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Engana-se, meu caro, o barco desliza bem rápido. Mas o Zuyderzee é um mar morto, ou quase. Com suas margens planas, perdidas na bruma, não se sabe onde começa ou acaba. Por isso, singramos sem nenhum ponto de referência, não conseguimos nem calcular nossa velocidade. Avançamos, e nada muda. Não é navegação; é sonho.

No arquipélago grego, eu tinha a impressão oposta. Novas ilhas surgiam incessantemente na linha do horizonte. Seu perfil sem árvores delineava o limite do céu, suas margens rochosas cortavam nitidamente o mar. Não havia confusão; naquela claridade precisa, tudo servia de ponto de referência. E, de ilha em ilha, sem trégua, ainda que se arrastando em nosso pequeno barco, tinha a impressão de saltar, noite e dia, na crista das pequenas e refrescantes vagas, um caminho cheio de espuma e de risos. Desde então, a própria Grécia navega à deriva em alguma parte de mim mesmo, à margem de minha memória, incansavelmente. Também eu estou à deriva, tornei-me lírico! Peço-lhe, meu caro, faça com que eu pare.

A propósito, conhece a Grécia? Não? Tanto melhor! Pergunto-lhe, o que faríamos lá? Lá, é preciso ter o coração puro. Lá, os amigos passeiam na rua, dois a dois, de mãos dadas! Sim, as mulheres ficam em casa, e vêem-se homens maduros, respeitáveis, adornados de bigodes, subir e descer solenemente as ruas com os dedos entrelaçados nos do amigo. Também no Oriente, às vezes? Que seja! Mas, diga-me, o senhor me daria a mão nas ruas de Paris? Ora! Estou brincando. Nós, sim, temos boas maneiras, pois a sujeira nos eleva. Antes de nos apresentarmos nas ilhas gregas, teríamos de nos lavar demoradamente. Lá, o ar é casto, o mar e o prazer, limpos. E nós...

Sentemo-nos em um desses transatlânticos. Que nevoeiro! Eu havia começado, creio, a falar do desconforto. Sim, vou dizer-lhe do que se trata. Depois de me ter debatido, depois de ter esgotado meus ares de grande insolência, desanimado com a inutilidade de meus esforços, decidi abandonar o convívio dos homens. Não, não procurei ilhas desertas, não existem mais. Eu me refugiei unicamente junto às mulheres. Como sabe, elas realmente não são de condenar qualquer fraqueza: elas tentariam, de preferência, humilhar ou abater nossas forças. Eis por que a mulher é a recompensa, não do guerreiro, mas do criminoso. É seu porto, sua enseada, é no leito da mulher que ele é geralmente preso. Não será a mulher tudo o que nos resta do paraíso terrestre? Desamparado, corri para o meu porto natural. Mas já não fazia discursos. Representava ainda um pouco, por hábito; mas a criatividade me faltava. Hesito em confessar, com medo de proferir ainda alguns palavrões: creio efetivamente que nessa época senti a necessidade de um amor. É obsceno, não? No entanto, vivia um sofrimento surdo, uma espécie de privação, que me tornou mais vazio, e me permitiu, meio forçado, meio curioso, assumir alguns compromissos. Já que tinha necessidade de amar e de ser amado, julguei-me apaixonado. Em outras palavras, fiz papel de bobo.

Eu me surpreendia freqüentemente a fazer uma pergunta que, como homem vivido, sempre evitara até então. Eu me ouvia perguntar: "Você me ama?" Sabe, é costume responder em casos semelhantes: "E você?" Quando respondia sim, eu me via comprometido além de meus verdadeiros sentimentos. Quando ousava dizer não, eu me arriscava a não mais ser amado, e sofria com isso. Quanto mais o sentimento em que eu esperava encontrar repouso se achava ameaçado, mais o exigia de minha companheira. Eu era levado, portanto, a promessas cada vez mais explícitas e chegava a exigir de meu coração um sentimento cada vez mais vasto. Fui tomado assim de uma falsa paixão por uma encantadora desmiolada tão conhecedora das revistas sentimentais que falava de amor com a segurança e a convicção de um intelectual proclamando a sociedade sem classes. Tal convicção, como não desconhece, é sedutora. Também ensaiei falar de amor e acabei por persuadir a mim mesmo. Pelo menos até o momento em que se tornou minha amante e compreendi que as revistas sentimentais que ensinavam a falar de amor não ensinavam a praticá-lo. Depois de ter amado um papagaio, tive de dormir com uma serpente. Procurei, então, em outros lugares, o amor prometido pelos livros e que nunca havia encontrado na vida.

A Queda (1956)Onde histórias criam vida. Descubra agora