Linhas de Prata

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A coisa rastejava em sua epiderme, arranhando sua carne em busca da humilhação. Sensações fantasmagóricas, facilmente imaginadas, urgiam para que seu corpo fosse dilacerado de seu interior na direção de sua superfície, de seu fino tecido formado por células que separavam e protegiam Remus Lupin, sua essência com órgãos e tudo, do mundo real, mágico ou não, que não apenas era desconhecido e lunático por si só, como também lhe tocava, apertava, batia, e sufocava.

Suas pupilas se encontravam estreitas enquanto segurava a respiração por um milésimo de segundo, acorrentando os próprios pulmões pelo tempo que fosse necessário, até que a terra lhe provasse que a magia não apenas ainda existia, como permanecia velocista em suas veias e a nublar seus pensamentos quando necessário. Consequências desproporcionais relacionadas com a semelhança exacerbada de um rosto, um vulto qualquer, mero figurante da sociedade que sequer ousou ultrapassar a margem de passageiro. A lua e as estrelas deviam lhe implorar benevolência, ao marcar seu corpo com as finas linhas prateadas que tanto diziam sobre sua história. Que tanto diziam sobre suas orbes úmidas e suas íris frequentemente em completa catarse, trazendo em bagagem sua conhecida vergonha e a sensação de que estás despido de proteção, exposto.

Remus era um lobisomem. Jamais retornaria a ser alguém imaculado, ora palmas manchadas com o carmesim da fauna fantástica inocente que circulava Hogwarts, ora gosto metálico no estreito espaço entre os dentes após mastigar as próprias patas, cansadas de arranhar paredes que lhe tornavam claustrofóbico, enjaulado. Ambos lembretes ácidos de sua ausência de valor, sendo o bruxo um objeto descartável já sujo. Suas marcas barganhavam com suas paredes cujas portas eram malditas, mapeando o contraste entre seu semblante fictício e seu semblante real, sua face bruxa e sua face monstruosa.

Suas linhas, cicatrizes ou manchas, as vezes hematomas de diferentes cores ou então olheiras especificamente monocromáticas, se tratavam de fissuras reais em seu escudo, sua pele. Contavam tantas histórias quanto seu salão comunal ou sua varinha, denunciando o assassinato de senhor Lupin cometido por um quadrúpede perdido, estagnado, ele próprio com o mero gatilho de um satélite natural (lamúrias de um suicídio).

Por mais que dígitos gentis – céus, os mais gentis – seguissem suas expressões que sem exclusão ademais, narravam anos magicamente amargos alavancados por uma guerra que arrombava-lhes o portão, ainda assim, tal tato soava repulsivo invés de arrebatador. Como um ritmo lento que constantemente erra uma mesma nota musical não reconhecível, uma tortura que lhe tira repostas, que lhe torna alarmado por sua incapacidade de distinguir falhas entre acordes típicos, não concebendo a escolha de discriminar a incongruência. Tudo lhe desperta desgosto, o paralisando, inclusive "Aluado", que ainda não conseguiu ouvir os clamores solicitando perdão que deveriam ser gritados pela Lua, aqueles os quais outrora exigiu do monte de poeira que tanto orbita seu planeta, quanto escutou todos seus murmúrios assustados durante um bom punhado de amanheceres.

Porventura, na realidade atual Remus está incessantemente assustado, transbordando como poção do morto-vivo em um cálice. Medo alojado em um ponto específico atrás de seus olhos, vigilância constante para bagunçar seu inconsciente e exibir novamente o mesmo curta metragem durante todas as estações. Aquelas cenas, que ele se envergonha, se enoja, sente agonia. O animal lupino que lhe deu e causou cicatrizes.

Todavia, há a antiquada indagação que lhe revira o estômago.

Culpa rasteja pelo tecido Epitelial de qual Lupino?

O velho comensal licantropo que entrou em seu quarto, Lyall, ou

Remus.








[Releia o primeiro parágrafo.]

01/05/2022

Tecido EpitelialOnde histórias criam vida. Descubra agora