"Mas ele disse só isso? Nada mais?" - Mia me pergunta com um enorme ponto de interrogação na cara."Sim, só isso." - respondo pegando um pouco de pipoca da bacia que estava entre eu e ela - "Confesso que estou animada com o almoço de amanhã. São muitos anos sem nos ver... Digo, quantas coisas nós vivemos. É mais duas pessoas se conhecendo, do que dois amigos se reencontrando."- exclamo esticando meus braços no sofá, enquanto volto a minha atenção para o filme aleatório que passava na TV.
"Hum... Talvez. Só me promete que vai aproveitar essa chance que o universo está te dando?! Serena, qual a probabilidade desse reencontro acontecer novamente? Quase nulo. É o destino agindo com vocês!" - ela me encara com animação nos olhos. Talvez ela esteja certa. - "Vou pegar refrigerante, você quer?" - me pergunta indo em direção à cozinha.
"Aceito."
"Prontinho! Aliás, acho que você deveria passar no mercado. Sua geladeira está praticamente vazia." - Mia me olha como se fosse uma mãe chamando a atenção do filho. O que chega a ser engraçado, uma vez que nossa relação se baseia nisso.
Eu e Mia nos conhecemos logo depois que o Noah foi para outra cidade. No começo, eu sofri muito, porque sempre fui uma pessoa tímida e bastante introvertida, ou seja, ele era meu único amigo. Mas, ainda bem que eu e Mia nos encontramos na circunstancia mais aleatório: estávamos na mesma aula quando um sapo pula do gramado para dentro da sala, o que ocasionou gritos de todo mundo e correria para fora da sala. Eu que amo animais, fui atrás do bichinho para ver como ele estava e Mia fez o mesmo. Ambas chegamos perto dele e ela o pegou na mão. Não aconteceu nada com a gente, apenas o levamos de volta para o gramado. Foi naquele instante que uma conexão se estabeleceu entre nós duas e nunca mais foi rompida. Cá estamos juntas e na mesma faculdade. Uma sempre está presente pela outra. Nossa relação é de irmandade mesmo e a agradeço muito por isso. Sem ela eu não teria aguentado tudo o que passei.
"Prometo que passo no mercado, ok?" - a tranquilizo, pois se a conheço bem, ela não sossega até que tenha certeza que eu iria de fato. Eu a amo por isso.
...
Assim que guardo meu material na mochila, levanto da cadeira e me direciono para a saída rumo à cafeteria do campus.
Arrumo o meu laço branco que prende metade do meu cabelo. Eu amo esse acessório, pois, me lembra da minha mãe. Ela sempre me dizia que eu era sua boneca, por isso colocava laços na minha cabeça. Desde então, nunca perdi esse costume e, sempre que posso, uso-o.
Estou mais nervosa do que o esperado para o reencontro. Por isso, aproveito para ir comprar um café, porque me relaxa demais - o que é bizarro, já que contém a cafeína que estimula a agitação do corpo.
Eu amo cafés e amo tudo o que envolva-o! Para mim, todo momento é perfeito para tomar um, principalmente no final do dia, enquanto o sol está se pondo para iniciar o anoitecer.
Enquanto caminho, sinto o meu celular vibrar na mochila.
"Oi, Serena! Tudo bem? Aqui é o Noah rs. Estou te mandando mensagem para confirmar o nosso almoço hoje? Tenha uma ótima manhã :)"
Quase que instantâneo um sorriso surge no meu rosto e uma ansiedade toma conta do meu ser. Como pode alguém que passou anos distante da minha vida, aparecer, literalmente, do dia para noite e me causar tudo isso? Eu preciso me acalmar. Foco, Serena!
"Olá, Noah! Estou bem e você? Está de pé, sim! Você tem alguma preferência de lugar? Porque eu conheço uma cantina italiana dos deuses. Vou te mandar o endereço e me fala o que você acha, está bem?" - respondo-o.
"Está tudo certo por aqui! Muito bacana o lugar. Por mim, pode ser lá mesmo. Te espero às 12h."
Aí, é real. Eu vou almoçar com o meu melhor amigo da infância! Ok, isso é apenas um reencontro de bons e velhos amigos, certo? Não tem porquê a ansiedade... É, eu preciso de um café urgente para me acalmar!
Caminho mais um pouco e logo já encontro a cafeteria "Doce Encanto". Ao abrir a porta, ouço o sino tocar e já sou recebida pela Atena, a gatinha preta e branca da dona Clementina - proprietária do melhor café da região. Eu venho aqui desde que estava procurando um lugar para morar. De certa forma, me sinto em casa aqui: aquele cheirinho bom de café e biscoitos, acompanhados de uma música ambiente que só torna o lugar mais agradável.
"Bom dia, dona Clementina! Como a senhora está?" - logo que a vejo atrás do avental sujo de farinha de trigo a comprimento. Como estudo e moro longe de casa, ela acabou se tornando a figura familiar mais próxima que tenho.
"Oi, meu docinho! Estou bem e você? Ah! Acabou de sair uma fornada dos seus biscoitos favoritos: os amanteigados com frutas vermelhas e gotas de chocolates." - ela diz e meu sorriso já cresce. Nada melhor do que comida afetiva, sobretudo a dela e neste lugar. - "Espera aí, minha linda, que já trago um potinho para você."
"Muito obrigada, dona Clementina! A senhora é sempre muito agradável comigo. Estou cada vez mal acostumada" - falo rindo.
"Pois, esse é o objetivo" - me responde com um sorriso no rosto - "Aqui está, Serê. Aproveite-os!" - dona Clementina me entrega o potinho de vidro com vários biscoitinhos. Como alguns por ali mesmo e logo os guardo para mais tarde.
"Estão deliciosos como sempre! A senhora pode me dar um cappucciono com dose dupla de chocolate, por favor?" - pergunto limpando a boca suja de chocolate e calda de frutas vermelhas.
"Aqui está!" - já pego o conteúdo e viro o quase todo - "Ei, ei, vai com calma! Alguém está ansiosa hoje, não?" - ouço o som sua risada.
"A senhora nem imagina..." - olho para o horizonte, sem focar em nenhum ponto específico.
"Aconteceu alguma coisa, Serê? É com a faculdade? Ou, aí meu Deus, sua família! É com sua família, minha filha?" - os olhos já estão arregalados e ela está com a mão no coração.
"Não, não, dona Clementina! Minha família está bem, não se preocupe! E com a faculdade está tudo certo também." - já a tranquilizo de imediato. - "Bom, acontece que, agora no almoço, eu vou encontrar um grande amigo de infância... E, bem, digamos que faz uns anos que não nos vimos, porque ele se mudou de cidade e não mantivemos contato" - respondo gesticulando com as mãos e com muitas expressões faciais - "Assim, não que seja um encontro, porque, enfim, claramente não é! Mas, estou nervosa. A... A senhora me entende?" - a indago com a cara mais desesperada. Eu necessitava de um acalento e ela é perfeita para isso.
"Bom, meu amor, é nítido seu nervosismo e isso é totalmente compreensível, se ele foi alguém importante na sua vida." - ela me conforta com o olhar, enquanto segura as minhas mãos - "Tente apenas acalmar esse coração. Seja você mesma e esteja disposta a conhecer ele novamente, se assim desejar. Os anos passam, as pessoas mudam..." - ela faz um pausa antes de continuar - "E, claro, esteja aberta ao que o destino reserva para você. Como eu disse, ele foi alguém especial. No passado. Mas, do jeito que você está, algo me diz que isso poderá mudar..." - ela me lança um sorriso de lado.
"Ah, não, não, a senhora entendeu errado!" - logo trato de negar o que ela está insinuando. Afinal, sem cabimento. No entanto, ela não me responde nada, apenas saí rindo rumo a cozinha.
E assim termino o meu cappuccino e vou embora, já que ela me deixou ainda mais confusa.
Saio rumo para o mercado comprar o que estava faltando em casa - assim como prometi a Mia - e, também, para me arrumar para o almoço. Hoje o dia será intenso e ainda são 10h30.
...
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A LUZ NAS TELAS
RomanceA arte tem múltiplos significados, sendo quase impossível definir somente em um. Ela trabalha com nosso inconsciente. É uma válvula de escape do mundo real. Ela possui o poder de expressar, através de textos ou pinturas e desenhos, por exemplo, no...