Capítulo 3- parte 2

2 1 0
                                    

Michael se encontra sentado na sala de espera de um hospital. Suas pernas não param de tremer, inquietas. Elas tremem como a agulha de uma máquina de costura. Usando uma calça social preta brilhante, uma camisa fora das calças, cabelos cacheados bem desgrenhados e o rosto todo arranhado com um hematoma vermelho vivo na maçã do rosto. Ele mexe as mãos com gestos apaziguadores, tentando parar sua barulhenta mente. Ele se levanta algumas vezes, pois em sua mente fazia sentido para ver se já havia chegado sua vez. Logo ele vai até o extenso balcão de mármore.

— Mocinha, por favor. — Ele se dirige à jovem de cabelos pretos. Ela está tão concentrada em passar nomes e faixas para o sistema que só responde depois de ser chamada mais algumas vezes.

— Oi, em que posso ajudar, senhor?— Ela o recepciona colocando a mão na cintura fina, suas unhas pintadas de prata se destacam no seu uniforme verde claro. Ela percebe o hematoma na maçã do rosto de Michael e começa a tentar lembrar as formas de cuidar daquele ferimento. O que a faz ficar em silêncio apenas observando o homem.

— Dominique Ventura. — Ele diz batendo o indicador na tela do computador a sua frente, indicando que quer que ela veja onde a garota está. Ela digita o nome bem rápido e, enquanto espera carregar, ela tenta cuidar do homem diante de si.

— Quer que eu vá buscar gelo? Algo para comer?— Ao mesmo tempo em que ela quer ajudar, também considera ser apenas mais uma briga de bar. Ele olha curioso, como quem diz "cadê?" e ela observa na tela. Lê rapidamente por cima enquanto olha algumas vezes para Michael. Depois de pedir um momento, a jovem anda até uma salinha e, pela janela, é possível vê-la conversando com um médico com o cargo mais alto que o dela.

Michael, enquanto espera, apoia os braços no mármore e repousa a cabeça, praticamente deitado, de pé, no balcão, seus olhos fitam o nada existencial que paira à sua volta. Enquanto pensa e escuta tudo ao mesmo tempo, ele pesca algumas palavras vindas da televisão da sala.

"E agora uma notícia urgente. A atriz Dominique Ventura acaba de sofrer um acidente na avenida principal. Seu carro foi atingido por uma parte da coluna principal do edifício Celta Center que foi arremessado e caiu no carro da atriz."

Michael se vira para assistir quando pesca uma das pessoas dizerem: "Ela não é aquela garota que está gravando aquele filme mega pesado?" Ao que outra responde: "Isso seria problemático, ela tem quantos anos, doze?"

Michael sente suas mãos ferverem, sua visão fica mais embaçada, a adrenalina corre como jaguares nas suas veias. Ele, sem pensar, pega um grampeador e o lança em direção a pessoa que disse aquilo. Mas graças a sua mira péssima, ele erra.

— Dezoito. Ela tem dezoito. Seus idiotas. — O objeto atinge uma porta de vidro. Ao cair o vidro, o barulho chama a atenção de todos os médicos do recinto. Enquanto vários vão socorrer as pessoas que estavam perto do vidro, o médico alto e loiro que estava orientando a enfermeira de cabelos pretos vai até Michael.

— Me acompanhe, senhor. — Ele diz colocando a mão esquerda nas costas de Michael e o guia grosseiramente até uma sala no final do corredor longo e branco do hospital. Ao chegar, ele empurra Michael com certa raiva e se vira para fechar a porta.

— Quer dinheiro? Eu pago aquela porra! — Michael esbraveja procurando sua carteira. O médico se arruma na porta e se posiciona como um segurança. Michael arruma a mecha de cabelo que está na frente de seus olhos e começa a avançar para cima dos médicos como quem está pronto para dar uma surra neles, mas o som doce e agudo de um choro o faz parar. Primeiro ele abaixa lentamente as mãos e, na mesma velocidade, mudando sua expressão de ódio para surpresa e um espanto genuíno. Tudo ao tempo de apenas um suspiro. Ele então vira o rosto, procurando a fonte do som tão belo e irritante.

Ao achar uma pequena maca de criança, daquelas que colocam os recém nascidos, com paninho branco e um ser pequenino repousando em cima. Com roupinhas um tanto grandes demais e uma touca branquinha quase caindo de sua cabeça conforme ele se move. Ele chora, como instinto básico, à procura da mãe. De pele vermelha e seus pequenos punhos fechados com tanta força que em volta dos dedos fica num tom amarelo vivo.

Michael passa a mão no rosto, tentando se acalmar mas, ao mesmo tempo, tentando se convencer de que aquilo era real. Ele olha para o médico e vai na direção do bebê. Mesmo trêmulo e preocupado, ele se aproxima. Os médicos posicionam o pequeno de frente para o vidro de forma que o galês consiga ver cada detalhe. Emocionado, ele apoia a mão no vidro, que de tão suada, acaba marcando com um vapor grosso de gotas que escorrem preguiçosas. A enfermeira vestida com um jaleco rosa se aproxima e pega o pequeno saco de ossos no colo. Arrumando sua touquinha, ela o balança pra que pare de chorar e se aproxima ainda mais do vidro. O homem fica surpreso ao ver que a cor dos poucos fios de cabelo que ficaram pra fora é azul como o ceu de um dia de praia.

— Ciano.— Escorrega de seus lábios, como se nomeasse o pequenino. Ele acaricia o vidro, na tentativa de sentir a pele quente e macia do bebê. Um dos médicos que estava parado atrás dele lhe entrega um pouco de papel para que limpe suas lágrimas ou que limpe o nariz e pare de fungar e limpar na manga da camisa. O galês se encanta com cada detalhe da jovem alma a sua frente: seus belos cabelos cacheados, seus olhos que não dava pra ver direito, mas em sua mente povoada e barulhenta ele tem plena certeza de que são tão claros quanto os seus, o nariz que nem mesmo tem tamanho de um nariz humano e as enormes bochechas. Olhando para aquele ser minúsculo, ele se esquece do quanto seus pés estão doendo por ter corrido como um louco durante um tempo considerável. Também esquece que sua mão pode ter alguns ossos quebrados e que sua aparência não é das melhores. Não importa. Ele quer apenas olhar pra seu filho e imaginar o prazer que seria ensiná-lo a jogar futebol ou qualquer outro esporte que ele se interessar. Seus olhos marejam e lágrimas percorrem seu rosto quando ele imagina o quão feliz vai ser sua vida agora que tem seu tão sonhado filho.

Enquanto se limpa ele percebe que, pelo outro lado do quarto, por uma porta branca grande, vem entrando uma maca. Três médicos, um em cada ponta e um no meio empurravam a maca. Michael observa curioso. Os médicos arrumam a maca no canto, perto da janela. Deitada em cima está a garota, Dominique. Ao perceber isso, como impulso, Michael se dirige em direção a garota. Ignorando e tropeçando em tudo que estava em seu caminho. Chega ate a empurrar com uma força considerável um dos médicos, que não faz nada por estar acostumado com parentes tendo reações tão grosseiras.

— Ela está bem? O que...O que ela tem? Por que ela não se mexe?— Michael se ajoelha no chão, ao lado da maca da garota. Segurando sua mão, ele a beija e acaricia aflito. Esporadicamente ele desliza a ponta dos dedos nos ferimentos do rosto da menina, os pontos se movem deslizando delicados sob seus dedos.Sua postura não é das melhores, com seus ombros pesados e seus braços praticamente jogados ao lado do corpo.Seus olhos fitam tudo ao seu redor, mas não enxergam nada em específico. Sua boca seca e sua garganta arranha como se tivesse engolido uma bola de pelos enorme, mesmo assim ele se fixa olhando com seus olhos gentis pra garota. Ela ainda está um pouco inchada, mas de alguma forma Michael ainda vê sua alma jovem e alegre. Lembra de seus melhores dias, de quando a conheceu e a felicidade que estampava seu rosto quando descobriu que esperava um filho de seu amado. Ele não ouve nada que os médicos dizem, seus tímpanos pescam uma palavra aqui e outra ali, mas nada que se conecte e faça sentido em sua cabeça. Um médico diz sobre o quão grave eram seus ferimentos, e do quanto trabalho eles tiveram para mantê-la viva. Outro diz sobre medicamentos e coisas com nome que apenas quem é do ramo da medicina entenderia. No fim, a única coisa que ele ouve, faz seu sangue gelar e seu estômago embrulhar como ressaca de uma noite inteira bebendo as piores bebidas. Ela possivelmente não vai mais acordar. 

LaurenOnde histórias criam vida. Descubra agora