Frio

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Outubro ainda estava começando e os dias só ficavam cada vez mais frios. Um outono congelante como este não era comum e fazia os turistas reclamarem. Eu estava pensando bastante sobre o quanto odiava o fato da vida humana ter conseguido mexer com a situação climática do planeta, mesmo que meus antepassados não fossem tão culpados assim pela revolução industrial e todas as tretas que seguiram.

Ficar de bobeira era uma das únicas coisas que eu podia fazer na recepção do hotel durante um horário de baixa movimentação. Normalmente, seria minha irmã mais velha enfiada ai, jogada na cadeira desconfortável que nosso avô comprou provavelmente antes de nascermos, mas a idiota tinha saído para um encontro, o que me irritava ainda mais, pois o namorado dela era realmente bonito.

Eu não era de ter inveja, mas ficar no tédio ali não estava fazendo bem ao meu psicológico.

Queria estar em casa, jogado na minha cama, assistindo o primeiro episódio de Spy x Family ou vendo bobagens no celular.

Os hóspedes estavam aproveitando o sol do meio dia para tentar lidar com o frio e fazer compras. E meu horário só iria acabar no fim da noite, mas que tragédia! Juntei as mãos no rosto e respirei fundo, inclinei o rosto, encostando a testa no antebraço. Até que não seria má ideia tirar um cochilo, ninguém estava ali para ver.

Bem, foi uma péssima ideia.

Quando acordei, havia uma fila de hóspedes barulhentos me encarando com ódio mortal. Ugh. Vovó vai me matar. Foi a única coisa que consegui pensar. Isso se a primeira senhora da fila, que carregava uma expressão azeda no rosto enrugado, não fizesse isso primeiro.

No momento que meu expediente finalmente acabou, o funcionário do turno da noite tomou meu lugar na recepção, tudo que consegui pensar era em chegar em casa e tomar uma bebida bem quente antes de pedir alguma coisa (muito quente) para jantar.

As pessoas ainda circulavam nas lojas ao redor quando saí, enfrentavam o ar gelado com bravura para abastecer as redes sociais, as multidões de fim de ano começavam a ficar cada vez mais densas apesar do desacordo climático. E eu só queria ir pra casa me cobrir, meu melhor amigo sempre me disse que eu deveria me mudar para um país mais tropical se odiava tanto as partes geladas do ano.

Que pena, Jimin, eu nunca fui bom em outros idiomas.

Não é que eu goste de calor, só não gosto de frio.

Quando eu era criança, minha mãe me esqueceu do lado de fora por cinco horas durante o inverno, o que resultou em uma bela pneumonia e a sua tão esperada perda da minha guarda por parte dos meus avós paternos. Não é uma coisa que eu goste de lembrar. E o ar gelado só me recorda disso. 

No caminho da estação, quando o vai e vem de pessoas fica mais concentrado em uma direção só, me peguei pulando de susto quando um pequeno impacto nas minhas pernas quase me fez perder o equilíbrio. Olhei pra baixo um pouco exasperado, achando que tinha batido em alguma coisa. Mas a “coisa” na verdade se revelou ser uma criança empacotada no casaco mais fofo e felpudo que vi na vida. Era um menino, não podia ter mais que quatro ou cinco anos, talvez menos, ao julgar pelo fato de que ele tinha pouquíssimos centímetros em cima da altura do meu joelho.

ㅡ Eh, desculpa… ㅡ falei, mesmo que o mini-pirralho tenha sido quem se jogou nas minhas pernas.

Caçei com os olhos algum adulto olhando para nós com preocupação, pronto para brigar comigo por quase ter derrubado sua cria, mas não havia ninguém. Todo mundo ao redor continuava andando, desviando de nós dois sem poupar uma encaradinha sequer.

Olhei de volta para a criança, que agora estava me fitando com grandes olhos castanhos. Suas bochechas estavam vermelhas, provavelmente não era bom para o pirralho ficar exposto ao clima assim por tanto tempo.

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