Cartas Em Desespero

Atos e Lembranças

" Minha querida,

Pequenos atos trazem significantes lembranças.

Esta frase ficou impregnada em meus pensamentos, nas quais penso em algumas coisas a respeito dela. Pode parecer bobagem, mais eu penso se, essas lembranças forem algo que não desejo lembrar, ou algo que se dá como parte de meus intrusos pensamentos.
Refleti sobre ela pela primeira vez, quando estava num supermercado, especificamente na ala das folhas e especiarias em geral. Estava com meus cabelos soltos, um vestido de cor magenta, um simples chinelo, e mais nenhum adereço. Também estava procurando alface e olhando ao redor daquele vasto corredor vivo pela coloração da diversidade dos vegetais, com uma expressão padrão. Vazia. Mais não de um jeito ruim, apenas por estar perdida em meus pensamentos. Sei que são descrições desnecessárias, porém eu quero que saiba detalhadamente o que ocorreu pois eu quero que imagine tal cena, que me imagine neste local, como uma desculpa de poder ver meu rosto novamente, que eu espero que deseja ve-lo tanto quanto eu anseio ver o seu.
Perdida no vazio da minha mente, trombo com uma mulher de idade avançada. Utilizava óculos que triplicavam o tamanho de seus olhos, um blusa rosa florida e uma calça escura com chinelos de dedo de cor bege. Tinha cabelos pretos e usava um batom de cor roxo-escuro. Imediatamente me desculpei com a senhorinha. Mas que vergonha, minha querida! A velinha ajeitou seus óculos, me olhou, e sorriu. E eu sorri de volta, sem entender a sua atitude, mas pensando bem, é bem melhor do que ela ter gastado o que restava da voz de suas velhas cordas vocais, para gritar o quão irresponsável eu fui, chamando atenção de todos ao redor. Contudo, quando me dei conta, ela pegou a sua mão de pele enrugada e acariciou o lado direito de minha bochecha com o mesmo sorriso estampado. Naquela hora, minha amada, eu entrei em transe. Não entendia absolutamente nada o que aconteceu. Tente imaginar, você estar num supermercado e trombar com uma senhorinha que reage a suas desculpas com carícias na sua bochecha direita? Eu fiquei lá, sem saber como reagir, depois de um tempo ela se afastou e foi para a próxima ala.
Agora, antes que me pergunte o que isso tem haver com a frase que tinha te falado, saiba que tem haver com você. Tudo o que tem acontecido, tem haver com você e tem sido assim desde que um sentimento extremamente peculiar impregnou-se em meu corpo. A cada lembrança que se remetia a sua pessoa, uma dor imensa se prende ao meu peito, uma dor agonizante, que te faz contorcer de desespero, e eu tenho certeza de que não é física. Lhe garanto que não possuo nenhum historico de inflamação torácica. Acredite se quiser eu já fui a um especialista antes e ele disse que não apresento nenhum tipo de inflamação física, o que achei estranho no começo. Até que aos poucos fui me familiarizando com essa dor. Não deixa de ser totalmente agonizante, mas também é algo que eu venho lidando. Contudo, espero que essa dor se dissipe, e creio que tal solução seria você querida.
Pois agora eu lhe digo que, ao afastar daquela doce velhinha, tive uma vaga lembrança de quando um mão muito mais macia e jovem acariciava a mesma região da minha bochecha, com um sorriso radiante no rosto. Até que aquela dor apareceu novamente. Abaixei a cabeça e senti rios inundando meus olhos me cegando e embaçando tudo o que antes eu poderia enxergar, então os fechei e senti uma densa gota d'água ser liberada, seguida de uma maré de gotículas sendo liberadas também através dos meu olhos.

Minha dócil menina, eu não me lembro de como você é, dos momentos em que ficamos lado a lado, mais eu só te peço que de algum jeito, me cure. E tire essa angústia torturante que me importuna todos os dias. Até porquê não tenho a capacidade de classificar aquela lembrança como algo bom ou ruim. Talvez seria mais para o desagradável devido o meu comportamento em relação á ela. Não reconheço esse meu problema, tampouco de sua origem. Só quero que ele suma de minha vida.

E conto com sua ajuda com isso.

Atenciosamente: Seu amor perdido"