. Acho melhor pedir pra sua mãe buscar ela e ficar com ela uns dias. Você ficou muito tempo em contato comigo, é perigoso.
— Tem razão, vou pedir
Me despeço e entro no elevador acompanhada por uma enfermeira. Ela me encaminha para um quarto que parece ter sido improvisado. Claramente ali era um apartamento privativo. No leito ao lado, uma mulher dorme. Nem me viu chegar. Me deito, e a enfermeira me entrega uma máscara de oxigênio e diz pra eu respirar nela caso sinta dificuldade para respirar. Ela se retira e eu fico pensando na reação do Marcelo...ele disse que me ama, quis me abraçar...a muito tempo não tem essas atitudes. Isso só reforça a premissa que só damos valor a alguém ou algo quando perdemos. E ele claramente está com medo de me perder. Olho pra mulher ao lado, ela continua dormindo. Só consigo pedir a Deus que tudo dê certo.