❅ Capítulo 3 ❅

66 14 27
                                    


Ainda consigo lembrar dos olhos da Ayanna se fechando naquela noite em Seattle. Ela parecia serena, como se nada pudesse a abalar e eu amava admira-la assim, mesmo que em raras vezes. Não havia um minuto em que eu não pensasse nela e em como ela me fazia falta, mas eu sabia que assim que acordasse ela não se lembraria de mim. Já havia acontecido outras vezes. 

No começo eu me assustei, senti o desespero tomar conta de mim, mas no decorrer dos anos acabei me acostumando, afinal todas às vezes que nos encontrávamos era como se nos apaixonássemos novamente, contudo havia prometido que seria a última vez. 

Depois que a Ayanna, ou melhor, a Adriana dormiu naquela noite eu a levei de volta para sua casa. Como todas às vezes. Segurando-a em meus braços a coloquei sobre a cama e beijei sua testa. Confesso que fiquei alguns minutos assistindo ela dormir, mas logo me apressei em sair de lá. Não saberia como explicar caso ela acordasse e me visse. 

Lembro-me da primeira vez que a encontrei depois do acidente. Ela estava deitada sobre uma maca com seu corpo machucado. Seus olhos estavam fechados e havia um corte em sua testa, mas não era nada comparado a pancada que ela havia tido na cabeça o que fora o motivo de quase um mês dormindo em um sono profundo, que parecia eterno. 

Tínhamos quinze anos quando tudo aconteceu. Meus pais e os pais dela eram amigos de infância e consequentemente, nós crescemos juntos. Adriana era uma garota inteligente. Emanava felicidade em seu olhar e por onde passava deixava um resquício de alegria. 

Até hoje não conheci nenhuma pessoa que não tivesse boas lembranças com ela. Era uma pena que ela não conseguisse se lembrar das pessoas que a guardavam com tanto carinho. 

Nossas famílias decidiram fazer uma viagem. Era inverno e fomos para Florença. Quase sempre passávamos as férias de inverno por lá. Era quase que uma tradição, então ficávamos empolgados toda vez que o inverno se aproximava. 

A Dri adorava o inverno porque era quando sua mãe fazia seus biscoitos de maçã e baunilha favoritos e comíamos com chocolate quente. Definitivamente era o que a deixava mais ansiosa pelo inverno. Felizmente naquelas férias observei atentamente enquanto a mãe dela preparava os biscoitos, pois queria poder faze-los quando a Dri estivesse triste, seria uma forma infalível de a animar. 

Sua mãe era tão gentil como ela e me entregou um papel com a receita de família. Lembro-me de ficar completamente animado, pois, poderia treinar em casa com mais calma até alcançar o sabor que deixava a Dri tão feliz. 

Foi a última lembrança feliz que tive daquele dia, pois, mais tarde naquela noite voltamos para casa, porém nenhum de nós realmente chegou no destino. A pista estava escorregadia por conta da neve, mas estava indo tudo bem na viagem de volta até nos depararmos com um caminhão fora de controle. Não houve como escapar. 

Dri dormia no meu ombro no banco de trás quando colidimos. A batida fez com que apagássemos completamente, não tenho lembranças nítidas a não ser o farol alto do caminhão quase cegar meus olhos, depois disso um estrondo e quando acordei estava no hospital. 

O impacto frontal levou os pais da Adriana instantaneamente. Nós sobrevivemos porque meus pais usaram seus corpos para nos proteger, porém, isso custou-lhes a vida. Quando acordei no hospital tive que lidar com meu luto enquanto juntava forças para rezar pela vida da Adriana. 

Felizmente, um mês depois ela acordou, mas não se lembrou de mim. Ela reconhecia muitas coisas, mas aparentemente o que era relacionado a seus pais e aquele dia, era instantaneamente apagado de sua mente. A explicação dos médicos sempre fora que sua mente decidira bloquear o trauma que ela havia vivido, mas ninguém conseguia explicar o fato dela se esquecer de mim após acordar, todas às vezes, fazendo com que eu tivesse que me reapresentar. 

Um dia desses te encontrei [Noveleta, Concluído]Onde histórias criam vida. Descubra agora