1 - o primeiro fim de mundo

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Uma garota de cabelo curto e castanho, com olho bicolor, usando um uniforme escolar idêntico ao meu e com uma mochila aparentemente pesada.

Puxava-me pelo pulso, levando com pressa a um lugar que se recusava a dizer.

O caminho me amedrontava, já que os arbustos e a grama quase chegavam na minha altura, não que fosse difícil, sempre fui a menor da turma e em minha fase adulta não passei de um metro e cinquenta e quatro (1,54).

— Sarah! Seja paciente — Disse Mirella quando perguntei pela quinta vez a onde ela estava me levando — Procurei por esse lugar a minha vida inteira, quero dizer, desde que minha vó me contou.

Na correria alguns espinhos e galhos acabam me machucando, mas com mais alguns passos nós chegamos no lugar tão esperado.

— Bem-vindo ao… — Ela me soltou e correu um pouco mais, quase chegando no final, virando-se com os braços estendidos aos lados, então, cheia de ânimo, completou — Fim de mundo.

— Fim do mundo?

— Fim de mundo!

Um lugar bonito, mas levemente perigoso, um desfiladeiro para uma floresta que, se me permite dizer, era propriedade da família de Mirella. Observei a paisagem, a altura da queda e quando voltei o olhar uma toalha vermelha já tinha sido estendida, com a jovem já tirando algumas comidas da bolsa.

— Minha avó me falou sobre lugares assim… — começou seu diálogo com um sorriso fraco — Um lugar mágico onde você só leva as pessoas certas, onde vocês podem falar sobre tudo e nada ao mesmo tempo, e…

Então seu sorriso some repentinamente enquanto arrumava nosso pequeno piquenique. 

— Ela também disse que as pessoas vão para lá quando querem lembrar de você depois que… Você sabe… Depois que você morre.

— E você deu o nome para o seu lugar de… Fim de mundo?

— Sim, bem, eu encontrei esse lugar em um dia que eu estava fugindo das gêmeas e, bem… É um precipício então… Aceita? — ela estende um sanduíche para mim.

Eu não questionei e sentei ao lado, me juntando ao piquenique improvisado, mas com uma variedade de alimentos.

Passaram-se em torno de duas horas em pleno silêncio, mas não um silêncio desconfortável e sim calmo, como era comum para mim desde… Bem, sempre, mas não para Mirella, que tinha o costume de falar pelos cotovelos se a deixassem, mas raramente o faziam, eu era a única exceção, nunca a impedindo de falar e ela nunca me obrigando ao mesmo.

Assim que o pôr do sol começou a se formar e o céu se transformar em tons de rosa e laranja, Mirella ajeitou seu cabelo castanho para o lado esquerdo antes de puxar uma maleta e cuidar dos meus pequenos cortes no rosto e nos braços.

— Desculpa por isso — disse com uma voz culpada e preocupada — meu ânimo acabou te machucando… De novo.

— Não tem problema, a vista daqui é linda… Aí! — reclamei da ardência do antisséptico.

Conheci Mirella a cerca de três anos, dias após eu entrar na escola particular, ela é um ano mais velha do que eu, rodeada de amigos e pessoas meramente importantes para o futuro… E havia eu, uma garota sozinha, com uma família quebrada e que sofria bullying.

Nós não tínhamos nada em comum, sequer estudávamos na mesma sala, mas o acaso a fez sentar no mesmo banco que eu, em um recreio que ela esqueceu sua comida, então com apenas uma bolacha caseira dividi meu lanche, sem nem trocar muitas palavras. Mirella começou a lanchar comigo sempre que possível, mesmo eu falando uma ou duas palavras.

Para Sempre SerafinOnde histórias criam vida. Descubra agora