O primeiro reencontro com Paula depois da viagem para Paris foi um pouco constrangedor para Carmem. Haviam se passado três meses desde a última vez que em que ela a viu — quando a convidou para passar um tempo fora — mas a sua espera angustiante pela presença da morena no avião ainda estava muito fresca em sua memória. Não houve ligações e nem mesmo troca de mensagens. Carmem não quis entrar em contato para saber o porquê do sumiço pois já sabia o motivo. Paula havia escolhido ele. Sempre ele. A tristeza foi tanta que não houve lugar para a revolta ocupar. Ela se sentiu tola por achar que a empresária Terrare seria capaz de se livrar daquele relacionamento disfuncional e humilhante para dar a ela uma chance.
Quando os olhares se encontraram uma onda de arrepios subiu pelo seu corpo e Carmem deu graças a Deus por estar vestindo mangas longas que cobriam os seus braços. Depois de um aceno tímido e um sorriso triste, a Wollinger se virou e caminhou em direção ao seu escritório. O melhor a se fazer agora seria evitá-la. Aquela sensação ruim em seu estômago estava voltando, tirando todo o seu ânimo de estar volta ao trabalho. Ela sabia que uma hora ou outra teria que enfrentá-la novamente, não com acenos rápidos ou sorrisos curtos, mas com palavras. Afinal, eram parceiras agora. "Grandes amigas", murmurou enquanto abria o computador. Ela queria ser de tudo para a morena, exceto amiga, mas para a sua tristeza Paula só conseguia vê-la como uma. Os sinais não haviam sido claros? Porque ela fez questão de deixar visível o seu interesse. Carmem tentou de tudo; falou sobre seus sentimentos, ofereceu presentes, pediu uma chance... vendeu até sua querida motocicleta para agradá-la com um jantar caríssimo mesmo sem ter um centavo em sua conta. Tudo isso em vão.
Não foram os bens perdidos que a magoou, mas sim a rejeição. Ah, e como doeu não tê-la ao seu lado. Seus primeiros dias em Paris foram uma tortura. Naquele dia em que Carmem descansou a cabeça no ombro de Paula ainda no corpo de Neném, ela acreditou que a sua alucinação à luz do dia com a Terrare poderia se tornar real e que as duas estariam juntas na 'cidade do amor', mas a realidade tinha sido muito cruel com ela e isso a afetou de modo significativo. Ter criado toda aquela expectativa acerca de um relacionamento inexistente foi um erro inadmissível; de uma burrice sem tamanho. Maldito seja o dia em que ela se apaixonou pela arquirrival.
Frustrada, Carmem retirou os óculos e afundou o rosto na palma de suas mãos. Não havia como se concentrar no trabalho quando tudo o que se passava por sua cabeça era ela.
— Carmem?
A platinada gelou ao escutar a voz familiar. Suas mãos caíram sobre seu colo e seus olhos viajaram até a empresária. Ela estava linda. Como sempre. Paula vestia um conjunto monocromático que provavelmente custara o olho da cara. Suas mechas loiras caiam sobre seu rosto. Seus pulsos estavam lotados de joias, assim como seu o pescoço. Carmem não pôde deixar de olhar para os ombros expostos da morena.
— Você está bem? — Perguntou Paula, fechando a porta e se aproximando da cadeira em frente a mesa de Carmem. Ela parecia insegura, como se não soubesse se tinha sido uma boa ideia aparecer por lá. — Eu não sabia que você estava de volta e... bem, você não disse nem um "oi".
Por que será, Paula? Carmem riu.
— Eu estou bem.
O silêncio que se instalou entre elas durou poucos minutos. Por algum motivo os olhos de Paula não deixavam a platinada. Era como se ela quisesse dizer algo, mas estava com as palavras presas em sua garganta. Carmem percebeu a forma como ela esfregava as mãos. O mal estar em seu estômago estava voltando.
— Sobre...
Carmem sabia o que estava por vir e decidiu cortar o mais rápido possível.
— Não. — A interrompeu — Não, por favor.
— Carmem, eu... eu acho que devo alguma explicação.
— Não, Paula. Eu entendo. — Uma parte dela queria se levantar, bater as mãos na mesa e exigir a explicação. Queria saber o motivo dela não desejar o seu afeto como deseja o do outro. Queria saber se era mesmo insuficiente para ela. Queria desabafar e dizer o quão magoada estava com ela. — Você não me deve explicações.
O clima estava tenso. Nenhuma das duas pareciam estar confortáveis no mesmo espaço e Carmem tinha a sensação de que Paula estava adiando alguma coisa.
— Você parece tensa, Paula.
A Terrare assentiu e passou colocou alguns fios rebeldes de cabelo atrás da orelha. Carmem não sabia o motivo, mas os olhos castanhos da morena estavam marejados. A preocupação tomou conta da Wollinger. Em questão de segundos ela estava de pé e caminhando em direção a morena até que suas pernas fraquejaram com as palavras seguintes.
— Eu estou noiva.
Ninguém disse mais nada.
E Carmem só voltou a respirar quando o barulho dos passos diminuíram depois que a porta do escritório se fechou.
VOCÊ ESTÁ LENDO
white blank page.
RomanceOh diga-me agora, onde está minha culpa Em te amar com todo o meu coração. Leve-me para a verdade e eu Te seguirei com a minha vida.