Aconteceu em uma tarde ensolarada - daquelas que dá vontade de jogar um ovo no asfalto só pra ver se é verdade que ele frita - nos meus primeiros anos de meninices. Naquela tarde eu fui cúmplice de um assassinato, se bem que posso ser considerado o assassino por não ter impedido a ocorrência do último respiro.
A vítima encontrava-se em uma área verde, próxima a uma rua sem saída, a minha rua. Lembro de sua cantoria despreocupada, que acalmava as árvores e colocava os insetos em estado de alerta.
O executor do crime aproximou-se vvaaggaarroossaammeennttee do pobre coitado, seguido por mim, carregando em suas mãos a arma do crime: um estilingue. Infelizmente o tiro foi certeiro:
- É um Sanhaço! - gritou o carrasco.
Naquele momento ocorreu o pior dos aprendizados da minha vida: o aprendizado pela morte.
Mas não foi "só" isso. Naquele dia o executor, com alguns anos a mais de caminhada, reforçou que eu ocupasse esse maldito lugar da masculinidade violenta, indiferente. Resultado: vez ou outra eu cometo assassinatos simbólicos e, quando vejo um pássaro desconhecido, tendo a achar que é um Sanhaço.
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Naquele dia e outros contos
Short StoryTrês contos curtos que carregam imensidões. "Naquele dia" você acompanha um dia marcante e cheio de afeto na vida do narrador/personagem. Já em "Dúvida" você percebe o quanto estar perto não necessariamente é conhecer e viver as experiências do outr...