Haviam guerras.
Bom, guerras sempre existiram por ali, não era nenhuma novidade. Mas 23 anos após os anos 2000 daquela Era, a Terra passava por um fenômeno de negação de seus ideais construídos em séculos de captação de conhecimento. Antes muito científicos e racionais, agora tendo que convencer multidões que o próprio planeta não era plano e de que os Dinossauros realmente haviam habitado aquelas bandas há milhões de anos.
Sabemos que devem estar rindo, nós entendemos o porquê. Infelizmente, por causa dessas ocorrências, pontuais conflitos foram estimulados pelas autoridades, cujos tentáculos espreitavam sigilosamente que pouco se pensasse em relação a coisa alguma, caminhando para uma estratégica decadência da própria existência - pelo andar das circunstâncias, o plano que era inegavelmente estúpido estava sendo inacreditavelmente eficaz.
Agora devem estar questionando essa veracidade; também entendemos o porquê. Pensem em todos os pontos históricos que são indiscutíveis: evolução das espécies, Império Romano, Inquisição, escravidão, holocausto, extermínio indígena, Hiroshima e Nagasaki, corrida nuclear, racismo, Homem na Lua, clonagem, célula-tronco, cura do HIV, direitos das mulheres, direitos dos LGBTs, Aquecimento Global, Fome na África, poluição, extinção de espécimes... Para agora as soberanias em diversas nações passarem a vetar suas autenticidades. "Hmm, será mesmo que houver perseguição religiosa no século XI? Hmm, duvido que bombas atômicas atingiram e destruíram duas cidades japonesas, afinal, como elas existem atualmente? Hmmm, se existe Aquecimento Global, por que não estamos morrendo de calor?" - sim, muitas dessas especulações foram lançadas por chefes de estados em rede nacional e espalhadas por uma malha de apoiadores para massificar as informações como se fossem verdadeiras.
Embora fosse um plano incongruente, ele dera certo, já que depois dos anos 2020 não só as pessoas estavam bastante seguras com suas novas opiniões, como estavam dispostas (graças aos incentivos oficiais) a impor os "dados" como legítimos a qualquer opositor que encontrassem no caminho.
Como se não bastasse a erradicação dos acontecimentos históricos, rolava simultaneamente uma silenciosa aniquilação da população mais carente, retirando seus direitos, obrigando a tomarem vacinas "experimentais" de controle de fome (que mais tarde foi provado que eram, claro, aplicações de vírus mortais mascaradas de simples gripes) e detenções aleatórias; por outro lado, os Governos engordavam seus fundos gerenciais e ampliavam privilégios das classes dominadoras (as mesmas que passaram a acreditar e espalhar as "novas verdades"). Além da comunidade necessitada, as castas científicas, humanas e artísticas, principais defensoras do que um dia foi chamado de "direitos humanos" também passaram a sofrer perseguições, encarceramentos por "traição à pátria" e repentinos "desaparecimentos".
Foi partindo deste cenário distópico que a inevitável a grande guerra de 2023 estava sendo alimentada a colheradas de ódio e percepção nula da realidade, cujo estopim foi o sequestro, estupro e morte das 14 principais diplomatas patronas de ciências sociais nos países subdesenvolvidos por membros conservadores da União Europeia. Congressos, Câmaras e as ruas foram palco de uma batalha em vários locais do Planeta, onde o lado do opressor tinha uma severa vantagem armamentista.
Cidades foram lavadas em sangue. Pilhas de mortos. Bombas e armas biológicas foram usadas a rodo, sem distinção de locais - alvos como escolas, faculdades, hospitais, distritos indigentes e parques foram praticamente escolhidos a dedo para serem dizimados.
Ninguém foi poupado, nada foi preservado.
Eram os últimos suspiros de algo que um dia (talvez) fora civilizado e solidário, algo que um dia soube compartilhar amor pelo próximo e pelo ambiente que habitava, algo que um dia soube respeitar as particularidades da própria jornada existencial naquele mundo e defender os direitos de todos de viverem sob o mesmo sol.
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Unimundos e os contos do fim de tudo
Short StorySe houvesse uma única maneira de catalogar todas as formas de como o mundo chegaria ao fim, seria através de contos. Aqui há sete amostras - ora poética, ora impiedosa - dos últimos (diferentes) passos dados pela Humanidade em seu planeta azul.