Observou atentamente o pequeno pedaço de tofu de amêndoas ser capturado pelos lábios de Aether.
Cada vez que ele comia um pedaço diferente, seus lábios ficavam molhados pela calda, adquirindo um brilho que parecia os deixarem ainda mais rosados do que já eram. Quando ele terminava de mastigar, passava a língua inconscientemente sobre eles - Xiao sabia que era um ato inconsciente do loiro; na verdade, ultimamente, conhecia a fundo cada gesto de Aether mais do que achava que deveria.
Não sabia ao certo quando tudo aquilo - ou melhor, quando os dois, ele e Aether - havia acontecido. De uma vida milenar, regrada e rotineira, onde Xiao não tinha de pensar muito a não ser cumprir o seu dever como Yaksha, aquela era a primeira vez que seu mundo havia sido tão abalado depois de muito tempo vivendo silenciosamente nas sombras. Aether havia o abalado por inteiro; mas, dessa vez, de um jeito bom.
Um jeito bom, mas que ainda sim conseguia deixar o Adeptus em pânico. Quando havia se acostumado a lutar contra seus demônios internos e aprendido a lidar com seu coração banhado em trevas, ele havia aparecido. Foi muito difícil se acostumar com uma presença tão irradiante e com algo tão bom ao seu lado. Tanto que, muitas vezes, não se achava merecedor de tudo que o viajante lhe proporcionava. Afinal, Xiao já havia sido alguém que havia trazido muita dor e sofrimento para as pessoas desse mundo. Mesmo que não soubesse mais há quantas centenas de anos isso aconteceu, ainda não sabia lidar com o karma e o fardo que carregava em suas costas.
Porém, até nisso o loiro o ajudava. Aether era vida, liberdade e calmaria. Apareceu neste mundo e em sua vida como o vento; era como se fosse uma brisa fresca ao fim do dia, banhando o seu rosto e trazendo a paz que necessitava para aguentar se levantar todos os dias. Não sabia como colocar em palavras, mas o loiro era inteligente o suficiente para captar todos os seus gestos.
Além de falar o suficiente pelos dois, é claro.
Olhou para seu próprio prato da comida, ainda quase inteiro, e subiu novamente os olhos para o loiro. Ainda era cedo e ele e Aether haviam acabado de acordar. Bem, não que Xiao tivesse dormido nos últimos dias; não precisava de tantas horas de sono como os humanos. Porém, apenas deitar ao lado de de Aether e zelar pelo seu sono conseguia trazer uma sensação de relaxamento e descanso que jurou não ter sentido em muito tempo.
Observou os fios loiros, soltos e bagunçados caindo pelo seu ombro. A luz do sol matinal entrava pela janela e deixava a sua tez mais dourada e reluzente do que já era, chamando toda a atenção para si. Aether segurava uma mecha de cabelo atrás da orelha toda vez que baixava o rosto para comer mais do café da manhã, e então fechava os olhos, como se estivesse apreciando a comida, apenas para abri-los e olhar com aquelas duas orbes intensas e cor de ouro na direção de Xiao.
Não sabia o que estava acontecendo consigo ultimamente, mas o borbulho em seu estômago quando estava perto do viajante parecia crescer mais a cada dia. Não era como quando começou a se apaixonar ou quando os dois engataram um relacionamento; era uma ansiedade diferente. Queria conhecer mais dele, mergulhar no mar dourado que era Aether, tocá-lo e experimentar mais de tudo aquilo que ele lhe proporcionava, oferecendo tudo o que ele quisesse em troca.
Namoravam de fato há poucas semanas e o máximo que haviam feito eram pequenos beijos no canto da boca ou selinhos curtos. Xiao sentia que Aether tinha certo receio e sabia que isso era por conta de si mesmo. Ele tinha medo de pressionar ou correr demais com as coisas, mas Xiao não se importava, e queria fazer de tudo com ele. O problema é que não sabia como colocar isso em pauta.
Nunca achou que as coisas tão mundanas, como relacionamentos, seriam o que tiraram sua paz nos últimos dias.
— Você não vai comer?
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First Love, Late Spring
FanfictionXiao, em toda a sua longa vida, nunca achou que ficaria tão rendido por gestos tão mundanos como relacionamentos e amores. Mas, talvez, só pensasse dessa maneira porque ainda não havia conhecido Aether.