Capítulo 04

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 — Você disse não? — Sílvia não escondeu a surpresa nos olhos escuros e muito menos na voz ao encarar a filha

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 — Você disse não? — Sílvia não escondeu a surpresa nos olhos escuros e muito menos na voz ao encarar a filha.

— E pediu demissão? — Gustavo, seu irmão gêmeo, parecia realmente surpreso com a segunda parte da sua informação. Ela quase riu disso. Estava esperando esse tipo de reação, sabia que ele não ficaria impressionado com a recusa do pedido de casamento do homem com quem passou quase sete anos junto. Mas, sim, de ter pedido demissão do emprego que tanto amava.

E por isso que ela ligou para a mãe para organizar um jantar com o irmão. Que tinha novidades para eles sobre sua vida. Não levou malas, chegou de manhã na casa da mãe com o vestido caro que Murilo tinha comprado. Que logo trocou por umas roupas suas que por sorte, sua mãe ainda tinha guardado. Fez o jantar, esperou que todos comecem e contou sobre o fim do seu relacionamento.

Sabia que sua mãe estava curiosa, e comentou o dia todo de como ela parecia triste. Mas, Giovana não quis corrigi-la. Não estava triste. Zangada, usada, frustrada e envergonhada, sim. Triste? Não. Nenhum pouco. O que a deixava ainda mais brava. Dedicou anos da sua vida a Murilo para no final não sentir nada? Nadinha de nada?

Ela deixou essas questões dançarem na sua mente durante todo o dia; mas agora, depois do jantar, estava melhor. Cozinhar a tinha acalmado e organizado seus pensamentos.

— Murilo usou do meu amor pela culinária, usou minha determinação e roubou meus sonhos — Giovana bebericou o vinho Bodini com os olhos fixos nas duas pessoas mais importantes da sua vida. — Nós construímos aquele restaurante juntos. Meu Deus! Eu planejei todo aquele lugar! A decoração, a contratação dos funcionários... tudo! Murilo só tinha aqueles contatos chiques e um pai rico.

— Bem, não posso dizer que sinto muito. Estou feliz por você ter acordado para a vida — Gustavo sorriu para a irmã.

— Gú... — Sílvia repreendeu o filho, não era hora para aquilo.

— O que foi mãe? É a mais pura verdade! Murilo nunca a amou e a senhora vivia me dizendo isso.

— Mas agora não é hora de criticas e ...

— Gustavo tem razão mãe — Giovana sorriu tranquilizadora. — Não sei porque não percebi antes. Só me dei conta ao ouvi-lo dizer sobre como tudo que ele tinha feito pelo restaurante. Era tudo dele... E vi o que eu realmente representava para ele.

— Ah querida...— Sílvia segurou a mão dela por cima da mesa. — Eu sinto muito. A pior sensação do mundo é a de ser usada e descartada.

Giovana olhou para a mãe. Sim, ela, melhor que ninguém, compreendia a sensação. Poderia não ter sido traída como seu pai traiu sua mãe, mas ainda, sim, era a mesma sensação.

— E como Murilo ficou depois que você recusou o pedido dele? — Gustavo quis saber, torcendo para que sua irmã o tinha humilhado.

Giovana fez uma careta ao lembrar da cena.

— Murilo riu, achando que eu estava brincando. Sinceramente, acho que até agora ele não entendeu. Deve ter achado que eu estava muito surpresa e confusa. Deu tapinhas nas minhas costas, que esperaria eu me acalmar do choque.

Gustavo bufou e revirou os mesmos olhos azuis-esverdeados da irmã. De todos os Bodini.

— Aposto que nem passou pela aquela cabeça egoísta dele que alguém pudesse recusar um pedido de casamento.

Giovana assentiu, concordando com o irmão.

— Bem, azar o dele. Porque eu falei sério. Eu não sei quando deixei de amá-lo; mas não o amo mais. Não posso construir ou ser feliz ao lado dele.

— Ou talvez, querida... — Sílvia apertou a mão dela, carinhosamente — você nunca o tenha amado.

Giovana franziu o cenho, tentando lembrar do momento que se conheceram, da sensação que tomava seu corpo toda a vez que estava com ele e... não se lembrou de nada. O que tudo isso significava? Ou ainda estava magoada demais para lembrar das coisas com clareza?

— E o que você vai fazer agora? — Gustavo quis saber.

Giovana respirou fundo.

— Não sei. Abrir meu restaurante e seguir meu sonho. Reconstruir minha vida. Começar de novo. Tremo só de pensar em voltar no apartamento de Murilo para pegar minhas roupas.

— Posso ir com você.

— Agradeceria muito, mãe.

— Ou pode deixar tudo lá — Gú sugeriu com um brilho maldoso no olhar. — Adoraria ver quando dias levaria para o idiota perceber que você deu um pé naquela bunda magra dele.

— É uma ideia tentadora, mas não posso usar as poucas roupas minhas que a mamãe guardou. Preciso das minhas roupas, sapatos, joias...

— Compra tudo novo. Vida nova, tudo novo — piscou para ela.

— O problema é que se eu quiser abrir meu restaurante, vou precisar economizar; não posso me dar ao luxo de gastar tudo com roupas.

— Espera! — Sílvia estralou os dedos. — Seu irmão vai voltar para Blumenau a trabalho, porque não aproveita e vai com ele?

— Mas o que eu irei fazer lá, mãe?

— Abrir seu restaurante. A Nonna não te ofereceu apoio? Você me contou sobre isso quando voltou de Blumenau ano passado.

— Verdade! Gio, eu posso arrumar um quarto para você na pousada, posso colocar você no mesmo voo que a equipe de produção. Aí, podemos passar na vinícola e conversar com a nonna.

A cabeça da Giovana girou com as possibilidades, com o caminho que sua mãe e irmão estavam abrindo diante dela. Possibilidades. Família.

Nonna só estava sendo educada, não vai simplesmente me dar dinheiro assim — tentou racionalizar.

Nonna Carmine Bodini nunca faz nada por educação — Sílvia afirmou com a convicção de quem conheceu muito bem a ex-sogra. — Tudo que ela faz é porque quer fazer.

— Você tem o número da nossa prima Liliana, não têm? Então, liga para ela e fala sobre essa ideia. Aí, vamos juntos para o sul e você pode conversar pessoalmente com a família. — Gustavo falava com convicção. — É uma ideia, Gio. Uma possibilidade.

Giovana viu o brilho nos olhos da mãe, a certeza do irmão e cedeu. Afinal, não tinha mais nada a perder, não é?

— Tudo bem. Acho que não custa nada tentar. 

 

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Tempero de Desejos ( Série Bodini)|DEGUSTAÇÃO|Onde histórias criam vida. Descubra agora