Memórias de uma vida perdida

10 de julho de 2016

OBS: esse capítulo tem cenas de violência e faz menção a depressão e suicídio.

LEIA COM CUIDADO 

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A vida parece que está descendo uma ladeira, e sinto minhas forças se esvaindo aos poucos. Eu caí num limbo. Tenho percorrido um caminho longo, acho que me perdi um pouco de mim mesmo no trajeto. É difícil entender como me sinto, é mais difícil ainda saber o que devo fazer. Tenho sentido vontade de desistir de tudo. E desisti. Mas hyung está aqui, como sempre, firme por mim e por ele.

— Tá tudo bem? — Junghyun pergunta cauteloso ao segurar minha mão por cima da bancada da cozinha.

Respiro fundo mais uma vez ao sentir os dedos do hyung apertarem os meus com cautela.

— Tá... — digo por fim.

Eu estou mentindo e ele sabe disso. Fica um silêncio estranho entre nós dois. Não digo nada, é por isso que ele toma a iniciativa de termos uma conversa.

— Lola disse que quer vir pra casa. — meu irmão comenta ao soltar sua mão da minha. — Talvez seja bom você ir busca-la. Se você for, pode se distrair um pouco, ver a cidade. Você gosta de dirigir e também pode vir conversando com ela. — sei que ele está me olhando atento, embora eu esteja com o olhar fixo em minha mão em cima da bancada. — Quer buscar nossa irmã?

Sinceramente, quero dizer não. Não tenho vontade de sair de casa, mas o desespero de Junghyun de me salvar de algo que nem ele sabe o que é, parte meu coração. Ele quer um sinal de vida vindo de mim, qualquer um, só para ele saber que tudo ficará bem. Mas sendo honesto comigo mesmo, sei que isso não vai acontecer. E deve ser tão difícil estar no lugar dele, vejo que ele tem se esforçado mais do que deveria. Ele está fazendo de tudo para me manter salvo, mas eu estou condenado desde o meu nascimento. Não será ele a pessoa a me salvar, ninguém pode fazer isso. E embora seu tom de voz seja neutro, nem afável demais nem rude, sei que por dentro ele se corrói de desespero. O vi chorando ontem aqui na cozinha, e sei que foi por minha causa. Já fazem quase vinte dias que ele está aqui, e me odeio por ser um peso na sua vida. É por minha causa que ele está longe da própria casa e da noiva. Não sei como Linda suporta o relacionamento com meu irmão. E me sinto culpado por fazê-lo se afastar da mulher que tanto ama.

— Tudo bem. — digo. — Vou buscar Lola.

Decido fazer isso mais por ele do que por mim.

— Mas promete que você vai pra casa hoje. Sei que você sente falta da Linda. Eu não quero atrapalhar sua vida.

Ele me olha daquele jeito profundo outra vez, e eu me acanho sob seu olhar. Hyung me conhece mais do que qualquer pessoa nesse mundo, e é tão inteligente, tenho medo que descubra algo que possa quebra-lo.

— Você não atrapalha minha vida.

Pego a chave em cima da mesa da cozinha.

— Tá tudo bem, Junghyun. — digo o mais firme que posso, mas sei que não é o suficiente para convencê-lo. — Pare de se preocupar.

Eu sempre fui bom em mentir para todos, menos para ele.

— Você não age como se estivesse tudo bem. — posso sentir que sua voz está trava na garganta.

Respiro fundo para não desmoronar. Meu irmão não é o tipo de pessoa que demonstra o que sente, mas ver o tanto que ele está abalado agora, é a prova viva que eu consigo desestabiliza-lo por inteiro. Morro mais um pouco quando olho para seu rosto e vejo que ele está segurando o choro com muito esforço.