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A distância nunca tinha se apresentado a William objetivamente como um problema.

Não era alguém dado à poesia, mas ainda acreditava que a separação geográfica não poderia de fato afastar pessoas. Ou talvez sempre fora certa frieza de sua parte a respeito do distanciamento de pessoas que achava terem muita proximidade consigo. Mas essa frieza nunca fora proposital, é claro; tanto ela agia inconscientemente que apenas foi a reparar na possibilidade de sua existência quando de repente passou a realmente sentir falta de alguém.

O sentimentalismo do rapaz era incrivelmente medido e balanceado às réguas da possibilidade humana, não podendo ser dito como inexistente, nem agindo em demasia. Ele não era imune à saudade, nunca se dissera como tal, mas nunca se desestabilizara – ou permitira se desestabilizar – em função dela.

Amava e se importava como todo ser humano neurotípico, mas o quanto quase não tinha um peso significativo o bastante; na verdade, achava que quanto mais amasse, mais seguro se sentiria, e nenhuma separação física poderia ser capaz de lhe preocupar.

Isto é, até o momento anterior ao em que sua vida se juntou oficialmente à de Sherlock, com um simples e singelo pedido.

Quanto mais os sentimentos cresciam e a relação progredia, o Moriarty se tornava gradualmente mais vulnerável – fatalmente vulnerável, ele poderia dizer.

Não queria desalinhar o nível estável com que era afetado por sentimentos, mas quando levado a se tratar do amante, uma parcela irritantemente grande das coisas se tornavam efetivas o bastante para o tirar dos eixos.

O amor estava o tornando fraco? Sinceramente, não queria pensar assim.

Era mais como se amá-lo, e ser amado por ele, lhe desse a segurança necessária para se entregar às emoções mais comuns.

Sem que percebesse havia derrubado um a um dos muros que construira dentro de si mesmo, e consequentemente uma invasão ainda mais inesperada acontecia em seu castelo, onde se protegia dos próprios sentimentos.

Solidão. A cada ano, conforme a carreira do detetive Holmes decolava, as viagens a trabalho se tornavam cada vez frequentes; e com cada vez mais experiência, os casos lhe designados eram comumente mais difíceis, o que demandava, portanto, mais tempo até ser encontrada a solução.

Tristeza. Não era fácil para si ter de se despedir do noivo a cada um ou dois meses que passavam juntos.

Culpa. Sentia por vezes como se fosse por estarem morando a dois em uma casa maior que ele precisasse se desdobrar cada vez mais.

Paixão. Não queria que o alvo da sua desistisse da própria. Sabia que, apesar de lhe doer muito a situação, nunca seria capaz de pedir a ele para desistir da profissão que tanto amava. Nunca se permitiria ferí-lo, apesar de tudo. Exatamente por o amar demais, preferiria que partisse atrás de seus sonhos a ficar o tempo todo do seu lado, porém infeliz. Gostaria de ter ele sempre por perto, mas seu coração doeria ainda mais caso o fizesse.

"Estaria sendo egoísta demais por sentir tanto sua falta?", sussurrou para o nada, repetindo uma pergunta que já fizera a ele.

A resposta que obtivera da vez anterior em que proferira tais palavras, fora capaz de acalmar seu coração naquele momento, e em todas as vezes que se lembrava dela.

'É claro que não.', o moreno lhe tomara a mão da aliança, com um sorriso radiante e habitual nos lábios. 'Afinal, se fosse assim...', beijara o anelar antes de acrescentar: 'eu também seria muito egoísta.'

Rodando do lado racional de seu cérebro, tal resposta não tivera exatamente coerência com o sentido em que fora exprimida sua questão; mas lido por sua parte instintiva, não poderia deixar de se sentir bem. Esse era um dos muitos talentos de Sherlock, dizer coisas que causavam um leve curto circuito em seu sistema operacional.

Gostaria que ele ouvisse essa pergunta mais uma vez, e talvez desse uma resposta um pouco mais coerente; mas não tinha intenção de atrapalhar o merecido sono tão tranquilo e pesado que ele estava tendo, e ao qual seus pensamentos acelerados não lhe permitiam compartilhar.

Depositou um beijo em sua testa, lhe desejando em silêncio uma boa noite. Não gostaria de ser egoísta mais uma vez.

Egoistic • sherliamOnde histórias criam vida. Descubra agora