Elas

Nascida do Silêncio

1

Era 1938. A fria noite de inverno castigava a população carente. O vento gelado e cortante entrava por entre os pequenos vãos das portas e atingia os moradores como navalhas.

Naquela noite Selma sentia muita cólica, mas também era de se explicar... Era a semana de número 40. Melissa estava prestes a vir ao mundo.

Porém, toda a alegria da gravidez foi se perdendo nos últimos meses. Edvaldo não conseguiu ficar longe da bebida, e voltava muito tarde para casa. Selma ouviu boatos de que ele voltou a frequentar os bordéis, e isso a entristecia muito.

Há algumas semanas Edvaldo havia chegado completamente embriagado, já era de madrugada quando ele caiu em frente ao portão de casa. Selma estava o aguardando furiosa.

— Isso são horas Edvaldo?

— Mulher, não enche! Tive um dia estressante e tenho direito! — Ele mal conseguia pronunciar as palavras corretamente.

— Por acaso você não se deu conta de que será pai!?

— Já disse para não me encher! — Edvaldo deu um empurrão em Selma, fazendo-a cair no chão.

— Me desculpe, amor! Foi sem querer, foi impulsivo, me desculpe! — Selma não se machucou fisicamente, mas estava emocionalmente arrasada.

Depois desse fato, aliado à diversas outras ocasiões onde Edvaldo chegava com marcas de batom, completamente embriagado, Selma havia perdido as esperanças.

Novamente, a vida de Selma estava sem rumo, e novamente, Selma sentia-se abandonada.

2

Eram 3:15 da manhã. Selma ainda não tinha conseguido dormir devido às cólicas, cada vez mais fortes, e também ao fato de que Edvaldo ainda não havia chego.

Decidiu então ir até o portão da casa para ver se por acaso Edvaldo estivesse desmaiado lá, como já fizera por diversas vezes antes. Mas ele não estava.

As contrações aumentaram, Selma já não aguentava as dores. Segurou-se ao portão para não cair, e nisso, olhou para baixo e viu que a bolsa havia estourado. Era Melissa.

Selma pediu socorro à um vizinho, que por sorte estava acordado, ouvindo rádio. Ele então disse à Selma que conhecia uma mulher que foi parteira de uma cidade próxima, e que naquele dia ela provavelmente estaria em casa.

Entrou rapidamente em contato com a parteira, que prontamente aceitou ajudar Selma no trabalho de parto.

A parteira levou cerca de uma hora para chegar, mas para Selma foi uma eternidade aquele momento de espera.