CONTOS - Conto de Fat Menzary

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A procura da esperança


Minhas mãos tremem.

Acordei mais uma vez esta noite. As lágrimas não me deixam enxergar quando abro os olhos. Passo as mãos pelos pulsos ao mesmo tempo em que pressiono meu corpo a se levantar. Sinto que estou amarrada ainda.

Nem parece que já se passaram doze solaris que eu fui libertada. Fungo. E mais uma vez me desmancho num choro excessivo. Ainda que tenha tentado soluçar baixinho, acabo por acordar meu companheiro.

— Tá tudo bem? — Theite se debruça sobre meu corpo, abraçando-me pelas costas.

— Desculpe — sussurro.

— Ei, relaxa. Estou aqui com você.

Theite se mostrou compassível desde a primeira vez que o vi. Apesar de não o tratá-lo tão bem na maior parte do tempo, ele age com delicadeza sempre que se dirige a mim. Ainda não me acostumei com isso.

Vagaroso, moveu meu corpo em sua direção. Ficamos abraçados por um tempo, ali, um sentido a respiração do outro. A minha frenética e a dele profunda. Theite me guia, até estarmos novamente deitados na mesma cama. Ao fazer esse movimento uma onda de lembranças passou pela minha pele. As noites no chão frio e as incertezas do dia de amanhã.

Continuo a chorar. Theite nada diz. Ele nunca me repreendeu por esses momentos de fraqueza. Falava que as lágrimas limpavam todas as dores. Porém, essa impotência se enche no meu peito novamente de uma forma que meu único desejo é matar os trogloditas que fizeram isso comigo.

— Fat? — Theite sussurra no meu ouvido. Dou mais um soluço, e resmungo algo para que ele saiba que estou atenta. — Querida, meu amor, dona da minha vida — ele fala docemente, como sempre. Sua mão segura a lateral do meu rosto, fazendo com que meus olhos foquem nos seus, que apesar do escuro do quarto, posso enxergar o verde cristalino de sua íris. — Você está segura. Ninguém vai te tirar de mim. Ninguém.

Aceno com a cabeça e volto a encostar em seu peito. Apesar dele me consolar todas as noites com palavras bonitas e o afago não me sinto segura ainda. Foram muitos solaris de dor.

Abraçada a ele minha mente se recorda do início.

Eu era nova. Uma criança. Não me lembro se eu tinha uma mãe. Não lembro de família. Não me lembro de nada íntimo antes do cativeiro.

Só me recordo do maldito sentimento que me levou a aquele lugar. Havia acabado de descobrir meu steate. Eletricidade é algo maneiro e não muito visto entre os solarianos. Fui capturada como qualquer criança com fome. A comida vinha em migalhas eu apenas tinha que seguir a trilha.

— Ei, menina, vem cá — era um sujeito alto, não dá para esquecer daquele rosto, pois não era muiralo. Disso eu tinha certeza. Ele era um puro.

— Tenho que voltar — digo mastigando um maciço que encontrei no chão.

— Vem comigo! Tem mais comida por esse lado.

Essa falsa ilusão me levou a ficar presa por vinte solaris.

Reizém eram um puro que controlava o tráfico de muiralos. Administrava pelos menos três cativeiros. Dois deles que se encontravam na minha terra. O outro, em Runruma. Devido a esse motivo ele vivia viajando. Quando fui deixada a Oeste da terra dos Muiralos por Reizém, pensei que nunca mais iria vê-lo. O que seria um alívio para minha alma se isso acontecesse.

Dentro daquele lugar inóspito, percebi que meu steate era raro entre aqueles que estavam nos guiando. Ou devo dizer, maltratando.

Eram na maior parte puros que me obrigavam a ir de um lugar a outro. Possuíam armas tecnológicas que a OPRA nunca iria desconfiar. Não existiam códigos de identificação nelas. Naquela época eu desconhecia isso e mal podia imaginar que existiam leis que puniam esse tipo de comportamento.

Desvendando Solarium - SPIN OFFOnde histórias criam vida. Descubra agora