Capítulo 1 - Loja de Antiguidades

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— Ei, Dante, se liga!

Ao longe, pôde apenas ver o amigo se movendo de maneira estranha em frente a um espelho, o que o fez largar o vaso que segurava de volta na estante com o cenho franzido, se aproximando.

— Eu sou muito alto. — Continuou Arthur, logo puxando Dante para mais perto para que pudesse ver também. — E agora você é baixinho!

O espelho distorcia os dois garotos em uma ilusão de ótica tão ridícula que chegava a ser cômica, o que fez com que Dante risse ao ver a imagem refletida de ambos, Arthur repetindo seu gesto.

— Você está me distraindo de novo do que a gente veio fazer, desse jeito a gente só vai sair dessa loja ano que vem. — Reclamou, mesmo que sua credibilidade fosse nula diante do sorriso remanescente em seu rosto.

— Eu espero que não, viu, esse lugar me dá arrepios, é tão...

— Exótico? — Arriscou diante da frase incompleta enquanto se afastavam do espelho e seguiam para um dos corredores abarrotados com bugigangas.

— Eu ia dizer bizarro, mas também funciona.

Arthur mais uma vez começou a mexer nas estantes conforme avançavam e continuavam a procurar, sem conseguir evitar a vontade de pegar as peças em mãos ao invés de só olhá-las, mesmo com as advertências de Dante por serem antiguidades possivelmente delicadas.

Enquanto Arthur se divertia com um relógio cheio de engrenagens expostas que tinha encontrado em uma dessas buscas, Dante suspirou por terem olhado mais um corredor sem acharem o que procuravam.

O plano era conseguirem uma máquina de escrever como um elemento visual para uma apresentação que teriam no final do ano. Se ainda funcionasse seria uma vantagem, mas o principal era o exterior estar minimamente conservado.

Dante tinha encontrado uma loja de antiguidades na cidade pela internet e sugeriu que fossem dar uma olhada ali, Arthur aceitou de prontidão, curioso por nunca ter ouvido falar sobre, mesmo conhecendo tão bem a região. Era um lugarzinho mal iluminado e rústico, o chão de madeira escura parecia ranger a cada passo que davam e o cheiro de poeira era sufocante. Olhando de fora parecia apenas uma casa antiga qualquer, com a tinta desbotada não ajudando em nada para destacar a placa que indicava que era realmente uma loja, Arthur já tinha passado diversas vezes pela vizinhança, mas nunca tinha notado o lugar.

A atendente de cabelos tingidos mal deu atenção para os dois quando chegaram e mal sabia dizer se tinham uma máquina de escrever ou não, não parecia das mais dedicadas ao seu trabalho ou sequer satisfeita com ele.

— Tá, isso não vai dar certo, tem coisa demais aqui... No próximo corredor é melhor a gente se dividir para ir mais rápido. — Dante instruiu, avançando sem esperar resposta.

Arthur, apesar de aceitar, se demorou um pouco mais ali, arrumando os ponteiros do relógio antes de deixá-lo no mesmo lugar de antes, seguindo os últimos passos para sair do corredor em um ritmo lento enquanto ainda olhava as estantes ao seu redor. Foi aí que notou algo que se destacava em uma das prateleiras mais altas, tendo que dar alguns pulinhos até alcançar.

Girou a câmera que tinha pego em sua mão para entender melhor o porquê de estar ali. Ela era pequena e contava com tons metálicos e couro preto, aparentemente comum, mas o que realmente era peculiar era o fato de não parecer nem um pouco antiga, e aquela era uma loja especificamente de antiguidades.

Continuou a avançar pelo corredor conforme ligava e analisava o aparelho. Queria testar se realmente funcionava, e a pequena tela na parte de trás do objeto já tinha iniciado quando chegou ao corredor de Dante. Aproveitou para apontar a lente para o amigo distraído e tirar uma foto. Sorriu ao perceber que ele nem sequer parecia ter notado e logo foi para a galeria da câmera para tentar ver a imagem, mas foi recebido por um símbolo de carregamento que não sumiu mesmo depois de alguns segundos. Arthur ficou encarando a tela fixamente esperando que a foto aparecesse, chegando até a cerrar os olhos como se isso ajudasse a ir mais rápido.

— Achou alguma coisa?

A voz de Dante o tirou de sua concentração com um susto, não tinha sequer notado o amigo se aproximar, mas ele já estava a menos de um passo de distância de si, olhando para a câmera em sua mão.

— Não... É só uma câmera velha, acho que nem funciona direit- — Interrompeu a si mesmo quando a tela finalmente parou de carregar, mostrando algo ainda mais bizarro do que toda aquela loja.

O corredor era idêntico, a posição e expressão de Dante eram as mesmas... Mas Arthur estava em seu lugar. Era como se a foto simplesmente tivesse trocado ambos de postos, como se alguém tivesse fotografado Arthur, não Dante. Nesse ponto o último já tinha se afastado de novo, desinteressado e focado demais em seu objetivo principal.

Arthur encarou a imagem com uma expressão confusa, tentando entender como aquilo sequer era possível, não fazia sentido algum. Começou a mexer mais uma vez na câmera, checando sua lente, funções, talvez fosse apenas alguma outra ilusão de ótica, mas...

Então finalmente notou a etiqueta gasta na parte inferior do aparelho.

"Uma lente capaz de mostrar os segredos mais ocultos, uma câmera que não revela uma fotografia qualquer, mas sim expõe a alma. Paixões secretas, desejos, uma chama forte demais para continuar escondida."

Parecia apenas uma descrição melodramática sem muito sentido pelo contexto, talvez apenas um texto fantasioso para vender um truque barato, aquilo apenas deixou Arthur mais confuso. Chegou a cogitar perguntar para Dante, mas algo o incomodava naquilo, atiçando mais sua curiosidade.

— Achei! — Escutou vindo do outro corredor, o que provavelmente indicava que logo sairiam daquela loja.

— Você usou meu dinheiro pra comprar uma câmera velha, é isso? — Questionou Kaiser, esperando uma boa explicação vinda de Arthur.

— Talvez. Depois eu te devolvo.

Já era o dia seguinte, Arthur tinha optado por comprar a câmera além da máquina de escrever, dando para Dante a desculpa de que seria útil para fazer as fotos do trabalho, mesmo que Kaiser já tivesse uma câmera melhor, fato que Dante não sabia.

Mais tarde o grupo, que contava com Dante, Arthur e Kaiser, se reuniria para decidir melhor quem ia ficar com cada função, isso na casa de Thiago, mesmo que ele não tivesse coisa alguma a ver com o projeto, tudo pela desculpa de assistirem um filme todos juntos depois.

— Pra que? Não é como se você gostasse de fotografia.

— Eu gosto sim. — Fechou o armário depois de pegar o livro para a próxima aula, dando de cara com o olhar acusador de Kaiser. — Tá, talvez não tanto. Mas não é uma câmera qualquer.

— Não, é uma bem velha e provavelmente com uma péssima qualidade de imagem.

— Vai mais cedo para a casa do Thiago, antes do Dante chegar, daí eu te mostro.

Os dois começaram a seguir pelo corredor, faltando pouco para o início da próxima aula.

— E esse mistério todo é pra que?

— Você não vai acreditar em mim se não ver.

— Só fala, é uma câmera, não a paz mundial em uma caixa.

— Ela é mágica.

Kaiser demorou alguns segundos para processar a resposta, rindo de leve apenas para não deixar Arthur sem graça, já que na sua cabeça era só uma piada ruim.

— O que? Ela coloca um filtro do instagram de qualidade questionável automaticamente?

— Qual é, Kai, eu tô falando sério! Eu disse que você não ia acreditar!

— Como assim é mágica, Arthur? — Questionou, claramente duvidando, mas foi interrompido pelo sinal ecoando pelos corredores do colégio, sinalizando o início da aula.

Depois eu mostro, aparece lá mais cedo, só uns vinte minutinhos.

When disco plays our tune (Danthur)Onde histórias criam vida. Descubra agora