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Querida S/n

Hoje estava chovendo e Celinna ficou doente então você resolveu ficar em casa para cuidar dela. É a coisa mais linda ver o quanto ama a nossa filha e, apesar de ser difícil, tenho que concordar que você a ama mais do que eu. Vejo o seu brilho nos olhos ao ouvi-la dar risada e em como seu sorriso se renova toda vez que está com ela. Eu estou bem melhor hoje. E sabe de uma coisa? Eu acho que você não precisará ler essas cartas, pois de um tempo para cá percebo que estou melhorando. Hoje pude te ajudar a cuidar da nossa princesa. Acho que quando eu morrer – não importa se será daqui um mês ou setenta anos – eu vou lembrar desse dia no filme que passará por minha cabeça. Eles dizem que isso acontece e eu, sinceramente, acredito e até me conforta um pouco pensar por esse modo, pois estarei sentindo tudo o que vivi com vocês antes do meu último adeus, é simplesmente incrível.

Nós planejavamos de termos mais um filho...

Eu lembro que começamos a planejar um futuro juntos quando estávamos namorando, mais ou menos um mês depois. Estávamos tão eufóricos com isso e confusos com nossos sentimentos que achávamos que iríamos explodir ao olhar um para o olho do outro. Era tanto amor, medo e alegria misturados que criou uma coisa só: nós.

Era noite e seus pais tinham finalmente deixado você ir dormir na minha casa. Passamos a noite dançando e cantando, bebendo refrigerante, nos beijando e, quando nos deitamos para dormir você me acordou:

– Noah! – sua voz saia em um cochicho, como a de uma criança.

Eu logo lhe respondi com um simples "oi".

– Podemos ir lá para o quintal observar as estrelas? – me perguntou nervosa.

Assenti e logo descemos até lá, já passavam das dez e estava muito frio, mas mesmo assim o céu nos impedia de voltar para a cama. Nos deitamos na grama e ficamos observando o céu em silêncio.

Naquela hora, minha garganta estava seca, eu queria falar, tinha tanto para dizer mas na hora nenhuma palavra conseguiu sair de minha boca. Eu olhava para você que se encantava com o céu acima de nossas cabeças mas mesmo assim ainda conseguia sentir o vazio em seu olhar, a insegurança talvez, ou talvez a dúvida. Sei que você queria a resposta tanto quanto eu queria falar mas não podia.

Não era um clima bom como se pensa ao ler isso, não depois de saber de tudo. Mas mesmo assim, ali continuavamos. Você iniciou o assunto após limpar a garganta, estava rouca como eu:

– Imagina como será daqui alguns anos? – não desviava seus olhos das estrelas.

– Não sei, talvez estaremos com uns três filhos no mínimo. – respondi e logo vejo um sorriso contido se estampar em seu rosto.

– Nós? – olhou para mim.

– Sim, eu, você, nós! – sorrimos.

– Acha que duraremos tanto assim? Não acha que será algo breve assim como já foi?

Novamente minha garganta se fecha mas me obrigo a falar:

– Acho. Acho sim, que duraremos tanto. Talvez nosso corpo perambule por mais alguns dias, meses ou anos, mas nossas almas eternas estarão eternamente seladas com o nosso amor e vagarão pelos céus, mares e terras e serão, daqui alguns anos, renovadas por outras duas pessoas que terão a sensação de já ter vivido aquilo antes.

Após isso ficamos em silêncio mas logo você me pergunta:

– E você me ama? – disse isso encarando o fundo dos meus olhos, como eu queria que, naquela hora, as estrelas fizessem seus olhos se marejarem mais do que essa pergunta.

Fiquei em silêncio. Em minha cabeça estava tão claro para você como para mim que eu te amava e que, se estávamos ali era por esse amor.

Você se levantou, voltou para dentro, pegou suas coisas e foi embora.

Ótimo, eu tinha falhado mais uma vez. Ou menos uma...

<33

O que eu não fui para vocês (andamento)Onde histórias criam vida. Descubra agora