Serena
"Em homenagem à Semana de Arte Moderna que aconteceu em São Paulo na década de 30, e foi um marco não só para o mundo artístico, mas também para a história no geral, nós, o corpo docente da Universidade de Yale, decidimos que, como projeto final, faremos uma semana de arte aqui também! Portanto, todos os alunos dos cursos que a arte está expressada de alguma maneira, seja por meio de textos, pintura, dança, música, escultura, enfim... deverão apresentar o projeto contando como nota final. Estão dispensados." – A professora Eva, de Linguística II, diz com muita animação.
"Ela é a definição de perfeição, não é possível!" – exclama Mia, com os olhos brilhando enquanto observa a professora Eva guardar suas coisas. E realmente ela é. Por mais que já seja uma mulher mais velha, por volta de seus 50 anos, seu espírito jovem permanece vivo. Ela é muito à frente de seu tempo, com cabelo colorido e roupas modernas... É uma inspiração para mim.
"Realmente..." – falo enquanto guardo meu material na bolsa. Aproveito para arrumar o lenço que está em meu cabelo. Eu amo esse acessório e, de acordo com Mia, virou minha marca registrada.
"Serena, já pensou no que vai apresentar? Ow, talvez algum desenho que você me mostrou há algumas semanas. Eles ficaram realmente bons!" – Mia fala com entusiasmo. Ela sempre diz isso quando o assunto é eu apresentar meu trabalho para as pessoas. Ter amigas que te apoiam em tudo e te encorajam a fazer o que gosta é maravilhoso.
"Talvez, não sei. Queria fazer algo novo, mas não sei exatamente o que. E outra, tenho tempo para isso. Esse projeto é só no final do semestre. Até lá eu penso em algo. E você? Já pensou em alguma coreografia?" - saímos do auditório em busca de algum lugar para almoçarmos.
"Tenho algumas em mente, mas nada definido ainda." - Mia me responde balançando os ombros. - "Ei, lembrei de um novo restaurante italiano que fica a duas ruas daqui. Ouvi elogios do pessoal da minha turma e fiquei curiosa. O que acha de almoçarmos lá?" - com os olhos piscando e o sorrisinho na cara dela não há como negar seu pedido.
"Bom, temos tempo já que minhas aulas acabaram por hoje e meu turno na biblioteca começa daqui uma hora." - após eu falar isso, ela me abraça apertado enquanto eu rio da reação dela. É uma coisinha doida, mas a amo.
Saímos as duas em direção ao novo restaurante. Espero que a comida seja de fato deliciosa, porque a culinária italiana é a minha preferida.
E de fato a comida é maravilhosa! O cardápio tem uma enorme variedade de pratos, sobremesas e bebidas. O ambiente é bem característico do território italiano e os funcionários super atenciosos. Não há com o que reclamar. Saímos as duas mais que satisfeitas e com certeza vamos voltar mais vezes.
Após o almoço, me despedi de Mia e fui para o meu estágio na biblioteca do campus. Minha paixão por Letras vem dos livros que leio desde novinha. O poder que eles têm de nos levarmos em lugares diferentes, em tempos diferentes, sem sair de onde nós estamos, é surreal.
Então, juntei o útil ao agradável. Preciso de grana para me manter aqui na universidade. O dinheiro que meus pais mandam é suficiente, não posso reclamar, mas sei que há um esforço enorme da parte deles e não quero me acomodar com isso. É bom ter minha própria independência, de certa forma.
Assim que atravesso a grande porta de madeira com janelas de vidro, avisto a dona Lígia, a senhora que me cativou desde que a conheci. Graças à ela eu consegui esse emprego. É uma senhora extremamente culta e simpática, com cabelos castanhos e roupas clássicas só a deixam mais elegante. Sempre bem arrumada e perfumada.
"Boa tarde, Dona Lígia!" - cumprimento-a e logo após dou um abraço.
"Boa tarde, minha querida!" - de uma forma carinhosa ela retribui o cumprimento - "Creio que você irá gostar de saber quais foram os novos livros que chegaram para a gente. Eles estão na última mesa." - ela diz com empolgação e logo sai.
Sem delongas, vou correndo para ver quais são. Assim que chego, vejo que é a edição especial da coletânea de Harry Potter. Convenhamos que J.K Rolling soube muito bem usar sua imaginação, juntamente com seu dom, para criar uma das histórias mais incríveis! Lógico que não perco tempo e, antes de organizá-los nas prateleiras, folheio as páginas.
"Sem dúvidas que os livros são melhores que os filmes" - levo um susto quando ouço alguém falar atrás de mim. Assim que levanto a cabeça, parece que lançaram o Glacius, pois sinto todo meu corpo se petrificar. Uma sensação de saudade me toma por inteira. Seus olhos cor de mel por detrás dos óculos meio caído no nariz, o sorrisinho de lado sem mostrar os dentes e o cabelo levemente bagunçado me soam familiar.
Logo saio do meu estado patético e o respondo.
"É, os livros sempre são melhores que os filmes... Mas isso não quer dizer que a franquia seja ruim." - Fecho o livro e dou um sorrisinho para o garoto a minha frente.
Ele não responde nada e me encara nos olhos, mas agora mais sério. É muito louco porque nunca senti isso antes: um arrepio frio e uma explosão de sentimentos por todo meu corpo. Na verdade, senti uma vez. Várias vezes, parece ser mais exata.
Ele concorda com a cabeça e quebrou o silêncio novamente:
"Noah" - ele se apresentou, agora com uma expressão mais calma no rosto. E, após ouvir seu nome, tudo ficou claro.
"Ai, meu Deus... Não acredito! Noah, quanto tempo. Como você está?" - ainda em êxtase, solto uma leve risada pela surpresa. Ele me lança um sorriso maior, ainda balançando a cabeça e levando sua mão até atrás da mesma.
"Sabia que seu rosto é familiar, mas não queria chegar do nada perguntando se era você mesmo." - ele disse ainda sorrindo, mas com um pouco de timidez. - "A última vez que te vi, você era um pouco menor, usava aparelho e..."
"Um óculos em formato de coração!" - demos risada lembrando desse momento - "mas, digo o mesmo para ti. Está bem mais forte e agora usando óculos... Nem parece aquele menino que vivia grudado comigo ou em meio à telas e sujo de tinta" - abraço o livro entre meus braços em uma tentativa falha de disfarçar o meu nervosismo.
"Pois é, certas coisas mudam e outras nem tanto." - encaramos um ao outro e aquele sensação familiar e acolhedora se intensificou ainda mais. Meu estado de choque permanece ao reencontrar meu melhor amigo de infância.
Assim que eu abri a boca para responder, um aluno da Universidade me pede ajuda para saber onde ficam os livros de história. Claramente ele é um calouro, pois essa é uma sessão bem fácil de localizar. Assim que dou as orientações para o garoto, ele me agradece e vai em busca dos livros.
"Bom, acho que você está ocupada... Mas...anota o meu telefone! Poderíamos, não sei, tomar um café ou um almoço...você quem sabe." - ele diz meio sem jeito, olhando para os lados e balançando as mãos de forma aleatória
"Claro!" - ele me oferece seu celular e logo anoto meu número nele. - "Almoço amanhã parece perfeito, o que acha?"
"Sim, marcado, então. Até mais, Serena!" - ele se despede com um leve sorriso.
"Até, Noah!"
...
...
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A LUZ NAS TELAS
RomanceA arte tem múltiplos significados, sendo quase impossível definir somente em um. Ela trabalha com nosso inconsciente. É uma válvula de escape do mundo real. Ela possui o poder de expressar, através de textos ou pinturas e desenhos, por exemplo, no...