1 - Vazio.

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Dor de cabeça, trabalho demais. Passar a maior parte do dia trabalhando não têm sido fácil, mas é inevitável quando você não tem o que fazer em casa.
Era tarde, o sol já estava se pondo e eu estava arrumando algumas papeladas que Tamayo - meu superior baixinho e raivoso - me mandou organizar para o dia seguinte. Como sempre eu era a última que saía da delegacia. O que não era ruim, pelo menos eu não era parada por algum funcionário tagarela.

Com tudo organizado da forma que Tamayo mandou - "Quero tudo em ordem alfabética, Sierra!" -, pego todos os relatórios, minha bolsa e meu blazer e levo tudo até a sua sala, deixando os papéis lá. Menos um.
Um relatório de investigação me deixou muito interessada. Uma mulher de meia idade e seu namorado que aparentava ser jovem acusados de assalto a mão armada haviam fugido da prisão a um mês. O que me chamou atenção foi o fato de ela ser estranhamente parecida comigo. Eu planejava ler todo o relatório nessa noite e pedir a Tamayo para que me desse o caso.

Senti um aperto no peito antes de abrir a porta do meu apartamento, eu odiava ver o que eu havia me tornado. Uma mulher que dependia de bebidas para dormir, uma mulher que chorava na cama todas as noites.
Depois dele, depois que ele se foi, tudo que antes parecia completo se tornou vazio. Eu tinha uma casa vazia que era preenchida apenas por mim e meu gato. Não tinha decorações, não tinha vida. Apenas uma pilha de caixas espalhadas pela casa. Eu já não tinha disposição para arrumar minha própria casa.
A única coisa que me fazia levantar da cama todos os dias era o Pequeno Comissário, meu gato.
Amigos? Eu só tinha o Sérgio. Bom, quando nos conhecemos, nós só discutíamos. Mas, no trabalho nos dávamos bem. Éramos a melhor dupla até ele ir para Barcelona.

Rodei a chave, respirei fundo e entrei. Olhei para baixo e avistei o gato nos meus pés.

- Ei, Comissário. - me abaixei e acariciei seus pelos macios. - Já estava me esperando?

Ele miou.

- Boa noite para você também! - tranquei a porta.

Deixei minhas coisas sobre o balcão, indo em direção à geladeira. Peguei uma garrafa de vinho que estava quase no fim. Bebi direto da garrafa, franzindo os lábios por causa da acidez do líquido.
Peguei o relatório de dentro da minha bolsa e me sentei no sofá.

Deixei a garrafa de lado e comecei a ler. Zulema Zahir, era seu nome, e seu namorado, Hanbal Hamadi. Dois fugitivos. A última vez que foram vistos foi a um mês atrás, em Marrocos. No meio da fuga assassinaram dois policiais. Ainda estão procurando por eles.

- 'Zahir' - falei roendo as unhas. - esse era o nome de solteira da minha mãe. O que acha disso, Comissário? - o olhei, ele estava dormindo dentro de uma das caixas. Dei de ombros, passando as mãos pelo rosto, deixando o álcool tomar conta de mim.

Fui até o telhado onde ficava algumas flores que os antigos moradores haviam plantado, subi as escadas de incêndio com pressa, com as duas mãos no corrimão para não cair. Dá última vez que subi aqui, tive uma fratura fodida no tornozelo.
Já lá em cima avistei o céu. Estava lindo, as estrelas, a lua... Já as flores que antes eram belas e deixavam um aroma delicioso no ar, agora estavam murchas.

Me sentei no banco de madeira que ficava à beira da porta. Por algum motivo, o som dos carros me acalmava, me fazia voltar para a realidade quando eu pensava demais.

[Play]

Quando fechei os olhos para aproveitar a brisa, me surgiram alguns flashs de quando eu e Germán estávamos juntos. Ele ia até um canto mais reservado da praia para relaxar. Ele se sentava em meio as pedras e deixava a água bater nos seus pés, ele passava horas naquele lugar. E também foi lá onde eu joguei suas cinzas.

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⏰ Última atualização: Jan 07, 2022 ⏰

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Are You Lonely? - Ralicia (Alternative Universe)Onde histórias criam vida. Descubra agora