07/03/2018
Passar uma noite fora de casa nunca é fácil. Catarina estava acostumada com viagens a trabalho e em família. Estava acostumada a nem sempre dormir na sua própria cama. Mas, dormir — ou melhor, não passar a noite — em um lugar totalmente inóspito, um lugar que nem decorado pareceria um lar... isso era mais que difícil. Era como andar por cima de espinhos. Principalmente porque a cela da delegacia tinha companhia.
Como ainda estava começando o processo, Catarina ainda não tinha sido encaminhada para um presídio feminino — e esperava que nem fosse preciso —, passou a noite numa cela, que dividia com mais detentos, de ambos o sexo, na delegacia.
Naquele meio tinham pessoas que sempre apareciam no jornal da cidade acusada de algum crime, como tráfico, tinha uma famosa prostituta que a polícia sempre prendia — sabe-se lá porquê. Também estava um rapaz que ela conhecia, sempre o via com o filho pequeno. O rapaz, que não tinha mais que vinte anos, estava preso porque roubou uma caixa de leite. Catarina estava indignada. Ela tinha sido presa porque estava na cena do crime, com a arma na mão. Agora, aquele rapaz estava ali, chorando que não tinha ninguém para cuidar do filho e só tinha roubado o leite porque ninguém na cidade dava um emprego para ele. A mãe da criança tinha fugido.
Catarina sentia-se injustiçada, mas nada era maior que a injustiça que aquele cara passou.
Além de tudo, ela ainda estava com a roupa ensanguentada, seu cheiro estava a deixando enjoada, mas não adiantava ela tomar banho. Não tinha outra roupa, não tinha nada.
Vinte e quatro horas tinham se passado desde a prisão dela. Ela já tinha visto um advogado, e apenas isso. Não deixaram nem seu marido vê-la.
Ela passou a noite chorando, incomodando todos na única cela que a delegacia tinha. A prostituta, que já estava acostumada com o ambiente, até ameaçou Catarina, mas nada adiantou. A mulher, simplesmente, não conseguia parar de chorar, não conseguiu e nem deixou ninguém dormir. Todos estavam com os nervos à flor da pele, por estarem onde estavam, por ter passado a noite sem fechar os olhos...
Vinte e quatro horas, e ela continuava ali. Presa. Suja. Sem saber o que fazer, como se defender. Era óbvio que já colocaram a culpa sobre ela, até ela colocaria. Era fácil demais condenar alguém que estava com uma faca sanguinolenta na mão, um corpo morto no chão. Era fácil demais imaginar as coisas horripilantes que aconteceram ali. Aquele apartamento, que sempre fora limpo, organizado, cheiroso, estava num estado deplorável. Era natural demais culpar a única pessoa viva naquele ambiente pela cena desumana que aconteceu. Era simples. Apenas para Catarina que não. Ela ainda se perguntava como se defenderia. Ainda questionava sua sanidade mental. Aquilo não parecia ser real. A realidade estava muito distante daquilo.
A realidade era ela, em casa, tomando café com os filhos, e não aquele café com leite da delegacia. Era sentada no trabalho, marcando e desmarcando os horários das reuniões de Augusto, respondendo os e-mails em inglês, procurando clientes fora do país... Augusto queria tornar a empresa uma multinacional, e ela faria de tudo para ajudar o patrão.
Não sabia a hora exata, mas sabia que a reunião que tinham naquela manhã, com um alemão, tinha sido cancelada. Augusto estava morto. E ela ainda não podia acreditar.
Ela queria estar de luto, sentar e chorar, lamentar por horas a morte do patrão. Queria contar a Arthur as incontáveis vezes que ela se divertia com o patrão e ficar com saudades disso. Queria estar preocupada com seu emprego — e apenas com ele. Mas, estava preocupada com os filhos, com seu futuro na empresa, com sua vida. Estava preocupada com sua liberdade.
23/01/2013
Catarina sabia da animação de Alana, só não imaginava que a família da amiga também seguisse esse ritmo. Já era o segundo dia de comemoração e ela estava exausta. Tinham ido dormir muito tarde um dia antes, já que até uma balada tinham feito na chácara alugada. Não era só a falta de sono que incomodava. Ela já sentia a ressaca, depois de ter ficado muito bêbada, chegando.
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Laços
Mystery / ThrillerCatarina sempre batalhou para ter o melhor na vida. Mulher preta que cresceu na periferia, as coisas nunca foram fáceis. Mesmo com tanta luta, conseguiu se formar no curso de seus sonhos, conseguiu um bom emprego e construiu uma linda família. A vi...