Geleira do Tempo

Você bem que podia vir comigo

Você bem que podia vir comigo
Para além do final dessa rua
O outro lado da cidade
Ou algo parecido

Heloísa tinha 17 anos quando verdadeiramente se entregou ao amor, amou e se deixou ser amada por Leônidas Lobato.

A jovem fugia do casarão e de tudo que ele representava naquela hora, a lua brilhava no céu deixando a noite iluminada. Não se importava que estava tarde, que a família estava jantanto, não queria passar nem mais um minuto sequer ao lado do cunhado.

Deixava que seus pés a guiassem para o lago, mas parou ao ver um jovem sentado no trapiche, pensou em retornar ao engenho, mas o que encontraria a fez mudar de ideia e caminhou com cautela

-Invadir propriedade privada é crime, moço - disse quando estava perto suficiente e o viu se levantar, a olhava envergonhado e Heloísa podia jurar que a lua iluminava um rastro de lágrimas em seu rosto

-Me desculpe, estou hospedado em uma fazenda de um conhecido aqui perto, sai para cavalgar um pouco e quando percebi, estava aqui. Eu vou embora - se virou para a direção que o cavalo pastava tranquilamente, mas Heloísa estendeu a mão o impedindo.

-Não precisa, o trapiche é grande o suficiente e arrisco dizer que o senhor não é perigoso

-Não! Não lhe farei mal algum - garantiu rapidamente e voltou a se sentar na ponta com a moça ao seu lado

Era tão linda, o longo cabelo castanho lhe emoldurava o rosto e agora mais perto conseguia enxergar melhor o tom castanho de seus olhos, assim como Heloísa reparava o verde dos seus. Era encantadora, ele pensava. Era de tirar o fôlego, ela pensava.

-Heloísa Camargo - disse com um leve sorriso no rosto como se pudesse ler seus pensamentos

-Leônidas Lobato - riu levemente e estendeu a mão que foi aceita, o toque se prolongou por mais alguns segundos do que deveria antes de Heloísa puxar sua mão delicadamente e levar até o vestido alisando os amassados inexistentes
-O que te traz pra cá, Leônidas?

-Já sentiu que precisava fugir para não deixar que um sentimento ruim lhe dominasse o peito? - a olhou e não entendia como estava desabafando com uma completa desconhecida, mas Heloísa tinha algo que o fazia se sentir seguro e as palavras simplesmente saíam

-Como quem corre atrás de paz de espírito? - riu e o viu confirmar com a cabeça sorrindo levemente - Sei sim, moço. O que acha que faço essa hora no trapiche?

-Eu gostei daqui, parece que nenhum problema pode nos alcançar - Heloísa confirmou com a cabeça e se olharam em silêncio, com se tentassem desvendar os segredos pelos olhares

-Heloísa! - a mais nova desviou o olhar ao ouvir a voz de Manuela

-Uma pena que só parece, porque eles podem - revirou os olhos se levantando - Foi um prazer, Leônidas. Seria uma pena se precisasse fugir dos seus problemas amanhã a tarde

-O prazer foi todo meu, Heloísa, realmente seria uma pena - riu levemente com o convite disfarçado da moça - Tenha uma boa noite

-Você também - sorriu mais uma vez e andou rapidamente na direção que haviam chamado-a antes - Já estou indo, Manuela!

~•~

13 anos depois