Capítulo dois

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Segundo Ato

Três meses antes


Yongha nunca entendeu o porquê do gênero teatral surgido na Grécia Antiga receber o título de comédia, quando na verdade era basicamente sátiras ácidas sobre problemas reais, cujo humor se perdia nas caricaturas grotescas e nos gritos e zombarias de quem as interpretava. Provavelmente, quem viveu naquela época achava isso extremamente divertido, mas para Yoo Yongha, um jovem de vinte anos, nascido no litoral e amante de filmes de ficção científica, comédias gregas não possuíam humor, elas eram, de longe, sombrias e até mesmo assustadoras.

Talvez tenha sido esse o motivo que o levou ao clube de teatro da Universidade, sua curiosidade.

Ele tinha acabado de entrar para a faculdade de Letras, e alguns veteranos distribuíram-lhe panfletos com todos os clubes disponíveis para o seu departamento, mas foi o panfleto carmesim com o desenho de duas máscaras, uma com um sorriso medonho e a outra com ares de desespero, representando a tragédia e a comédia teatral, que lhe chamou mais atenção.

As reuniões do clube de teatro funcionavam às terças e quintas, mas o clube ficava aberto durante toda a semana para os estudantes ensaiarem e organizarem o palco e os figurinos. Yongha sentiu-se incerto quando chegou na entrada da sala no final do longo corredor de janelas em mosaicos de vidros coloridos, ele segurava o panfleto na mão e apenas uma das alças da mochila no ombro. Os pés imóveis no assoalho de madeira, ouvindo as vozes que vinham de dentro da sala.

— Não vai entrar? — perguntou um rapaz que vinha no corredor. Sorriso largo no rosto, cabelos castanhos e olhos gentis. Era a personificação de um anjo, Yongha pensou. — Vamos, nós não arrancamos pedaço.

O rapaz delicadamente guiou Yongha para dentro da sala, segurando em seus ombros.

Yongha então decidiu ficar.

Teatro nunca foi sua grande paixão, mas nas primeiras semanas que se passaram, descobriu que podia amar a atuação, a imensidão de gêneros teatrais e um certo rapaz de sorriso bonito e palavras doces, que se doava de corpo e alma a cada papel que estrelava. Seu nome era Jang Daehyeon.

Eles não se tornaram próximos de primeira, pois Yongha era muito tímido para sequer ousar olhar Daehyeon nos olhos, mas seu nome já havia caído nas graças do destino, e como em uma comédia romântica, eles dois foram escolhidos para protagonizar a peça anual que estava marcada para acontecer dali a dois meses. Romeu e Julieta. Porém, nem mesmo Shakespeare seria capaz de prever tamanha tragédia.

Passaram a ensaiar juntos, a ficar até tarde da noite na enorme sala do clube de teatro, debaixo de um holofote, entoando falas e mais falas, trocando olhares, sorrisos, segredos. Tornaram-se amigos. Contudo, noite após noite de ensaio, Yongha se apaixonava um pouco mais por Daehyeon, e Daehyeon… o amava ou não? Eis a questão. Somente os céus saberiam dizer o que se passava em seu coração.

Mas foi em um desses ensaios, quando Yongha, exausto de tanto tentar ser a Julieta perfeita, foi envolvido pelos braços repentinos de um Romeu que era perfeito, impecável, havia nascido para aquele papel. Porém, não estava no script as palavras de conforto que saíram dos lábios sorrateiros daquele Romeu, tampouco o brilho nos olhos ao ler cada movimento do corpo de Yongha, conectado ao seu abraço como se aquele fosse o seu lugar predileto no mundo inteiro. Muito menos foi planejado o beijo fugaz deixado às pressas nos lábios alheios, pois a timidez soava alto como as notas agudas de uma cantora de ópera.

Aqueles não eram Romeu e Julieta, eram Yongha e Daehyeon vivendo a sua própria tragicomédia.

Mais um mês se passou. O dia da grande apresentação estava se aproximando.

Os ensaios continuaram até tarde da noite, mas na madrugada afora, Yongha e Daehyeon se encontravam sem os seus determinados papéis, sem roteiros ou frases premeditadas. A cama de Daehyeon se tornou o palco, os lençóis eram as cortinas, e os dois atores não encenavam suas falas, elas simplesmente saíam de seus peitos, improvisadas pela respiração cortada, pelos dedos entrelaçados e pelos milhares de beijos que ambos repartiam de forma igual.

E naquele intenso amor de horas contadas pelas luzes das estrelas, Yongha começou a se sentir incompleto. Incompleto, ora pois, só conhecia Daehyeon quando estavam na sala do clube de teatro, ou em seu minúsculo apartamento. Durante o dia ele era um completo desconhecido, e seu paradeiro Yongha nunca sabia. Então o jovem aspirante a ator finalmente percebeu que sua vida era como as comédias teatrais, uma infame zombaria onde alguns achavam graça, enquanto que para outros só restavam lágrimas.

Yongha, em uma tarde de solidão, avistou seu amor nos braços de um outro alguém.

Daehyeon tinha uma namorada, e era com ela que ele passeava de mãos dadas pelos corredores da Universidade enquanto o sol não se recolhia, sorrindo largo, com seus olhos e gestos gentis, proclamando em voz alta os "eu te amo" que Yongha só podia ouvir aos sussurros no meio da escuridão da noite.

E aquele pedaço cujo Daehyeon disse não arrancar quando se encontraram pela primeira vez, foi arrancado do coração de Yongha com frieza em apenas uma mordida, sujando de sangue os lábios de um Romeu atroz, e deixando para trás uma Julieta devastada.

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