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OS DEDOS finos de Mike Wheeler acomodavam um cigarro mentolado. A fumaça do tabaco se misturava com a do café quente, deixado ao lado do computador. O brilho da tela era forte, refletia a fonte Arial tamanho doze nos olhos do cacheado que acomodava três palavras curtas, extremamente significativas. Não havia nada naquele documento além de um breve "Eu te amo", segredado pelos mesmos dedos que agora levavam o mentolado por entre seus lábios rachados pelo frio, tragando tão profundamente que quase tossiu, mas se obrigou a segurar pelo corpo de sua esposa que repousada não cama.

Mike segurava muitas coisas por sua esposa. Jane Hopper Wheeler, a jovem de cabelos esvoaçantes castanhos, aluna de artes que entrou na sua vida a dois anos e que era o orgulho de seu pai, que exibia com prazer como seu filho e sua nora formavam um belo casal. E eles formavam. Por isso avançaram de noivos a oficialmente marido e mulher à seis meses.

Faziam seis meses que Mike não falava com Will, também. Seu melhor amigo, confidente, o rapaz que amara pela primeira vez e ousava dizer que amaria para sempre. William Byers se despediu de Mike com um abraço e três palavras, no dia de seu casamento. Não fora necessário muito. Os olhos verdes brilhantes com uma tristeza notável enraizada e a forma como abraçado o corpo do castanho com tanta força deixaram explícito cada significado que aquelas três palavras tinham; "Eu te amo. Fica comigo. Vá. Vou sentir sua falta. É hora de terminar. Nós acabamos aqui. Seja feliz."

Mike Wheeler era engenheiro, mas sempre fora amante da escrita. Mas naquele momento não conseguia escrever nada para o rapaz de olhos verdes além de um breve e sentimental "eu te amo". Não havia nada que pudesse dizer que fosse explicar tão perfeitamente como ele se sentia, mas perto de toda sensação que Will havia o oferecido, sentia que precisava escrever mais, explicar mais, desmontaram mais.

And I know it's long gone and
That magic's not here no more
And I might be okay, but I'm not fine at all

Mike mal havia notado as lágrimas grossas banhando suas bochechas alvas e caindo no teclado, de forma que voltasse a encarar a tela do computador como se fosse lhe dar alguma resposta, alguma solução para a saudade latente que sentia do garoto. Da sua amizade talvez. Ou talvez fosse da mão quentinha que contrastava com a sua. Ou do cheiro de canela, dos dias nublados que passaram abraçados, nos livros antigos que o Byers lia pra si. Ou talvez fosse dos lábios que se grudavam aos seus com precisão nas madrugadas escondidas que passavam juntos. Da tez macia que tomava uma coloração avermelhada a cada vez que Michael o pressionava com firmeza.

Talvez fosse de tudo. E tudo significava tanto, que ainda que fosse confuso, Michael decidiu que aquele conto, ou melhor, aquela carta que nunca seria enviada, teria um pouco mais que três palavras.

CONTO DE TRÊS PALAVRAS | bylerOnde histórias criam vida. Descubra agora