Prólogo

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Francine Marshall

      Fazer o bem às vezes significa que temos de tomar decisões difíceis, que podem machucar muita gente. Eu me arrependeria pelo resto da minha vida se não tivesse levado o que nos restou do William, a sua princesinha.
    Minha neta será feliz por estar com a família certa. Ela é tão pequenina, tem apenas três dias de vida e merece todo o amor, todo o carinho e um lugar adequado para viver, não naquela espelunca com cheiro de pobres, cheio de mofo e amianto. Na nossa família ela terá o cuidado que merece, a educação que precisa e será uma mulher bem sucedida. Aquela família desgraçada nunca mais a verá, nunca mais terá notícias dela.
     — Eu queria que William podesse ver a sua filha. — Contenho as minhas lágrimas. Ainda é difícil aceitar que ele se foi.
     — A culpa foi nossa, Francine. Mas vamos corrigir isso e cuidar do legado dele. — Augustus apoia a mão no meu joelho.
     — Nossos filhos não podem saber da verdade. Vamos contar a nossa história, a que todos irão acreditar e que deve fazer mais sentido.
     — Não se preocupe. Aqueles vermes não vão nos procurar novamente e se o fizerem, a justiça estará do nosso lado. Temos os melhores advogados e todos vão acreditar na nossa história. Somos os Marshall.
     Ele tem razão.
     Ninguém vai acreditar neles.
     — Tem razão. Mas tenho a certeza que nunca mais veremos aquela família novamente.
     — Assim espero, querida.
    Sanchez, um dos seguranças vem abrir a porta do carro para nós. Meu marido desce primeiro, para poder ajudar com a nossa neta. Recebemos a atenção de todos, dos seguranças, jardineiros, empregados, que estranham a bebé. Seguimos para dentro e somos recebidos por Grayson, o mordomo.
     — Sejam bem-vindos, senhor e senhora Marshall. — Grayson sorri para o mais novo membro da família.
     — Obrigado, Grayson. Chame os nossos filhos, por favor. — Augustus ordena. — É urgente.
     — Sim, senhor. — Ele sobe os degraus sem pressa.
     Recebo a herdeira de William e nos dirigimos para a sala de estar, onde acontecem todas as reuniões da família. Meu marido e eu já tomamos uma decisão quanto ao futuro da filha do William, e esperamos que todos estejam de acordo, que ao menos colaborem. Acho que é isso que nosso falecido filho iria querer.
     August, nosso primeiro filho, é o primeiro a descer com a sua esposa Cecil, que ainda não suporto. Michael vem depois, ainda deprimido. A morte de William acabou com todos nós, mas Michael está mais fechado, quase não fala com ninguém, espero que isso passe com o tempo, talvez estar com um pedacinho do seu irmão ajude.
     — Porquê demoraram... — August olha para a bebé. — Essa é a filha do William?
     — Sim. E eu achei que já que você e Cecil estão casados, poderiam tomar conta dela. — Meu marido diz.
     Nosso primogénito olha para a criança nos meus braços. — Mas... eu achei que a namorada do William fosse negra.
     — Ela é. Tivemos sorte que ela nasceu como nós e não como eles. — Digo. — Mas aquela família também ficou desiludida. Eles não queriam uma neta branca. E queriam nos dar a bebé de graça, mas a mãe dela pediu cinco milhões de dólares.
     Michael olha para nós com expressão de nojo. — Então, venderam como se fosse uma coisa?
    — Nós pagamos porque queremos que ela tenha uma vida melhor e também para que eles não nos procurem mais.— Respondo.
     — É uma bela história. — Cecil diz.— Mas eu não vou cuidar do bebé de outra pessoa. Poupe-me o trabalho.
     — Bebé do meu filho. — Digo, furiosa. — É da nossa família.
     — Bem, pode até ser branca, mas continua com sangue de pretos, então eu dispenso também. — August se junta à mulher.
     Michael dá um passo para frente. — Eu posso segurar ela?
     — Claro. — Dou a pequenina para meu filho.
     — Ela é a filha do William. Do nosso irmãozinho. — Michael chora. — Eu sei que não sou casado, mas eu posso tentar? Posso cuidar dela?
     — Tem a certeza? — Augustus pergunta.
     — Já que August e Cecil se recusam a fazer isso, eu faço. E sei que terei a sua ajuda, não é, mãe?
     — Claro que sim, filho.
   — Boa sorte com isso. — August cruza os braços, e olha para o irmão como se fosse louco.
    — E ela já tem um nome? — Michael pergunta.
    — Não. Não tivemos tempo de escolher um ainda.
    Nosso filho sorri. — Eu lembro que quando William contou que seria pai, ele queria que se chamasse Davie ou Isabella. Então, ela vai se chamar Isabella.

O que realmente aconteceu

Mariza Ray

     William e eu vivemos um romance proibido. Nossos pais repudiavam uns aos outros e segundo eles, nós éramos demasiado novos para viver um romance. Tínhamos sonhos, nós nos amavamos e decidimos que iríamos cuidar da nossa filha juntos, mesmo que tivesse apenas dezasseis anos e ele dezassete, estávamos dispostos a enfrentar o mundo.
     Nossos pais descobriram sobre a gravidez, mas felizmente, já era tarde para nos obrigarem a abortar. Conseguimos esconder por algum tempo porque a minha mãe estava sempre ocupada com sua irmã doente, e meu pai não se preocupava com nada. Então, quando tudo foi descoberto, nossos pais disseram que o bebé seria dado para a adoção. Nós não estávamos de acordo, por isso William tinha um plano para que fugissemos.
     Infelizmente, ele teve uma briga muito feia com os seus pais e ligou para mim, adiantando o dia em que iríamos embora e teve um terrível acidente. William não sobreviveu, e me deixou quando faltavam dois meses para nossa filha nascer. Foi doloroso, não sei como consegui, mas trouxe a minha filha ao mundo apesar de todos aqueles acontecimentos.
     Achei que estaria tudo bem quando a senhora Marshall desistiu da adoção porque nossa filha era um jeito de lembrar do William. Mas não esperava que meus pais rejeitassem a própria neta e pedissem cinco milhões de dólares para ficar com ela.
     Eu estava dormindo como uma pedra, quando acordei, percebi que havia uma mala de dinheiro no lugar da minha filha. Eles planejaram aquilo quando viram que a minha menina nasceu branca.
     Eu me recusei a viver com os seres que venderam a minha filha. Fui embora, procurei outro lugar para ficar. Fiquei com a minha tia enquanto meus pais gastavam os milhões dos Marshall. Eu não quis nenhum centavo porque foi com aquele dinheiro que tiraram a minha filha de mim.
     Eu tentei pedir ajuda, mas de nada valeu. Fui para a polícia e meus pais disseram que eu era apenas uma criança, que não sabia de nada e que eles apenas deram a filha para a família Marshall que tinha melhores condições para ficar com a guarda da menina.
     Ao longo dos anos, eu comecei a perceber como o mundo realmente é. Procurei advogados, tentei buscar ajuda, mas de nada serviu porque eu sou mulher, pobre e negra. Um advogado disse que não valia a pena porque eu não iria derrotar os Marshall. Pelo menos foi sincero quando disse:
     — Eles são poderosos, têm muito dinheiro e muita influência. A menina é branca, você é preta, pobre, desempregada, nem tem onde cair morta. Você teria que provar que é sua filha, mas mesmo que o fizesse, e ganhasse o caso,  o que nunca vai acontecer nem numa outra vida, o juiz não daria a guarda para você porque você não tem condições para cuidar de uma criança.
     Vários advogados negaram o meu caso, também não tinha dinheiro para pagar um bom advogado. E não sabia onde os Marshall estavam porque eles se mudaram. Não sabia onde.
     Comecei a trabalhar no duro para conseguir dinheiro, guardei as minhas economias para um advogado, mas nunca foi o suficiente. Fui roubada também, então tive que começar do zero.
     Todos esses treze anos, minha vida se resumiu em procurar ajuda na polícia e em advogados, trabalhar arduamente para ganhar dinheiro e procurar em jornais, qualquer lugar para encontrar o paradeiro da minha filha.
     E foi então que eu vi numa revista os olhos e os sorrisos que me faziam lembrar de William. Eram os irmãos dele num evento de caridade de uma empresa chamada Empire of Diamonds.
     E eu percebi que aquilo era um sinal.

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