VIOLETA SALLES
A sala estava silenciosa.
O vento soprava e acariciava suavemente as plantas do jardim lá fora, que vez ou outra eu observava por cima do livro que, naquele momento, tinha em mãos, através da enorme e exagerada janela da pequena biblioteca em um canto recluso da casa. Do lado que, além de mim ou Max, nenhum outro Salles tinha a ousadia de ir. Até aquele momento.
Os pássaros voavam e cantavam euforicamente, assim como as borboletas faziam a festa sobre as flores. O tempo estava perfeito, sem muito sol, mas também sem sinal algum de que viria chuva.
Eu estava sentada em um divã vermelho, com Max jogando em seu ps3 aos meus pés, incapaz de largar do meu encalço ou de me dar o prazer de um pouco da sua ausência. O livro em minhas mãos, indicado por uma colega não muito próxima da faculdade, não tinha nada a ver com o curso direito. Mas ainda assim, não deixava de ser um conteúdo interessante. O gênero estava sendo minha pequena obsessão do momento.
O vento aconchegante atravessou uma brecha da enorme janela, que Max havia deixado, e fez meus pelos arrepiarem. Olhei para a bela visão do lado de fora mais uma vez, e a paz que muitas vezes procuro e não acho me acolheu, antes dos meus olhos atingirem os altos muros da mansão. Uma verdadeira prisão medieval, só que moderna.
Mas, assim como toda a paz, sempre há um caos à espreita e o meu tem nome e sobrenome e entra na calma biblioteca como um furacão feroz, trajando um terno preto alinhado, gravata borboleta branca e sapatos social italiano combinando. Robert Salles, também conhecido como meu pai.
— Violetta! — Ele diz, com mais calma, suavidade e gentileza do que sua feição enrugada, levemente preocupada, e estranhamente jovial aparenta. — Maxwell, nos dê licença, por favor. Quero conversar com a sua irmã a sós.
Ele sequer se direcionou ao filho quando proferiu as palavras, mantendo os olhos fixos em mim. Me analisando, como se tivesse tomado a decisão certa de algo que, até aquele momento, eu desconhecia.
Max me olha com seus olhos cerrados, com um grande ponto de interrogação na testa e a única coisa que consigo pensar é em como meu irmão conseguia parecer tão adulto e ao mesmo tempo tão infantil com apenas seus dezessete anos. Em como ele teria a coragem de ir acima de tudo e todos apenas para me proteger, inclusive nosso pai, o homem que eu considero o mais temível, quando deveria ser ao contrário. Quando eu deveria fazer isso.
Sorrio para ele sem mostrar os dentes, que ainda aguarda uma resposta minha, assentindo igualmente com a cabeça, afirmando que está tudo bem e que pode ir. E só quando eu dou a certeza real é que ele vai, olhando para trás sobre os ombros largos, esperando que eu revogue minha decisão e peça para que ele fique aqui. Que eu contrarie nosso pai ao menos uma vez, afinal, o que Robert Salles queria me dizer que Max não podia saber?
Uso a oportunidade que meu pai fecha e tranca a porta do cômodo para esconder o livro de romance sexual embaixo dos travesseiros do divã e me recomponho, ficando devidamente sentada e ereta, até que ele se aproxima e eu me levanto, esperando que ele fale e quebre o silêncio agonizante que paira.
Apesar da aparência e pose, Robert Salles não é um homem explosivo. Acima de tudo, respeita a família e procura sempre nosso conforto. Em troca, manejando e manipulando todos nós e quem mais faça parte do seu ciclo social ao seu favor. Em toda a sua vida, ele jamais levantou a voz ou a mão para mim, Max ou nossa mãe. No entanto, ele tem ficado agressivo e todo o oposto do que era apenas alguns meses atrás. Problemas no trabalho. Tem bebido mais do que o costume, dormido pouco e quebrado tudo pela casa, deixando todos nós preocupados. Robert Salles já não era mais um homem gentil e carinhoso, algo havia mudado.
Até aquele dia, era só uma suspeita.
Depois, eu tive a certeza.
Ele me olhou de cima para baixo, com o olhar silenciosamente rejeitando o vestido verde-escuro simples com qual estava — um sem estampas, decotes ou nada que mostrasse demais além de um pouco do colo, braços e pernas abaixo do joelhos. Os pés descalços, cobertos apenas por uma meia branca com babados dos quais sou completamente apaixonada. E nem uma jóia além da fina corrente de ouro que eu havia ganhado de presente de aniversário de dezoito anos da minha mãe — há dois anos atrás.
— Deveria se arrumar mais — ele se aproximou, ainda percorrendo o meu corpo com os seus olhos latentes, e na pele pouco exposta, procurando por mais. Perto o suficiente, ele tocou meus ombros e esfregou meus braços, com um sorriso que já faz muito tempo que não vejo direcionado para mim, mesmo este sendo evidentemente falso.
Ele havia dito claramente que eu o havia decepcionado. Que fui fraca, que um verdadeiro Salles não é assim.
— Me sinto confortável desse jeito — sorri sem muita empolgação.
As críticas começaram de novo.
Instintivamente, deixei meus ombros relaxarem, mesmo sabendo que ele desaprovava esse ato e logo me recompus novamente, mantendo as costas retas e o queixo erguido, como ele ensinara quando eu e Max éramos apenas crianças.
Um Salles jamais abaixa a cabeça para alguém.
Um Salles não se porta desse jeito na frente de alguém.
— Temos um jantar com os Cavendish este domingo — ele enrolou uma mecha do meu cabelo castanho-claro em seu dedo e em seguida os empurrou para trás, fazendo-o cair como uma cascata ondulada nas costas. Ele tirou a faixa branca que eu uso para mantê-los longe dos olhos e aumentou ainda mais o sorriso, de modo que agora se tornasse o próprio coringa, deixando-o de orelha a orelha. Aprovando pouco como estou agora, do jeito que ele gostaria que eu fosse. — Quero que fique bonita. Que pegue meu cartão e compre tudo o que precisa, desde roupas, calçados, a maquiagem.
— Eu tenho tudo isso — murmurei, sem entender suas palavras e o porquê de tanto.
— Precisa renovar, querida, está tudo tão… — me olhou rapidamente de novo, sem se esforçar tanto desta vez, como se ver o que eu vestia no momento fizesse seus olhos sangrar — ultrapassado.
Ele conhecia meu guarda-roupa de cima a baixo, suas palavras eram gentis, uma variação elegante de careta, como ele sempre faz questão de dizer a minha mãe.
Ele se afastou com elegância, deslizando o italiano pelo piso negro da pequena biblioteca, que aos poucos estava se tornando sufocante.
— E não me desobedeça, Violetta, esse jantar é muito importante.
Fez questão de dizer as palavras como se marcasse elas, da mesma forma que faço com os livros didáticos. Como se as mesmas fossem uma espécie de ameaça.
E talvez fosse.
Ele se afastou de novo e, da mesma forma que entrou, foi embora, sem se importar em me explicar ou me dizer o verdadeiro intuito do jantar e o que realmente estava acontecendo por trás dos panos sujos que ele escondia. Mas também não precisava, uma vozinha rebelde gritava e supunha o que Robert Salles tanto queria.
Ele queria algo que os Cavendish tinha e conseguira. Dessa vez usaria a família e qualquer peça para saciar sua ganância sem fim.
Desde muitos anos, os Salles seguem apenas um único negócio: a advocacia. E mesmo que eu não quisesse, acabaria no ramo, se caso eu tivesse nascido homem.
Mesmo tendo passado toda a minha vida insistindo incessantemente em querer ser bailarina, em algum momento da minha vida eu havia abandonado as sapatilhas e me entregado completamente aos terninhos e aos saltos scarpin. Havia me apaixonado com tanta voracidade pela profissão, que, por um certo tempo, papai me levou para vê-lo atuar de perto. Para me mostrar o quão magnífico era em ação e como queria que eu me tornasse tão boa quanto ele.
Uma mera ilusão de algo que eu jamais poderia ter.
Quando iniciei a faculdade, estava queimando, assim como ainda queimo ao pensar que logo estarei formada e também atuando. Era um sinal de que algo estava mudando. Que eu conseguiria.
Lembro do brilho nos olhos do meu pai, em como estava eufórico e me exibiu o quanto podia para todos os lados. Amigos, família, a mídia. Lembro do sorriso de alívio da minha mãe quando atravessei a porta de casa gritando aos quatros ventos que eu queria ser uma grande advogada como Giovanna Kennedy, que até hoje eu sei que não foi a coisa certa a se dizer. “Como o papai”, era o que eu deveria ter dito. Então ele parou, porque algo havia mudado. Não existia mais planos, não existia mais eu. Ele havia me abandonado e desistido de mim. Sem minha consciência, vinha criando novos planos, que favorecem apenas a si, com a desculpa barata que era bom para todos nós. Que era pela família e o certo. Ele tentava se convencer disso.
Na época foi tão fácil deduzir.
Meus planos e meus sonhos, como sempre, ficando em último plano.××××
nota da autora: o capítulo um bem adiantando para os melhores leitores do mundo!!!! ❤️❤️❤️
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Between Love and Hatred
FanfictionNESTA NOVA VERSÃO MELHORADA DE BETWEEN LOVE AND HATRED, agora ELITE, QUERO APRESENTAR PARA VOCÊS A NOVA SUNHEE VIOLET E O NOVO MIN YOONGI E OS DEMAIS PERSONAGENS, NOVOS E ANTIGOS, QUERO QUE SE DELICIEM COM A TRAMA QUE VOCÊS JÁ CONHECEM, MAS COM UMA...