Kyra Murray.
Aos 12 anos me vi na pior das condições possíveis, eu era jovem demais, o que fez os especialistas acharem um pouco estranho a existência da minha esquizofrenia.
Era algo doentio, fora do normal. Aquelas vozes surgindo de uma hora para a outra em minha cabeça, as imagens, os pressentimentos, as sensações de nunca estar sozinha.
Eu era normal, disse certo: era.
A primeira "aparição" me deixou assustada, eu olhava para os lados para ver se via alguém, mas não, aquilo estava só em minha cabeça, só eu ouvia aquilo.
Eu era muito nova, o que me levou à não contar de imediato para meus pais, eles conseguiram perceber sozinhos. Qualquer um perceberia meu comportamento. Eu não era mais aquela criança feliz e sorridente, eu sempre estava perturbada ou fazendo algum movimento estranho. Eu achava que tampar os ouvidos fariam aquilo parar, quem me dera se realmente acontecesse.
Quando minha mãe descobriu minha doença, logo começou a me levar ao médico para fazer os tratamentos necessários, os antipsicóticos eram remédios caros, e me faziam ficar mais relaxada, era como uma droga. Mas como toda droga... o efeito passa. E tudo aquilo voltava. As vozes, risadas, imagens, vultos, tudo aquilo me fazia chorar desesperada, às vezes tão perturbadores que eu gritava a qualquer momento, não importava onde estava ou o que estava fazendo, eu gritava como uma louca, acho que era assim que todos me viam.
[...]
Meu quarto era todo decorado em tons de roxo e lilás, mas eu via cores mortas, era tudo sem vida, meus olhos não brilhavam mais, eu não era mais uma criança feliz. Eu queria aprender a lidar, mas não conseguia.
Eu estava lá, num canto encolhida, minha mãe estava dormindo e meu pai em uma viagem de negócios.
Eu estava naquele estado porque tudo resolveu me perturbar, já não era mais uma doença comum, eu não estava vendo as coisas de sempre, era tudo muito pior. Era como se estivesse realmente presente em um lugar sombrio, escuro, com criaturas de feição bizarra, que falavam e sorriam para mim.
Eu estava encolhida e meus olhos se encontravam fechados, minhas mãos em minha cabeça coçavam o couro cabeludo tão profundamente que doía, eu sentia minhas unhas me perfurando, mas eu não conseguia parar, meus olhos não abriam e minha boca só se abria para respirar mais profundamente, era como se minha voz tivesse sumido.
Era surreal, tanto que sentia minhas veias saltando e meu sangue correndo nelas.
Eu realmente estava bem? Era só mais uma crise?
Aquilo era sobrenatural, eu estava possuida por pensamentos, ou criaturas invisíveis.
Ouvi um barulho no andar de baixo, mas não me mexi, eu não tinha o controle do meu corpo.
Mais barulhos podiam ser ouvidos, e logo ouvi a porta do quarto da minha mãe se abrindo, ela cochichou meu nome e não respondi, ouvi seus passos leves descendo a escada, ouvi também um barulho mais alto e em seguida, seu grito.
Minha respiração acelerou e eu sabia que algo havia acontecido, eu era nova, mas já tinha ouvido de tudo.
Uma lágrima se escorreu em meu rosto e logo depois fui tomando o controle sobre meus membros, meus sentidos voltando e depois... eu levantei.
Desci as escadas e um carro parecido com o do meu pai estava na calçada de minha casa, mas não era o dele.
Um homem estava do lado de fora, olhando para todos os lados, o outro saiu da cozinha e me viu, olhando para o corpo já quase sem vida de minha mãe.
Minhas pernas amoleceram e se recusavam a ficar em pé, mas mesmo assim eu desci, devagar, não me importei com o homem, minha mãe estava lá, sangrando e chorando olhando em meus olhos.
Eu me ajoelhei ao seu lado e coloquei sua cabeça em meu colo, eu encarei o homem e ele não teve reação alguma, olhei nos olhos de minha amada mãe, os dela estavam cheios de lágrimas, os meus... secos, sem brilho algum.
- Fique forte Kyra, eu sei que consegue, nada de ruim acontecerá para você, é só ser forte. - Ela disse em meio à soluços e falhadas de voz.
Deitei sua cabeça no chão ao ver seus olhos se fecharem, a minha cabeça agora estava no peito dela, as lágrimas começaram a aparecer, mas minha dor era silenciosa.
Lá eu fiquei, e o tal homem, me olhou por algum tempo e chamou seu parceiro. Os ouvi cochichando algo do tipo "Vamos levá-la? Não podemos fazer nada, eu não vou matar uma criança"
Eu apenas os encarei com meus olhos mortos, eles não tinham reação alguma, até um deles dizer.
- Não pode contar pra ninguém o que ouve aqui okay'? - Eles simplesmente saíram sem levar mais nada, apenas entraram no carro e dirigiram para algum lugar.
Fiquei ali só por mais alguns minutos acariciando o rosto gelado de minha mãe. Depois saí de casa e fui andando, eu não sabia pra onde estava indo, mas as vozes me diziam para seguir em frente, e foi o que fiz.
Apenas continuei minha vida, até chegar onde estou agora.
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Delirium
HorrorNunca me viram como uma garota normal, eles estavam errados quanto à essas impressões precipitadas sobre mim. As coisas que via e ouvia não me deixavam em paz. Assim, eu realmente não conseguia ser normal. Mas eu juro que tentei. As imagens e voze...