01 - Essa é minha vida

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💎 Centro de Seul, 04:00 pm.

Serendipity, algo precioso que surge ao acaso. É quando de repente, e sem querer, alguém descobre algo que o faz mudar de vida, a solução para os seus problemas, a resposta para as suas perguntas.

Era essa palavra que me fazia ter uma gota de esperança de que um dia acordaria longe de todo aquele inferno que queimava minha pele pouco a pouco.

Esse inferno tem nome e sobrenome, Son Seong-jin.

Ele é o motivo de toda a dor que nunca vai passar porque essa é a minha vida, eu escolhi tê-la.

Nele tive um vislumbre de um futuro melhor para mim, longe dos meus pais. Meu maior erro na vida foi acreditar nas migalhas que recebia de um monstro. Eu me arrependo amargamente dessa escolha e me culpo por tudo que já me aconteceu até hoje. Sinceramente, eu merecia o desprezo de todos mesmos.

Para as pessoas ao meu redor eu era nojento, ao contrário.

Foi por ser assim que acabei aqui.

Foi por gostar de garotos.

Eu tenho plena certeza do que sou, nunca negaria a minha própria existência para agradar aqueles que um dia considerei minha família, mas gostaria de não ter nascido assim. Eu seria feliz.

As pessoas que deveriam me amar apesar da minha orientação sexual, que deveriam ser como o meu céu em meio ao inferno que o mundo é, simplesmente me largaram as traças no meio da rua, depois de sofrer uma das piores surras que já tinha levado até então. Não que meu relacionamento com eles era maravilhoso antes, mas pelo menos parecia que eles me consideravam um filho ainda.

Eu tinha apenas 16 anos quando contei a eles que gostava de garotos, na época eu era apaixonado por Seong-jin, que já tinha seus 18 anos, e como um tolo eu acreditei no que ele me dizia. Foi por ele que tive coragem de me assumir para os meus pais e foi ele quem me aceitou em sua casa naquela noite.

Eu plantei uma flor que não pode florescer em um sonho que não pode se tornar real.

Hoje, depois de seis anos, eu sei o monstro que ele é, mas eu não poderia culpá-lo. A culpa era totalmente minha. Amar quem não deveria me trouxe ao inferno que, por um breve período, acreditei nunca mais viver.

Meu corpo sempre tinha uma marca roxa em algum lugar causadas pelas surras que eu levava. Ele era um dos cabeças da máfia mais perigosa de Seul. Quando algum de seus subordinados cometia um erro, mesmo que mínimo, quem tinha que resolver tudo era ele. Bebia todo o bar da esquina e vinha para casa, descontava em mim todo o ódio que sentia daqueles homens que julgava incompetentes.

Eu era seu brinquedo sexual e saco de pancadas. Posso até dizer que ele, às vezes, juntava os dois objetos em mim ao mesmo tempo. Era o momento que eu mais me culpava por viver aquela vida, ser violentado de todas as formas possíveis matava minha alma todos os dias.

Tudo que eu queria era sumir da existência e por muitas vezes eu tentei, mas ele sempre aparecia a tempo para conseguir me fazer voltar. Eu tinha meus pulsos cheio de cicatrizes das vezes que tentei pôr um fim em toda essa dor. Hoje em dia eu já nem tento mais, até para me matar eu não servia. Apenas fico existindo dentro dessa casa tão luxuosa, na maior parte do tempo, sozinho.

Me sinto vazio, sem ninguém para conversar. Me machuco todos os dias para tentar sentir algo novamente, me concentro na dor que lateja em cada corte que dou nos meus pulsos, pernas, abdômen, em qualquer lugar que tenha pele.

Me concentro no sangue que escorre todas as vezes que faço isso, ele sempre vem como uma pequena nascente sem muita água, logo se transformando em uma correnteza forte. Quando sinto que estou desmaiando, jogo o coagulante que sempre tem aqui para estancar o sangramento e me alimento.

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