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 Por onde eu começo essa história? Ah sim, o assassinato. No dia primeiro de Julho, na pequena e tranquila cidade de Rio Dourado, no Rio de Janeiro, a grande escritora J. F. Lagos volta para suas origens para promover seu novo best-seller A Palmeira, e junto com ela, uma legião de fãs locais e não locais se aglomera na biblioteca-café Sakura. No decorrer do evento ouve-se um grito horrorizado de uma mãe grávida, todos correm em sua direção para ver o que está acontecendo e acabam por ver a mulher grávida e horrorizada, com a mão na boca e o corpo de uma mulher falecida no chão sujo de vômito e sangue de madeira do estabelecimento. Mas a questão é, quem era essa mulher? Quem matou ela?

 Vamos com calma, para você entender como e o quê aconteceu, primeiro devemos voltar um tempinho antes. Contudo, tenho que lhe alertar sobre algumas pequenas e insignificantes coisas; eu não sou uma narradora confiável e talvez eu não te conte tudo ou não conte exatamente do jeito que aconteceu, estejam avisados para depois não virem reclamar comigo que eu não avisei. Dados os avisos, podemos começar.

 Detetive Oliveira, para os mais íntimos, Giulia Oliveira, ou só Giulia, ou Giu - esse último somente as pessoas mais íntimas podem chamar ela assim - é uma moça branca, alta, ruiva e que antes de ser detetive, era perita criminal. Essa mulher magra, alta, branca, linda, ruiva, enfim, é uma mulher muito inteligente, que gostava muito de casos criminais, e quando terminou o ensino médio decidiu, vou ser perita criminal, porém quando terminou a faculdade, e teve seus primeiros dez casos, ela percebeu que não gostava tanto assim de ser perita e queria ser, na verdade, detetive, e assim o fez. Com menos de trinta anos, Giulia já se tornou detetive, porém com uma bagagem pesada chamada passado. Só posso contar uma coisa sobre isso; "Caso Pedro". Infelizmente, seu passado desastroso com o já mencionado "Caso Pedro" ainda assombra a pobre coitada, por mais que ela se dedicasse ao trabalho, por mais que ela se dedicasse a fazer o bem, a bichinha continuava se culpando e ficava se jogando no poço, repetidas vezes. Mas quem não gosta de uma coitada depressiva, não é mesmo?

 Vamos dar uma largada na Giulia um pouco e ir para a biblioteca Sakura que, em plena sete da manhã tem uma arrombada de uma mulher loira e esguia gritando com uma moça linda de cabelo preto curtinho e ondulado com um avental de loja de café. Bom essa filha da puta dessa mulher loira esguia, feia e baixinha é Joana Hugo Christie, dona dessa porra dessa bibli... - ai vocês já entenderam - e essa mulher linda, morena e de cabelo curto sou eu, isso mesmo, essa mulher que trabalha nessa merda desse café é a narradora maravilhosa que vos fala. Sim, eu sei que não estou sendo imparcial, mas eu avisei você no início que eu não era uma narradora confiável, e se tratando de minha pessoa, é óbvio que eu não vou ser imparcial. Enfim, essa mulher que está gritando comigo é minha chefe somente por ser herdeira do simpático Seu José, que foi quem fundou a Sakura, infelizmente ele se aposentou mais cedo e deixou o estabelecimento para a bruxa da Joana administrar, não posso dizer que ela não é uma boa gerente, ela é, porém ela é uma vaca, uma megera, uma vadia, uma biscate, entre outros adjetivos péssimos pra descrever ela, e ela sempre me odiou e sempre quis me prejudicar, porém nunca dei motivo pra ela me demitir por justa causa. E você me pergunta, mas Agatha, por que diabos você não se demite? Tenho alguns motivos plausíveis, o primeiro é que nesse buraco que é essa cidadezinha, essa biblioteca é o lugar que paga mais que os outros (graças ao santo do Seu José), é o lugar mais calmo e que exige pouquíssimo esforço, ou seja na maioria do tempo não temos muito movimento, afinal, além da cidade ser pequena, quem vem aqui pega um livro ou o notebook, compra um café, senta e fica na mesa por horas sem dar um piu, o que me abre uma brecha pra poder mexer no celular e atualizar o meu Instagram e o do café, mas se não fosse pelo diacho da Joana, eu amaria trabalhar aqui. Entretanto, quando ela não está, os dias aqui são uma maravilha e os clientes até aumentam.

 Sakura não é tão antiga, foi fundada em 1994 pelo Seu José, que por nunca ter seus maravilhosos livros, ou manuscritos, publicados, abriu uma livraria para vender, alugar e até publicar e deixar em exposição os livros dos escritores que desejavam o mesmo. Sakura é um estabelecimento grande, com enormes prateleiras, chão lustroso e brilhante de madeira da árvore de mesmo nome que a livraria, com mesas em frente a área conjunta com o café, onde tem aquelas prateleiras com vidro na frente pra colocar salgados e bolos e confeitos, e onde também tem a caixa registradora, onde você paga pelas bebidas, salgados e livros que você comprou ou consumiu. Sakura tem esse nome porque a flor e a árvore favorita do amor da sua vida, Henrique, era Sakura, infelizmente ele veio a falecer por complicações respiratórias devido a AIDS, e como homenagem, Seu Jorge colocou o nome dessa árvore na livraria.

 Mas voltando para a Detetive Oliveira, ela acordou às sete da manhã como de costume, se arrumou e foi para o trabalho. Por mais que o delegado, e seu chefe, Júnior garantisse para ela que ninguém a culpava pelo "Caso Pedro" e que ninguém comentava mais sobre, Giulia ainda se corroía e se amargurava por isso e mesmo tendo se passado dois anos e meio do ocorrido, ela ainda tentava desvendar o caso e achar o culpado correto. E claro que ela investigava clandestinamente, Oliveira podia parecer inocente, deprimida e coitada, mas a mulher é safada, inteligente e ardilosa e sabe exatamente como esconder algo ou alguém das pessoas, além de saber, também, exatamente como manipular as pessoas para agirem e pensarem do jeito que ela deseja, é por isso que ela é uma detetive tão boa e dedicada, por mais que Giulia não pense assim.

- Giulia - falou Júnior chegando até sua mesa - daqui três dias aquela escritora famosa, aquela tal de G. R., J. R. Gramados tá vindo aí pra promover o livro dela, e com ela vai vir a legião de fãs dela.

- Na verdade, JJ, é a J. F. Lagos que vai vir. Mas por que você tá me falando isso agora? Você sabe que eu sei.

- Então, eu recebi ordens superiores - diz Júnior com o dedo indicador direito apontando pra cima junto com seus olhos negros - e eu preciso te designar a função de ser a guarda-costas da escritora... 

- Ah nem fodendo, você sabe muito bem o que aquela mulher fez pra minha mãe, você ao menos tentou barganhar com eles ou oferecer outro alguém, afinal eu sou detetive e não policial.

- Olha, eu sei disso tudo, e sim eu tentei oferecer o Thiago, nosso melhor policial, mas eles me falaram que tinham ordens explícitas da assessoria da escritora pedindo você.

- Eu me recuso, e outra eu tenho trabalho pra fazer, tenho uma mãe pra cuidar, o aniversário do meu irmão tá chegando...

- Eu estou ciente disso, só que eles até ameaçaram me demitir e demitir você, então eu acho melhor você ficar de bico fechado e fazer o que eles mandaram

- Eles não podem fazer isso, isso tá muito errado.

- Eles só não podem, como fizeram.

Então assim começa nossa história e o assassinato misterioso na livraria. Dado a vocês o contexto, podemos retornar ao homicídio?


A Xícara QuebradaOnde histórias criam vida. Descubra agora