DOIS MINUTOS PARA MEIA-NOITE

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Ao sair da viatura pegamos a primeira condução até Taboão da Serra com a esperança que Ludo levaria Michele para longe da polícia da Paz. Descendo do coletivo ela ficou surpresa com o número enorme de barracos que parecia não ter fim. As pichações, as pessoas usando drogas nas ruas e o lixo tinham impressionado muito ela, pois por raras vezes ela saia de casa com medo de estupros e roubos. Chegamos na rua do barraco de Ludo, terminava meu medo e no lugar a esperança começava a surgir. Ela estava a salvo.

Foi quando, por surpresa, virando a esquina um caminhão da polícia da Paz freou bruscamente. Com suas luzes refletoras de alto alcance procuravam todos os possíveis delitos daquela região marginalizada. Tínhamos visto essas operações pela televisão, sempre com muita violência e descaso com os mais necessitados, mas presenciar essa ação genocida pessoalmente tinha me deixado com os pés pregados no chão.

A rua era pouco iluminada pelos postes que estavam muito longe um dos outros, deixando enormes espaços escuros entre um e outro. Percebendo a presença do caminhão ficamos em Pânico. Corremos para o outro lado da calçada para tentar passar despercebido pelo caminhão imponente que descia a rua com suas armas calibre 50 colocadas na parte de cima do veículo. Muitos usuários de drogas que se escondiam do frio usando seus cachimbos embaixo de cobertores grossos, perceberam a movimentação do caminhão e começaram a correr para todas as direções deixando seus pertences espalhados pela rua, já que os crimes, como substâncias ilícitas, eram pagos com a morte. Vendo isso, a viatura blindada aciona suas sirenes como um alerta, as portas de trás do blindado abriram e começaram a descer policiais para perseguir quem eles conseguissem, a fim de fazer a justiça imposta pelo governo. Nada mais que assassinos autorizados. Um deles se atentou à nossa presença e andando em nossa direção, apontando sua arma, mandou que colocássemos as mãos na parede de um dos barracos para a revista pessoal. Ele se aproximou. E gritando pediu nossos documentos.

- Estão na minha carteira. - Respondi desesperado.

- Vamos, passa para cá, caralho!

Com as mãos trêmulas peguei a carteira e dei os nossos cartões de identificação. Nesse momento chegou outro policial para auxiliar na abordagem. Começaram os sons de disparos no fim da rua. Gritos inaudíveis de pessoas pedindo socorro. O segundo policial também gritando perguntou.

- O que vocês estão fazendo aqui a essa hora da noite? Vocês usam drogas?

- Não usamos senhor. - Respondi.

Então em tom furioso ele pergunta novamente.

- Vocês usam drogas, porra?!

O outro policial apontando a arma para nós completou.

- Responde, maluco. Quer morrer, filho da puta?

- Não usamos drogas não, senhor. – aumentei o tom de voz para ser mais audível.

- Vocês fazem parte do grupo terrorista dessa favela? De qual gangue vocês são, do movimento de libertação?

Foi nesse momento que entendi que aquela batida não era nada corriqueira, estavam atrás de Ludo. Provavelmente seu plano tinha começado e o governo buscava o líder.

- Não sabemos de grupo nenhum e também não participamos de nenhuma gangue. Viemos visitar uma amiga da família, apenas isso. – Respondi firmemente na tentativa de pensarem que estava falando a verdade.

- Porque essa mala enorme, então? – Um deles apontou para Michele que segurava a alça da mala vermelho bordô.

- Viemos trazer comida e roupas para essa amiga. – Michele falou olhando para mim.

Saga Apocalipse - parte 1 Era uma vez uma pandemiaOnde histórias criam vida. Descubra agora