Entre Pólvora e Sangue | único

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- Bom dia, querida. - Loid beijou a testa da esposa, que preparava o café da manhã.

- Ah, bom dia, Lottie. - Yor disse, rindo enquanto roubava um beijo a seu marido. - Confira se Anya já acordou para mim, por favor.

- Claro. - Deu um último abraço por trás à esposa, enquanto se dirigia ao quarto da filha. - Bom dia, princesa. - Viu que a garotinha estava acordada, rindo banguela. Seus olhos azuis como os do pai, refletiam o céu que os rodeava todas as horas do dia. Um céu radiante, feliz. Um céu perfeito. Seu cabelo negro feito carvão, idêntico ao de Yor, embora os da bebê tivessem alguns cachinhos, reluzia, brilhante. Aquela criança era, definitivamente, um milagre.

- Papa'! - Anya gritou, feliz, reconhecendo a voz do pai. Devido a algumas complicações na gravidez, Anya havia nascido com alguns problemas de visão. Consistiam em, basicamente, o prolongamento da nomeada visão de recém nascido. Bebês acabados de nascer não enxergam perfeitamente bem, e acabam desenvolvendo essa capacidade nos primeiros meses de vida. Anya fazia isso de forma mais lenta e, segundo alguns exames, a garota só iria ver perfeitamente aos sete anos de vida.

Perfeita, afinal.

- Sou eu, amor. - Beijou os pézinhos da filha, cobertos por uma meia que tinha um detalhe de um laço. - Vamos tomar o café da manhã.

- Papa'! Na 'dedela!

- É, na mamadeira. - Loid riu. Pegou a garotinha no colo, a ninando enquanto ia para a cozinha. A meio do caminho, tirou a chupeta da boca da filha. - Você já é um bebê grande, não precisa de chupeta.

- P'ecisa sim. - Anya disse, tentando tirar a chupeta da mão do pai, sem sucesso. Por isso, decidiu morder a mão do mesmo, que colocou a chupeta na boca da criança automaticamente.

- Ai! Caramba, Anya! Seus três dentes fazem horrores. - Yor gargalhou alto, vendo a situação do marido. - Tá rindo do quê, você aí? - Yor riu ainda mais alto, sentindo a dor na voz do esposo.

- Bom dia, filha. - Yor pegou Anya do colo de Loid, que se abaixou para dramatizar a mordida na mão. - Vem tomar a mamadeira, dentinhos. - Riu, beijando a bochecha da filha. - Você aí, deixa de drama e vem comer. - Apontou para o esposo, que obedeceu.

Nunca tiveram muitas condições, então a mesa era pequena, assim como todo o apartamento. Dois copos e uma mamadeira eram parte da louça que estava em cima da mesma. Yor e Loid se sentavam de frente um para o outro em cadeiras comuns, enquanto Anya estava numa cadeirinha, do lado do pai, bebendo sua mamadeira. Tinha um paninho enfiado em sua blusa, para que não a sujasse. Os Forgers batiam papo e riam como se tudo aquilo nunca pudesse acabar.

Mas podia.

- Bem, estou satisfeito. - Minutos depois, Loid informou, se levantando da mesa e tirando a filha da cadeirinha, a deixando livre para brincar. A viu engatinhar até à sala e se deitando no chão. - Tem certeza que não precisa de ajuda para arrumar a mesa, amor?

- Sim, fique tranquilo. Vá se arrumar, quero te ver fardado. - Loid riu, pegando a esposa pela cintura para um beijo.

- Está certo.

Loid foi para o quarto, colocando sua farda de policial e retornou à sala, se despedindo de suas garotas. Quando estava saindo, Yor o chamou.

- Amor, estou com um mau pressentimento. - Pegou nas mãos do homem e encostou sua testa à dele. - Me promete que vai voltar bem para casa.

- Claro que eu vou, amor. Eu volto sempre. - Beijou a esposa. - Preciso ir agora, linda. Te amo. - Loid disse, virando costas e fechando a porta do apartamento.

- Mas.. - Yor demorou a perceber a porta fechada. - Sempre tão apressado. - Foi para a sala, vendo Anya montando alguns blocos. - É, amor...somos só nós até às cinco da tarde.

- Mama'!

- Sou eu, bebê.

- Mama' linda.

- É o que seu pai diz. - Yor sorriu. - Só queria que você conhecesse nossas feições. - Pensou, para si mesma.

Horas depois, Yor estava vendo TV quando seu programa foi interrompido por uma notícia de última hora.

Informa-se a todos os homens de Westalis que Ostânia planeja invadir o país. Soubemos dessas informações em primeira mão a partir de esquemas contra o líder do partido nacional. Como tal, todos os homens acima dos dezoito anos e abaixo dos sessenta e cinco devem dirigir-se à central de alistamento mais próxima. HOJE. Servirão nosso país. Não faremos exceções.

O programa que Yor assistia voltou ao normal, como se ela não tivesse recebido a notícia que acabou com sua paz. Que rasgou seu coração no meio.

Ele não ia voltar para casa.


1 ano depois.

- Soldado Forger, você não está servindo para porra nenhuma! - Loid levou um tapa de seu tenente. - Nem parece que era policial. Você só está aqui há um ano e parece que perdeu tudo o que um dia aprendeu.

- Perdão, tenente.

- Estou cansado de perdões. É sua última chance. Ou você acorda, ou farei você dormir para sempre. - O homem apontou para a cerca elétrica, o que fez Loid arregalar os olhos. - A decisão é sua. - Saiu.

Loid tirou, do bolso de sua farda, uma foto de Yor e Anya, dormindo juntas na cama do casal. Loid havia tirado aquela foto depois de ter chegado do trabalho e as ter encontrado daquele jeito. - Eu mesmo já estaria dormindo para sempre. Mas vocês precisam de mim, eu preciso de vocês. - Beijou a foto. - Amo vocês.

- Ei, Loid! - Franky, um colega que tinha feito no alistamento, o chamou. - O tiroteio vai começar agora, Yuri foi buscar os coletes. Venha para cá.

Loid entrou no dormitório que correspondia à equipe dele. Yuri, seu cunhado, comandava esse grupo. Se dirigiram ao campo onde o tiroteio iria ocorrer.

Há bons minutos que tudo oque se ouvia ali eram tiros, bombas, e gritos. Sangue e pólvora estavam espalhados por todo o lado. A equipe de Loid derrotava com facilidade os demônios de Ostânia.

O tiroteio acabou, com uma vitória para Westalis. Loid estava se recolhendo e pronto a fumar um cigarro quando escuta um grito choroso muito conhecido.

- Loid! - Sua esposa corria entre pólvora e sangue, no campo onde Loid tinha assassinado mais de trinta homens. - Loid, meu Loid. - Abraçou o homem, que ainda estava sem palavras.

- Yor, o que..o que você está fazendo aqui?

- Eu fingi que você tinha me contratado como garota de programa. - Beijou o homem, com força, saudade. - Não me faça perguntas. Por favor, só me beija.

E Loid assim o fez.


A noite chegou, e Loid e Yor estavam deitados no boliche do mesmo, completamente abraçados, apaixonados, como estrelas numa pequena constelação.

Yor encarou as cicatrizes por todo o corpo do esposo, que agora estava de tronco vestido.

- Cristo, Loid. O que aconteceu com você?

- A guerra. - Yor sentia seus olhos pesados com lágrimas. - Anya lembra de mim? - O homem perguntou, perdido.

- Muito. Ela pergunta de você todos os dias, eu não estava aguentando mais. Eles dizem que Ostânia está se rendendo.

- É verdade.

- Você está quase voltando para casa.

- É. - Loid sentia lágrimas em seus olhos. - Ela...como está a visão dela?

- Ela só lembra de suas feições. Só de você. - Loid fez uma cara confusa. - Eu mostro uma foto sua, e ela te chama de papai. Mas se eu mostrar uma minha, ela não sabe dizer. - Yor desabafou. Loid finalmente chorou.

- Eu quero ir para casa, amor...eu não gosto desse lugar. - Yor ouviu seu marido desabafar.

- Você irá, eu vou arrumar um jeito. Só seja paciente. - Uniram as testas. - Eu vou te tirar daqui, nem que precise correr entre pólvora e sangue novamente.

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