2 - Cidade

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Minha respiração calma e o som da água que se movimentava entre os meus dedos na banheira que me deleitava, foram por um instante os sons tranquilos e baixos que me libertaram da aflição e ansiedade que eu estava a respeito de sair de casa naquela noite. A forma como as paredes do banheiro de meu quarto, tinham um tom pastel que por sua vez havia ornado muito bem com o restante da casa, sempre me deixava satisfeita em observar, até quando estavam embaçadas á pingar pelo calor da água que banhava-me. A sensação extasiante e confortável durou pouco, me apegando a detalhes, até o momento em que me sentei naquela carruagem.

Já fazia meia hora em que apenas se ouvia a voz da jovem Hellen. Tão tagarela por sua vez, fez que eu temesse a mudança repentina de ideia vinda de papai –que daria meia volta nem que fosse a metade do caminho–para nos deixar trancadas e aproveitar o doce e desejável silêncio.
A ouvimos tagarelar sobre diversos assuntos. Falou sobre a dificuldade de decorar um soneto, sobre querer após casar-se –em específico com um homem de um dote admirável– desejar a presença de um nobre e talentoso pianista, que teria como trabalho tocar as mais belas canções diariamente em sua casa. Hellen presumiu –mesmo sem sequer ter ideia– que seu futuro marido e companheiro, será um amante da música.

Numa tentativa de tentar distrair-me dos sons exteriores que se resumiram apenas na voz de minha irmã, parei para puxar o fôlego preguiçosamente. Sentindo perfeitamente –pelo fato de todas as janelas da carruagem sem muito luxo no qual viajamos estarem abertas– o cheiro de chuva, das plantações e dos mais belos pinheiros, pouco a pouco desaparecer, sinalizando enfim que estávamos perto da cidade.
Logo ficou óbvio tal acontecimento, pois os sons de dezenas de cavalos caminhando, com seus cascos batendo com firmeza no solo foram inegáveis. Mesmo sendo noite, parecia ter mais pessoas do sequer um dia teve no campo, tanto movimento que até o mais atento dos homens, se perderia. Cavalheiros bem vestidos, com seus chapéus elegantes geralmente na cor preta ou azul escuro. Damas bem vestidas andando com nobreza pelas ruas, laços em seus penteados e belas penas que combinavam com o restante de suas vestimentas. Elas pareciam alegres, ansiosas pois sabiam que em breve seriam cortejadas por um desses rapazes, ou homens adultos.

- Enfim chegamos, e parece que sua conversação afugentou a voz de sua irmã, Hellen querida. - diz minha mãe interrompendo o que mais parecia um monólogo de sua filha.
Antes que eu pudesse concordar ou me opor a tais palavras, Hellen tornou a falar:

- Ah mamãe! - exclamou em um tom reclamão - Isabel mal fala de qualquer maneira - "Talvez não com você" pensei. Porém ela continuou - Ela gosta apenas de discutir com belas palavras! E por isso nunca me casarei! Pois Isabel nunca as usa para cortejar alguém- Hellen completa por fim, enrugando os lábios com uma expressão teimosa acompanhada de um cruzar de braços. O que não me impressiona ou me comove.

Acho que Hellen será uma divertida e adorável esposa, quando chegar em sua devida idade, e entender que um casamento é mais do que ele pode lhe proporcionar.

- Céus.... Basta Hellen! Afugentou sua irmã assim como fez com todos, até o pobre cocheiro...- meu pai se pronunciou de forma cansada, suspirando a casa frase.
O vejo lançar um olhar em minha direção, arrancando de mim um leve sorriso, já era hora de alguém insistir pela volta do silêncio.

A carruagem parou, e assim que o cocheiro –com suas mãos ásperas e fortes– fez a gentil cortesia de abrir a porta, eu fiz a questão de ser a primeira a sair, pois, assim teria tempo suficiente para fazer algo que gosto muito; apreciar.
Após por meus pés para fora respirei mais uma vez, fundo, sentindo o pequeno pingente de meu colar se mexendo com o movimento da respiração, arrumando minha postura. Senti o frescor da noite que estava morna, beirando para fria. Podendo jurar também sentir em minha boca o gosto dos pães e doces da padaria, pois o cheiro de uma fornada quente se espalhou pelo ar vindo de um comércio próximo. O perfume doce e envolvente das moças que desfilavam... Havia sim chego, a cidade.
Subi o olhar para o casarão que nos aguardava na frente onde havíamos encostado a carruagem, reparando assim nas diversas luzes que traziam maior clareza aos meus olhos para ver a propriedade. Carregava um tom claro, era detalhada demais para ter sido feita por falhas... Pessoas. Detalhes delicados como se fosse feita de cera, facilmente maleável assim como a facilidade de se rachar e quebrar-se. Talvez tenha mantido tempo demais com os olhos apontados em direção a casa, pois senti o toque do meu pai sob minha cintura -sendo assim um sinal de que me distrai por tempo demais-

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⏰ Última atualização: Jul 16, 2022 ⏰

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