Introdução

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OS SONHOS ABREM AS JANELAS DA INTELIGÊNCIA
Quem consegue decifrar o ser humano?
  Um paciente culto me disse certa vez que era capaz de enfrentar um cachorro bravio, mas morria de medo das borboletas. Quais são os riscos reais que uma borboleta produz?
  Nenhum, a não ser encantar os olhos com sua beleza. O conflito desse paciente não são os perigos reais exteriores, mas os perigos imaginários. Seu drama não é gerado pela borboleta física, mas pela borboleta psicológica registrada de maneira distorcida nos solos da sua memória.
  Sua mae lhe disse na infância que, se tocasse numa borboleta com as mãos e as colocasse nos olhos, ficaria cego. Quando o menino tocou numa borboleta, sua mãe gritou. O grito de alerta cruzou com a imagem da borboleta. Ambos os estímulos foram registrados no mesmo lócus do inconsciente, na mesma janela da memória. A belíssima e inofensiva borboleta tornou-se um monstro.
  Durante toda a infância, quando esse paciente enxergava uma imagem de uma borboleta bailando graciosamente no ar, ele detonava um gatilho psíquico que abria em milésimos de segundos a janela da memória em que a imagem doentia estava registrada. A borboleta imaginária era libertada do seu inconsciente, assaltava-lhe a emoção e roubava-lhe a tranquilidade.
  O grande problema é que todas as vezes em que ele tiver uma experiência angustiante diante de borboletas, ela será registrada novamente, contaminando inúmeras outras janelas da memória. Quanto mais áreas doentias estiverem comprometidas em seu inconsciente, mais ele irá reagir sem racionalidade. Se esse paciente não reescrever a sua história, poderá tornar-se uma pessoa fóbica, frágil, sem capacidade de lutar pelos seus sonhos e com tendência a inúmeros outros tipos de medos.
  O mecanismo que acabamos de descrever é um dos segredos da psicologia. Demoramos mais de um século para compreendê-lo. Por meio da teoria da Inteligência Multifocal estamos desvendando alguns fenômenos contidos nos bastidores da nossa mente que afetam todo o processo de construção de pensamentos e geram os traumas psíquicos. Não é a realidade concreta de um objeto que importa para nossa personalidade, mas a realidade interpretada, registrada.
  Para alguns, um elevador é um lugar de passeio; para outros, um cubículo sem ar. Para uns, falar em publico é uma aventura; para outros, um martírio que obstrui a inteligência. Para uns, as derrotas são lições de vida; para outros, um sufocante sentimento de culpa. Para uns, o desconhecido é um jardim; para outros, uma fonte de pavor. Para uns, uma perda é uma dor insuportável; para outros, um golpe que lapida o diamante da emoção.
  Todos criamos monstros que dilaceram sonhos
  Quantos monstros imaginários foram arquivados nos subsolos da sua mente furtando seu prazer de viver e dilacerando seus sonhos? Todos temos monstros escondidos por detrás da nossa gentileza e serenidade.
  A maneira como enfrentamos as rejeições, decepções, erros, perdas, sentimentos de culpa, conflitos nos relacionamentos, críticas e crises profissionais, pode gerar maturidade ou angústia, segurança ou traumas, líderes ou vítimas. Alguns momentos geram conflitos que mudaram nossas vidas, ainda que não percebamos.
  Algumas pessoas não se levantaram mais depois de certas derrotas. Outras nunca mais tiveram coragem de olhar para o horizonte com esperança depois de suas perdas. Pessoas sensíveis foram encarceradas pela culpa, tornaram-se reféns do seu passado depois de cometerem certas falhas. A culpa as asfixiou.
  Alguns jovens extrovertidos perderam para sempre sua autoestima depois que foram humilhados publicamente. Outros perderam a primavera da vida porque foram rejeitados por seus defeitos físicos ou por não terem um corpo segundo o padrão doentio de beleza ditado pela mídia.
  Alguns adultos nunca mais se levantaram depois de atravessar uma grande crise financeira. Mulheres e homens perderam o romantismo depois de fracassarem em seus relacionamentos afetivos, após terem sido traídos, incompreendidos, feridos ou não amados.
  Filhos perderam a vivacidade nos olhos depois que um dos pais fechou os olhos para a existência. Sentiram-se sós no meio da multidão. Crianças perderam sua ingenuidade depois da separação traumática dos pais. Foram vítimas inocentes de uma guerra que nunca entenderam. Trocaram as brincadeiras pelo choro oculto e cálido.
  A complexidade da mente humana nos faz transformar uma borboleta num dinossauro, uma decepção num desastre emocional, um ambiente fechado num cubículo sem ar, um sintoma físico num prenúncio da morte, um fracasso num objeto de vergonha.
  Precisamos resolver nossos monstros secretos, nossas feridas clandestinas, nossa insanidade oculta (Foucault,1998). Não podemos nunca esquecer que os sonhos, a motivação, o desejo de ser livre nos ajudam a superar esses monstros, vencê-los e utilizá-los como servos da nossa inteligência. Não tenha medo da dor, tenha medo de não enfrentá-la, criticá-la, usá-la.
Todos somos complexos e complicados
  Na minha trajetória como cientista da psicologia e psiquiatria clínico eu me convenci de que nada é tão lógico quanto o ser humano e nada é tão contraditório quanto ele. Podemos criar no teatro das nossas mentes os extremos: o drama e a sátira, o pânico e o sorriso, a força e a fragilidade.
  Somos tão criativos que, quando não temos problemas, nós os inventamos. Alguns são especialistas em sofrer por coisas que eles mesmos criaram. Outros têm motivos para serem alegres, mas mendigam o prazer. Possuem grandes depósitos nos bancos, mas estão endividado no âmago do seu ser. São ansiosos e estressados.
  Gandhi comentou com sensibilidade: "O que pensais, passais a ser." O que pensamos afeta a emoção, infecta a memória e gera as misérias psíquicas. Nunca ouve tantos miseráveis em carros importados, trabalhando em grandes escritórios, viajando de avião, saindo nas capas de revistas. Quem é escravo dos seus pensamentos não é livre para sonhar.
  Ser complicado não é um privilégio de uma pessoa, de um povo, de um grupo social, de uma faixa etária. Adultos e crianças, psiquiatras e pacientes, intelectuais e alunos são complicados, têm momentos que se irritam por pequenas coisas, sofrem desnecessariamente. Uns mais, outros menos.
  É impossível estar livre de contradições e incoerências. Por quê? Porque temos uma complexa emoção que influência a lógica dos pensamentos, as reações e atitudes humanas.
  Qualquer pessoa que quer ser perfeita demais estará apta para ser um computador, mas não uma pessoa completa. Não devemos ficar aborrecidos por sermos tão complicados. Se, por um lado, nossas dores de cabeça surgem no campo que explora a lógica, as maravilhas da nossa inteligência também surgem nessa esfera.
  Nossa capacidade de amar, tolerar, brincar, criar, intuir, sonhar são algumas das maravilhas que surgem numa esfera que ultrapassa os limites da razão. Todas as pessoas muito racionais amam menos e sonham pouco. Os sensíveis sofrem mais, mas amam mais e sonham mais.
           Inspiração e Transpiração
  Nem sempre os sonhos são definidos e bem organizados no teatro da mente. Às vezes nascem como pequenos traçados, simples esboços, idéias vagas que vão se desenhando e tomando forma ao longa da vida. Todas as grandes mudanças na humanidade no campo social, político, emocional, científico, tecnológico e espiritual surgiram por causa dos grandes sonhos.
  Para ter grandes sonhos e produzir importantes mudanças na sociedade não é preciso ter características genéticas superiores ou privilégios dos gênios.
  Thomas Hedison acreditava que as conquistas humanas compõem-se de 1% de inspiração e 99% de transpiração. O inventor da "luz exterior" teve uma luz interior. Acredito que seu princípio tem fundamento, mas precisa de correção.
  Creio que as conquistas dependem de 50% de inspiração, criatividade e sonhos, e 50% de disciplina, trabalho árduo e determinação. São duas pernas que devem andar juntas. Uma depende da outra, caso contrário nossos projetos tornaram-se miragens, nossas metas não se concretizam.
  Quem quer atingir a excelência nos seus estudos, nas suas relações afetivas e na sua profissão precisa libertar a criatividade para ser um sonhador e libertar a coragem para ser um empreendedor. Estes dois pilares contribuem para formar o caráter de um líder.
  Os segredos dos que mudaram a história
  A maior genialidade não é aquela que vem da carga genética nem a que é produzida pela cultura acadêmica, mas a que é construída nos vales dos medos, no deserto das dificuldades, nos invernos da existência, no mercado dos desafios.
  Muitos sonhadores desenvolveram áreas nobres da sua inteligência, áreas que todos têm condições de desenvolver. Eles atravessam turbulência quase que insuperáveis. Suportaram pressões que poucos tolerariam. Viveram dias ansiosos, sentiram-se pequenos diante dos obstáculos.
  Alguns foram chamados de loucos, outros, de tolos. Zombaram de alguns, outros foram discriminados. Tinham todos os motivos para desistir dos seus sonhos e, em certos momentos, até da própria vida. Mas não desistiram. Quais foram os seus segredos?
  Eles fizeram da vida uma aventura. Não foram aprisionados pela rotina. Claro, é impossível escapar da rotina. Em muitos momentos ela é um calmante necessário. Mas esse sonhadores passaram pelo menos 10% do seu tempo criando, inventando, descobrindo.
  Tiveram uma visão panorâmica da existência em tempo nublado. Foram empreendedores, estrategistas, persuasivos, amigos do otimismo. Foram sociáveis, observadores, analíticos, críticos.
  Fizeram escolhas, traçaram metas e as executavam com paciência. Para o filósofo Kant, "a paciência é amarga, mas seus frutos são doces". A paciência é o diamante da personalidade. Muitos discorrem sobre ela, poucos são seus amantes. Mas os que a conquistam colherão os mais excelentes frutos.
  Para Plutarco, " a paciência tem mais poder do que a força". Não meça um ser humano pelo seu poder político e financeiro. Meça-o pela grandeza dos seus sonhos e pela paciência em executá-los. Mas a paciência precisa de outro remo para conduzir o barco dos sonhos. Qual?
  Precisa da coragem para correr riscos. Os maiores riscos para quem sonha são as pedras no caminho. Tropeçamos nas pequenas pedras e não nas grandes montanhas. Quem é controlado pelos riscos e pelos perigos das jornadas não tem resistência emocional. Cedo recua. Você tem essa resistência?
  Epicuro acreditava que “os grandes navegadores deviam sua reputação ao s temporais e às tempestades”. Se você tiver medo das tempestades, nunca navegara pelos mares desconhecidos. Jamais consquitará outros continentes.
  Os que transformam seus sonhos em realidade aprenderam a ser líderes de si mesmos para depois liderar o mundo que os cercava. Tinham uma ambição positiva, queriam transformar a sua sociedade, a sua empresa, seu espaço afetivo. Eram pessoas inconformadas tanto com os problemas sociais quanto com suas mazelas psíquicas.
  Seus sonhos se tornaram realidade porque ganharam um combustível emocional que jamais se apagou, mesmo ao atravessarem chuvas torrenciais. Qual é esse combustível? A paixão pela vida, o amor pela humanidade. Foram dominados por um desejo incontrolável de serem úteis para os outros. Quem vive para si mesmo não tem raízes internas.
  É possível destruir o sonho de um ser humano quando ele sonha para si, mas é impossível destruir seu sonho quando ele sonha para os outros, a não ser que lhe tirem a vida. Os ditadores jamais destruíram os sonhos dos que sonharam com a liberdade do seu povo. Morreram os ditadores, enferrujaram-se as armas, mas não se destruíram os sonhos de quem ama ser livre.
   Garimpando ouro nos escombros das derrotas
Farei neste livro uma análise aberta, livre e crítica sobre o funcionamento da mente de quatro personagens que construíram belíssimos sonhos e que fizeram outros sonharem. Escolhi quatro personagens apaixonados pela humanidade. E que passaram por momentos em que foram desacreditados, excluídos, feridos, considerados loucos, tolos, audaciosos.
  Eles atravessaram o território do medo e escalaram os penhascos das dificuldades. Tombaram pelo caminho, feriram-se, mas continuaram caminhando quando muitos não acreditavam que se levantariam.
  Tinham tudo para não dar certo, mas brilharam. Não eram especiais por fora, mas garimparam pedras preciosas nas ruínas fos seus traumas. Você sabe garimpar ouro em seus conflitos?
  A maioria dos adultos da atualidade teria desistido dos seus sonhos e adoecido psiquicamente se tivesse vivido uma pequena parte dos transtornos que esses personagens suportaram.
  Muitos jovens recuariam diante de obstáculos semelhantes. A juventude esta despreparada para viver nessa estressante sociedade. Os jevens precisam desenvolver urgentemente resistência intelectual e emocional para suportar perdas, derrotas, humilhações, injustiças.
  O que diferencia os jovens que fracassam dos que têm sucesso não é a cultura acadêmica, mas a capacidade de superação das adversidades da vida.
  Estudaremos as reações desses quatro personagens diante das suas derrotas, veremos sua capacidade de superação, sua competência para serem líderes de si mesmos, sua coragem para correrem riscos, seus talentos intelectuais, sua intuição, sua visão multifocal da realidade.
  Muitos outros personagens mereciam ser descritos aqui, como Buda, Confúcio, Dostoiévski, Kant, Montaigne, John Kennedy, Gandhi, Thomas Edison, Einstein, porque foram grandes sonhadores. Por falta de espaço, não os analisarei, mas usarei as idéias de vários deles para me ajudarem na árdua tarefa de interpretação.
  Creio que ao analisar  a mente dos quatro personagens escolhidos estarei dissecando alguns princípios fundamentais que alicerçaram a inteligências dos grandes sonhadores de todas as eras. Teremos uma visão global (Morin, 2000) sobre a formação de pensadores.
  As histórias que reconstruírem são baseadas em fatos reais. Não tenho a intenção de escrever uma biografia dos quatro personagens, portanto raramente mencionarei datas. Seguirei apenas uma sequência dos fatos mais importantes para minha interpretação.
  O passado é uma cortina de vidro. Felizes os que observam o passado para poder caminhar no futuro. Penetraremos juntos como um cientista analisando as reações desses personagens em alguns eventos marcantes de suas vidas.
  Ficaremos surpresos com suas histórias. Creio que elas nutrirão nossa inteligência, nos estimularão a desenterrar nossos sonhos e nos darão ferramentas para nos reconstruir.
Vamos penetrar no espetacular mundo que produz pesadelos e constrói sonhos.

Nunca Desista de Seus SonhosOnde histórias criam vida. Descubra agora