O fim de um poeta.

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Augusto dos Anjos sempre entendeu as minhas angústias, não era à toa que ao me deitar lia um poema antes de adormecer

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Augusto dos Anjos sempre entendeu as minhas angústias, não era à toa que ao me deitar lia um poema antes de adormecer. O meu sentimento desde muito tempo estava em perigo, como arrancar de mim a dor que tortura minha mente. No amanhecer de um domingo cinzento devido ao céu nublado, logo sem pingar, trouxe a mim a despedida. Já havia escrito um atestado de óbito, escrito que não haja interrupções, e confiante ao que planejei fazer, sigo. Deixo o relógio bater às 8 horas para que eu venha trajado a caráter, até então a minha ida deverá ser com classe. Estou alimentado pelo último café servido, o último pãozinho consumido... a última ida ao banheiro, a última escovação de dentes. Retorno ao quarto apenas de calça, suspensório, blusa de linho branco, colete preto, e disponho para pegar o termo preto no armário e a cartola. Visto-me olhando como adequa bem a costura as minhas pernas longas e magras. Noto que o terno abraça muito bem meu tronco, e que a gravata desenha muito bem o meu pescoço, abraçando como se fosse um urso de pelúcia. Após estar completo, restam apenas detalhes, como a presilha de gravata, o relógio de bolso que é um utensílio indispensável, e meu anel de pedra vermelha medieval. Olho se está tudo correto em minha casa para enfim ir embora para sempre. Pego algumas moedas para pagar o condutor, e o mesmo olha atentamente a mim analisando o quão estou bonito. Estou concentrado ao que me dispus a fazer, e ao chegar à praça da cidade, agradeço ao homem gentil dando-lhe um aperto de adeus. Seu olhar intrigante diante de mim me deixa incomodado, sumindo ao longe na densa poluição. Às pessoas me olham por onde passo e isso aciona um alerta de que não era para ser tão chamativo a despedida. Algumas moças dão seus cumprimentos assentindo a cabeça e algumas até dispõe do chapéu, alguns homens fazem o mesmo segurando em suas cartolas, chapéus de coco, e até boinas... eu não entendia a razão da gentileza. Caminhando alguns bons passos, onde a multidão desaparece pouco a pouco para a minha alegria, avisto a praça surgindo no horizonte em que seu monumento ampliava a imponência daquele lugar. O monumento ao centro da praça histórica era de fato sensacional. Com um balcão ladeado de anjos e querubins, além é claro de quatro pórticos médios acentuando no topo, cavaleiros, vejo a estátua de um homem cercado de outros impondo a espada aos céus. De fato eu estava diante uma obra escultural divina. Mas tudo aquilo iria acabar e me sento no banco de mármore onde faz parte do complexo monumental. A mente estava vazia, e o coração seco... mas isso não impede de acomodar as costas no banco, por minha mão reta em meu peito, e assim  gatilhar o disparo. O impacto fura o meu coração e a dor daquela angústia se vai... As pupilas expandem até preencher o que um dia teve amor. A mão do assassino despenca no seu próprio colo... a boca que um dia falou coisas incríveis, bondosas e maldosas, beijou damas e senhoras, escorre o sangue do impuro pecador: e os dedos aos quais digitava, escrevia e fumava, perdem o tato. O meu peito derramava o vivido e quente sangue cardíaco, sujando a blusa branca de linho, cessando de repente para dar lugar a uma linda flor. 

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