Saber: A Inquisição

Contrabando de Peças

Nível Perseu - Cidade de Saber
Ano 2056

Era aproximadamente dez horas do horário diurno, uma movimentação inquietante se iniciou perto dos pequenos restaurantes do nível Perseu, gritavam "ladra!" "Peguem ela" e "não a deixem escapar!" E as vozes pareciam tão estressadas quanto poderiam parecer. Uma menininha corria por entre os becos das casas, conhecia aquele lugar tão bem quanto a palma de sua mão.

Aqueles becos eram seu reino, e os policiais que a perseguiam tornavam suas manhãs divertidas todos os dias. Lya era uma menininha de não mais que dez anos, muito inteligente e habilidosa na arte de fugir, há quem costume dizer que ela veio escondida em uma dos foguetes que fazem a rota Terra-Saber, ou que sua mãe viera grávida e a teve no meio do caminho, os relatos eram conflitantes, embora tivesse sempre o mesmo fim, Lya órfã e sem ter onde ficar.

Não era de todo modo verdade, Lya tinha apoio de duas pessoas que cuidavam dela, a garotinha era ensinada pelos dois, mas gostava mesmo de roubar doces e fugir pelo labirinto de casas do nível Perseu. Os policiais já a conheciam, sempre achavam que poderiam estar um passo afrente dela, e todas as vezes eram surpreendidos com a esperteza dela, Lya já fugirá de todos os modos possíveis, uma vez tinha desaparecido entre uma multidão no porto, em outra, fugiu por um cano de tubulação.

Embora sempre reinventasse uma nova forma de escapar, Lya sempre parava no mesmo lugar, a portinhola de vidro de um laboratório. Ela colocou o doce na boca e correu, virou a direita, esquerda, esquerda e por último a direita, despistou dois dos policiais, mas o sargento Royce não largava o osso nunca, sendo o último a desistir todas as vezes em que faziam aquela brincadeira de gato e rato, com o sargento terminando bravo.

Lya deslizou por debaixo de uma calha, espalhou caixas de um dos becos e mudou sua rota de última hora, mais policiais ficaram para trás, porém, o sargento estava firme. Um pensamento veio a sua cabeça, iria se camuflar entre as pessoas novamente, já fizera antes e deu certo, então, começou a seguir um caminho ao qual sabia que iria sair no centro comercial de Perseu, só não tinha conhecimento que o sargento pela primeira vez parecia estar um passo afrente.

Quando Lya dobrou outro beco e seguiu correndo, viu três policiais montarem um cerco, ela parou e virou-se para retornar e tentar contornar, entretanto,  o sargento chegava com mais dois homens, Lya estava encurralada e dessa vez tinha medo, iria presa por roubo. O sargento parecia alegre, aquela brincadeira durava dois anos, com ela dando trabalho quase todos os dias.

— Agora não tem para onde ir, vai ser presa.

— Foram só alguns doces — disse ela recuando um passo —, por favor sargento.

— Esperei muito tempo para te pegar, agora isso tudo acabou.

Quando eles estavam perto, bolinhas de ferro caíram do céu, fumaça branca se espalhou pelo beco, a escada suspensa caiu para que Lya subisse, ela não hesitou e quando chegou ao topo, viu uma moça usando uma máscara de coelho. A moça olhou para baixo e tombou a escada, o sargento gritava xingamentos altos e quando a fumaça se dissipava, encararam-na com os olhos faiscantes.

— Sua hora vai chegar!

— Até logo sargento — brincou a moça, deu um toque no braço da menina e se virou —, vamos.

As duas começaram a andar, o teto das casas naquela área eram todos quadrados, um padrão comum. Lya seguia a moça de perto, não tinha uma expressão feliz, sabia que uma represália viria em breve, então, buscou palavras para tentar amenizar a situação.