Capítulo 3

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Mais um dia em que eu pude ver a animação da comunidade que a minha mãe escolheu para nos trazer, já que o Ceará estava muito pequeno para as suas loucuras. Ou talvez, ninguém mais a quisesse foder em troca de centavos para sustentar seu vício nas drogas.

E cá estou eu. Chegamos em três e hoje só resta eu, agora também com meu filho.

Às sextas, o curso que frequento acaba mais cedo, então tenho a oportunidade de pegar Lucas na casa da mulher que fica com ele, quando sai da escolinha mais cedo. Vamos caminhando pela comunidade, vendo a animação dos bares, as músicas altas, pessoas em suas portas querendo apenas um momento de lazer.

Falo com poucas pessoas por aqui, me mantenho na minha, até porque, não tenho a pretensão de permanecer nesta comunidade futuramente. Talvez meu futuro trabalho exija que eu busque um lugar mais tranquilo para a minha segurança e do meu filho.

Estávamos na rua da minha casa, quando Lucas soltou a minha mão e saiu correndo, como conheço o local, deixei. Dei olá para uma vizinha que sempre gosta de cuidar da vida dos outros, mas comigo ela simpatiza, assim foram as suas palavras, e depois segui em frente. Para a minha surpresa, Lucas estava encarando um homem que tinha três vezes o seu tamanho e que eu tive o infeliz prazer de conhecer na noite passada.

— E aí, parceiro? — cumprimentou Lucas, que lhe sorriu e se achou o tal, quando não se referiu a ele como um bebê.

— Beleza?

Cheguei a dar um sorriso com a cena, quando ele tirou a chupeta da boca para falar e fazer um cumprimento com a mão, mas então lembrei que quem estava a nossa frente era um possível inimigo.

— O que você deseja?

— Nós havíamos conversado sobre o exame, e não te achei durante todo o dia, para marcarmos.

— Eu trabalho.

— Eu sei, e é por isso que seria bom você me passar seu contato. E você garotão, como foi seu dia?

Mandão! Como ele ousa me dar ordens? Argh!

Vendo que nada tiraria a sua atenção de Lucas, abri o portão e logo em seguida a porta da casa. Não era nada muito grande, até porque, com todos os perrengues que passei, foi o que deu para comprar, já que a casa de aluguel que sempre moramos teve que ser interditada, se é que posso chamar aquilo de casa.

Observei os dois interagindo e meu filho nunca sendo tímido com nenhuma pessoa, foi até o quarto e pegou seus brinquedos para espalhar pelo tapete da sala, me surpreendi quando Douglas tirou o casaco e sentou junto com ele, prestando atenção em sua explicação sobre cada carro de sua coleção. Em alguns momentos, Lucas se esquecia e colocava a chupeta na boca, mas logo voltava a tirar, porque segundo o tio Anderson, chupeta não é coisa de homem, mas o meu bebê está em uma luta interna para deixar de ser bebê e eu não pressiono, entendo que tem que ser no seu momento e ninguém tem nada a ver com isso.

Fiquei próxima a eles até entender que esse estranho não oferecia perigo, e Lucas me pareceu muito confortável em sua presença. Algo que reparei também foi a maneira como ele pegava as coisas, da mesma maneira que o meu filho, ele era canhoto, e sempre pegava com as pontas do dedo, como se estivesse com nojo do objeto, e depois de adquirir confiança, apalpava da maneira correta.

Meu coração gelou, confesso, mas eu ainda não havia perdido a guerra.

Havia terminado de preparar a janta, macarrão à bolonhesa, algo que Lucas ama de paixão, e mesmo assim, Douglas não dava indícios de que iria embora. Eu precisava acelerar as coisas aqui para dar tempo de ficar com meu filho e colocar algumas matérias em dia, mas esse cara não se tocava e não queria ir embora.

— Vamos jantar, filho? — Chamei, me dando por vencida.

— É macarrão, mamãe?

— Sim, meu amor, macarrão como você gosta.

Sem eu mandar, porque já está acostumado, ele correu para o banheiro para lavar as mãos. Os brinquedos todos espalhado pelo chão, porque depois da janta ainda brincamos um pouco mais antes de dormir, já que é tão difícil eu conseguir fazer isso com ele no restante da semana.

— Você deu uma boa educação para ele — disse quando Lucas se afastou.

— Obrigada! Escuta... Douglas, não quero ser indelicada, mas com que pretensão você está se aproximando do meu filho? E se esse exame, que ainda nem conversamos, se eu vou ou não aceitar fazer, der negativo?

A simpatia que esbanjava anteriormente sumiu, pelo visto ele não estava acostumado a ser contrariado. Adivinha, querido? Eu não sou de ceder fácil, ainda mais em se tratando de quem amo.

— Ele é meu filho, e sobre você aceitar ou não fazer, é um problema seu, amanhã já temos horário agendado na clínica para comprovar isso, e você nem pense em fugir, haverá um homem aí na sua porta a noite toda, até que eu venha lhes buscar.

— Você não pode me manter em cárcere privado. Quem você pensa que é?

— Acredite, você está mais segura, não sabendo quem eu sou, e quando souber, vai entender que me questionar ou querer bater de frente é a pior opção a se seguir.

Fiquei estática encarando-o, e só encerrei quando senti Lucas abraçar as minhas pernas e empurrá-las para a cozinha.

Vamo tio, mamãe faz o melhor macarrão do mundo.


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